31.8.05

cornucópia

daí o unicórnio chegou no balcão do xerox e disse: eu quero uma cópia do meu corno. "do seu chifre?", a mocinha arregalou os olhos depositando no chão uma série de apostilas. "do meu chifre, aspa, binga, guampa, chavelho, como queira, só precisa ser rápido, porque estou em horário de almoço." a mocinha incrédula chamou o patrão, um careca com uma calculadora. "que que foi, nunca viu um unicórnio antes? atende." o unicórnio começava a praguejar e alisar o chifre, que parecia uma concha daquelas de caramujo bem finiiiinhas que dão na praia. então a mocinha levantou a tampa do balcão e o unicórnio passou pro lado de dentro e foram os dois fazer as cópias. na loja ao lado, uma lanchonete, uma cenoura de maus bofes sentava e pedia um suco de abacaxi.

Xícara de Chá

28.8.05

Você gasta o que não pode no shopping, depois volta pra casa de ônibus. Isso é tão hipócrita quanto aquela figura que consome oito mil calorias num almoço farto e, no final, toma um café com adoçante.

Uma dama não comenta

26.8.05

Preferido do Rei

Leio num guia de lanchonetes que o sanduíche [ou "lanche", como agora se fala em São Paulo] predileto do Elvis era banana amassada com pasta de amendoim e pão. O cara tinha mesmo que morrer intoxicado. Prefiro um sanduíche de merda.

catarro verde

25.8.05

Assim falava Zoroastro

Os homens de génio são como os meteoros: esquentam a cabeça à toa, pra terminar debaixo da terra feito todo mundo.

dies iræ

21.8.05

02.08.2005

Vem depois da noite, do hálito bêbado, dos pequenos insetos cegos, depois da madrugada, dos lençóis desfeitos, da nudez desamparada, depois dos pesadelos, do sapato no caminho, da janela batendo, do copo vazio, do pensamento que volta, depois do suor, do frio, da freada no asfalto, da coberta caída, depois da hora avançada, dos estampidos da rua, do gato no cio, das contas a pagar, vem depois, bem depois, vem me acordar e fazer só pra mim um mundo recém nascido.


Não Discuto, por Patrícia Antoniete

12.8.05

Buraco de toupeira: tatu caminha dentro?

(…)

Dinheiro é coisa muito suja, por isso que virtude é não trabalhar. E se jogo na loteria esportiva é pra perder, que Jesus falou ser mais fácil camelo passar pelo fundo de agulha, que um rico entrar no reino dos céus -- aí, só cavando túnel.

dies iræ

7.8.05

O círculo

O homenzinho de unhas polidas e pensamentos foscos apaixonou-se pela mulherzinha de unhas foscas e pensamentos polidos.
Ela, muito polidamente, disse-lhe que não poderia corresponder àquele tipo de afeto, porque era lésbica, nascera lésbica, sempre fora lésbica e haveria de morrer lésbica.
Ele nada disse, mas passou a roer as unhas e a cultivar pensamentos tristes, cada vez mais tristes. Um dia, suicidou-se.
Foi o homenzinho enterrado pelo coveiro de unhas imundas e pensamentos imaculados, cuja filha única - que tinha unhas imaculadas e pensamentos imundos - era justamente a infiel companheira da mulherzinha de unhas foscas e pensamentos polidos, a qual, sem se dar conta, se tornara um estorvo e estava com os seus dias contados.

dennis d.

Pequenas alegrias da vida de solteira

Dormir numa diagonal.

a caverna da ogra

às vezes não sei se estou cansada ou se estou triste
ou se estou triste de estar cansada
ou se estou cansada de estar triste.

blog de escárnio e maldizer

PRÁ PENSAR

Um amigo muito querido, casado com uma amiga que eu adoro, pai de 4 pimpolhos lindos e fofos, Engenheiro com doutorado em Londres, me disse uma coisa há dois anos que eu nunca me esqueci e que tem se revelado cada vez mais verdadeira:

No final, o que vai contar não é o teu doutorado, que cargos ocupaste, que sucesso fizeste. O que vai contar é se amaste de verdade pelo menos uma vez na vida, se foste amado, quem são teus filhos, se sabem amar, se eles te amam, se gostam de estar junto de ti, se tens amigos, se sabes rir e tens com quem. O vai contar, lá no final, é isso. Se todo o resto for um meio para este fim, ótimo. Se for uma alternativa, dispense. Vais te arrepender com toda certeza.

