31.8.04

O acontecido, o não acontecido

Eram uma possibilidade mas nenhum dos dois sabia disso.

Estavam no mesmo local, ao mesmo tempo, com apenas alguns metros de distância separando-os. Ele ia sentado no banco do ônibus, olhando pela janela, introspectivo. Ela ia em pé, fones de ouvido, mergulhada em pensamentos. Se apenas seus olhares tivessem se cruzado, talvez um sorriso poderia ter nascido. Ela veria os olhos dele, transparentes e castanhos, cheios da bondade do mundo. Ele teria visto uma chama luminosa nos olhos dela, transparentes e oceano. Ele sorriria, ela sorriria. Ela talvez se sentasse ao lado dele. Ele talvez perguntasse onde ela ia. Ela talvez contasse onde estava indo. Talvez, talvez, talvezes.

Se conversassem, ele poderia arriscar-se a perguntar se ela não gostaria de ir passear com ele à beira-mar. Ela diria que adora andar na praia à noite, vendo as luzes do forte e do farol, escutando o oceano rugindo, afundando os pés na areia. Ele diria que adora música eletrônica e industrial, ela riria, porque ela também adora. Ela diria que adora gatos, ele sorriria e contaria da gata que ele teve. Descobririam muitas outras coisas em comum e conversariam, conversariam por horas, dias, semanas. Eles se beijariam em algum momento, o beijo seria inevitável, encantados com o olhar do outro, longamente, profundamente.

Os meses passariam, eles se apoiariam mutuamente, cresceriam juntos. Ela ensinaria ele a ser mais leve, menos introspectivo, a ver como as pessoas gostam dele. Ele ensinaria a ela a bondade e a gentileza. Ela ensinaria ele a acreditar em si mesmo. Ele ensinaria à ela como ela é bonita e corajosa. Descobririam mais e mais sobre o outro, se amariam mais. Ele se veria bonito, ela se veria feliz. Cuidariam um do outro. Poderiam ter uma vida inteira juntos.

Se apenas os olhares se cruzassem.

MadTeaParty - Should we have each other for tea?

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