6.10.04

Ele não tinha nada. Não tinha casa, não tinha carro, não tinha filhos nem mulher, não tinha mãe, nunca teve pai, não tinha idéias, vontades, aspirações, curiosidades, desejos, metas, medos.
Era a sua maneira livre de levar a vida, sem amarras, que o fazia sorrir todas as manhãs no elevador, como se fosse o homem mais feliz daquele lugar. Às vezes, quando eu chegava a pé depois de uma caminhada, o via vigiando os arredores. E sempre quando terminava, dava tapinhas no muro do prédio como fazemos nas costas de um amigo quando queremos dizer "é isso aí", ou "você vai longe". Aquele gesto que transmite ao mesmo tempo carinho, orgulho e estímulo.
Zelou por alguns anos ainda, depois que o conheci. Quando faleceu, limparam o seu quartinho modesto e lá encontraram uma única posse, pequena, que foi enterrada ao lado da árvore mais próxima à guarita, para que ninguém mais conhecesse o segredo de sua alegria.

Salón Comedor - Você tem fome de quê?

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