megeras magérrimas

bipolar

A paixão testa, o amor prova.
A paixão acelera, o amor retarda.
A paixão repete o corpo, o amor cria o corpo.
A paixão incrimina, o amor perdoa.
A paixão convence, o amor dissuade.
A paixão é desejo da vaidade, o amor é a vaidade do desejo.
A paixão não pensa, o amor pesa.
A paixão vasculha o que o amor descobre.
A paixão não aceita testemunhas, o amor é testemunha.
A paixão facilita o encontro, o amor dificulta.
A paixão não se prepara, o amor demora para falar.
A paixão começa rápido, o amor não termina.

Fabrício Carpinejar

I SPY WITH MY LITTLE EYE...

20/07/2005

Já falei muito delas aqui. As vizinhas do mal. As que gritam, batem boca, se desentendem, ou até concordam e se elogiam, mas sempre em altos brados, das 7 da madrugada à meia-noite, ou mais tarde. A mãe e a filha mais velha são as piores, mas sei que há um pai/marido e uma filha mais nova, que não berram tanto, e às vezes parece haver um moleque também, este até gritador também, mas menos presente, graças a Zeus. Os fofos são o tipo de gente que rouba toalha de hotel – minha área de serviço dá de frente pra delas, o que hei de fazer ? Ver, né ? E hotel de Caldas Novas, ainda por cima, aquela cidade onde quase toda piscina é um caldeirão fervente à espera de moças que tragam “sustança” e transformem seu caldo de bactérias em canja.
São pessoas tão invasivas, sem pudor e sem medida, que até suas comidas têm cheiro mais forte que as dos outros. Dia desses, por exemplo, devem ter queimado a carne assada, deixando o hall, elevadores e esta que vos fala com aroma artificial de churrasco. Cozinham pequi o ano inteiro, até fora de época, e suspeito que nem gostam, mas fazem isso só para afrontar nossos olfatos também, caso a audição se acostume aos maus-tratos. Batem panelas, amontoam lixo fora do horário de recolhimento, espancam o botão do elevador com tanta ênfase que quase dá pra acreditar que ele vai subir mais rápido por causa disso.
A mais velha já mandou a mãe atuar passivamente num ato de sodomia, e fez isso com tanta classe e discrição que tenho certeza de que até os velhinhos surdos, tão abundantes no prédio, ouviram.
Sim, já falei muito delas, e se já falei outras vezes, por que falar de novo ? Só pra contar que no fim de semana, ao fazer uma de nossas sessões de cozinhar juntos (gatim pica a cebola e o alho, eu faço o resto), rir muito, namorar um bocado e dançar ao som de golden oldies, de roupa caseira e pés descalços, na cozinha de casa, vi a menorzinha nos espiando por um bom tempo através da vidraça semi-fechada. Ficou ali quietinha, meio escondida, só os olhos por cima do parapeito. Depois de uns minutos, nem meia música, saiu da cozinha e apagou a luz. Nem comentei nada com o Nelson, que, atento como é, certamente nem percebeu. Mas eu achei interessante. O que será que se passou na cabecinha dela ?
Pode ser que tenha nos achado uns velhos babacas e nossa música uma baba chata (I only have eyes for yoooouuuu...). Pode ser que tenha tido uma pontinha de inveja ao ver que, ao contrário dos velhos dela, os coroas do apartamento em frente convivem bem e sem gritos. De um jeito ou de outro, acho bom que pelo menos ela tenha visto, em primeira mão, que é possível, sim, que pessoas comuns, que não são personagem de filme nem famosas, ricas ou bonitas, tenham um casamento feliz, gostem da companhia um do outro e não soem sempre como cães brigando. Quem sabe assim ela pense antes de perpetuar esse jeito permanentemente em guerra de sua pequena e barulhenta tribo. Se isso acontecer, seu futuro marido, e principalmente, seus futuros vizinhos, têm uma dívida enorme comigo e o gatim. Escrevi tudo isso pra dizer que aceitamos pagamento adiantado, em forma de silêncio. Pelo menos na hora do almoço.


04/08/2005

As vizinhas marditas-gritadeiras gritando como nunca, e eu não posso nem mandá-las ir gritar com a puta que as pariu. Ou com as putas que pariu. Não porque eu seja fina demais pra isso, mas porque, na verdade, provavelmente é isso mesmo que elas estão fazendo.

Cyn City

6.8.05

Obrigada, não!

Obrigada, acontece que eu não gosto:
- de Paulo Coelho;
- desses livros de ajuda espiritual escritos para ganhar dinheiro;
- dessa música sertaneja que está na moda;
- de poetas de rima fácil;
- de música no mais alto volume (em casa ou no carro);
- que me acordem. Deus me livre puxar a cortina com força, jogar claridade na minha cara e dizer: Ó, que dia lindo!
- de gente que anda de carro na praia;
- de quem maltrata e abandona bichos;
- de quem acha que é expert em tudo;
- de quem classifica as pessoas pelas escolhas sexuais que têm;
- de quem é servil;
- de quem não sabe receber amor;
- de quem só pensa em dinheiro;
- de quem vive cobrando atenção;
- de quem só diz o que os outros querem ouvir.

veja o que eu vi e muito mais

ARE YOU LONESOME TONIGHT?

Elvis nunca gostou de rock. E o mistério é que a família – mãe, tia e avós, testemunhas juramentadas de Jeová – também não podia ouvir falar em música profana. Teremos, pois, de esclarecer o porquê do nome através de uma trama noir, com ventilador de teto, persiana, um datilógrafo de costeletas crespas, um velho careca e uma loira fatal.

Elvis tirou a tarde de ontem de folga e foi ao 3º Cartório de Registro Civil, para averiguar quem eram o tabelião e os outros profissionais do estabelecimento em 77, quando nasceu. Enquanto o funcionário de óculos de aro de tartaruga fuçava os papéis, suando vapor, Elvis se perguntou o que fazia ali o ventilador chiando feito gemido ensaiado de mulher que nunca chega lá. Aliás ele não fazia mexer nem as persianas empoeiradas que deixavam entrar fatiada a tarde amarela e sem graça. “Esse aqui”, disse o óculos de tartaruga, mostrando uma foto já descorada de um tipo com costeletona, “era o escrivão da época. Miron.” E, limpando o vapor na testa com a manga da camisa: “O dono do cartório na época morreu, deixou para o filho, que está de viagem. Sobrou só o Miron para você pesquisar”. Do cartório mesmo Elvis ligou e do outro lado atendeu um velho careca – mas que até hoje cantarola “Are You Lonesome Tonight?” sem errar a letra. “É, sou o Miron. Lembro do teu pai. Sujeito asqueroso, uma recaída da tua mãe. A família dela nunca gostou daquele ‘ateu sem volta’. Ele bebia e desconfiava de tua mãe. Achava inclusive que não era teu pai verdadeiro. Veio, bêbado, te registrar. Quando eu perguntei se o recém-nascido ia ter o nome do pai ele achou graça de eu falar ‘pai’ e disse, cínico, acho que para ele mesmo: ‘É o vizinho…’ Ouvi e pensei que seria o teu prenome, as letras todas juntas, e comecei a datilografar – achando justa aquela singela homenagem ao rei, justo no ano da morte dele. ‘Vai no diminutivo mesmo?’, eu perguntei, aí ele percebeu e disse ‘Pára!’ - então tive tempo de pelo menos não colocar o ‘inho’. Ele leu como ficou, riu e mandou deixar. Sumiu no mundo e te largou esse nome.” Elvis desligou o telefone com um estranho gosto de chiclete de uva na boca. E sim, a mulher fatal era Edilene, uma loira oxigenada sentada na recepção do cartório, esperando para reconhecer firma nuns papéis e que refrescava o busto suado abanando um exemplar antigo da Carícia.

ao mirante, nelson

Top 5 - Piores Profissões do Mundo

5 - Greicikélio da Silva, 18, é faxineiro de uma casa de peep show em Copacabana. Em outras palavras: limpador de porra. E, pior, não é nem registrado em carteira.

4 - Carlos Poncherelo, 40, é policial rodoviário especializado em coletar restos mortais de animais atropelados na estrada. Experimente passar um dia de verão atendendo a chamados de todos os lugares do país, enquanto o processo de decomposição dos finados bichos segue à toda. Não à toa, seu prato predileto é espetinho de jiló com salada de tofu.

3 - Debbie Lloyd, 24, é limpadora de bundas de lutadores de sumô, homens que por evidentes razões adiposas possuem dificuldades para alcançar determinadas partes de sua anatomia. O trabalho é evidentemente uma merda, mas ao menos paga bem.

2 - Creedence Ramônio, 58, é técnico de som do grupo de pagode universitário Los Mauricinhos, (ir)responsáveis pelo atual hit número 1 da Gazeta FM, "Pagode na Daslu". Antes, trabalhou com a dupla sertaneja Tristinho & Tristonho e a boy band New Kids on the Blog (conhecida pelos sucessos "Template da Paixão" e "Muito Lôko Seu Blog, Linka Eu Vai?"). Recentemente Creedence trabalhou na gravação de um DVD em tributo à obra de Arnaldo Antunes, tendo sido obrigado a ouvir por dez horas seguidas Preta Gil cantar (com arranjos de Jacques Morelembaum) os versos imortais "Macha fêmeo macha fêmeo fêmeo macha/ Cérebra caralha baga saca pescoça prepúcia ossa/ Nádego boceto têto côxo vagino cabeço boco/ Corpa moço dentra foro moça/ Orgasma coita palavro sexa goza/ Liberal gerou".

1 - Horinando Brasilino, 27, é limpador de esgotos. Experimente mergulhar em um fosso repleto de toneladas de merda humana, a fim de liberar canos entupidos por causa de absorventes ou camisinhas usadas. Horinando até já se acostumou com essa rotina, mas não se conforma com o fato de a firma não oferecer assistência odontológica nem pagar horas extras. Assim já é demais!

por Alexandre Inagaki, pro morfina

Minha sobrinha Marcelinha, que nasceu há pouco mais de três meses, levou diiiiias e diiiiias pra abrir os olhinhos, chorava pouco e baixinho, dormia muito. Minha sobrinha-neta Hannah, que nasceu anteontem, já saiu de olhos abertos, chora e resmunga, vive acordada e mostra a língua pra tudo que se move. Qual será a razão de tanta diferença ? Minha teoria é de que Marcela, ao ser levada pro quarto da mãe na maternidade, abriu meio olhinho, deu uma boa sacada em volta, viu o tamanho da suíte, as flores, o buffet, as malas, as roupinhas, suspirou aliviada e pensou “Ui, que bom, sou rica. Me acordem daqui a três meses, uahhh...”. Hannah também deu a primeira olhada, sentiu que o quarto era até legal, mas não era nenhum cinco estrelas, e ainda viu uma menina de trança, um moleque magrelo apavorado, sentiu que aqueles eram seus pais... e perdeu o sono ! Hohoho.

Cyn City

3.8.05

Ponto pacífico

Encontraram-se na seção de congelados do supermercado:

Ele, sorrindo:

- Sem tempo para cozinhar, não é?

Ela, reticente:

- Não, não. Minha irmã vem me visitar e ela adora esse ravióli.

- Tem bom gosto. O de ricota é divino. Já provei.

- Eu não suporto ricota. Vou levar carne, mesmo, que sempre cai bem com um vinhozinho...

- Hum. Não bebo. Para mim um suco de acerola dá o contraponto exato. Mas também, eu prefiro ricota...

- Não suporto ricota. Bom, com licença; preciso passar na locadora.

- Comédia, decerto.

- Não, Krzistof Kieslowski. Estou com um plano de rever a trilogia das cores essa semana.

- Ah, certo. Gostei da Fraternidade é Vermelha. Aquela Irene Jacob é... digo, uma boa atriz.

- Claro. Mas a Liberdade é Azul é que é o grande momento da trilogia.

- Então você vai passar a noite com a Juliette Binoche.

- Na verdade é para amanhã, que hoje estava a fim de ver um show.

- Boa! O Djavan tá na Tom Brasil.

- É, mas o Echo & The Bunnymen tá no Credicard Hall. Sou louca por eles.

- Vai arrastar teu namorado pra lá.

- Umas amigas.

- E depois dançar um pouco nalgum lugar.

- Xi, não. Provavelmente comer uma pizza.

- Alguma coisa me diz que você não é católica.

- Acertou. Presbiteriana.

- Ah. Bom, pelo menos os presbiterianos são malufistas, como eu.

- Credo! Sou militante do PT há dez anos! Não acredito que alguém ainda vota no Maluf em sã consciência.

Ele, um pouco contrariado:

- Hã, bom... eu não quero atrasar você. Ainda tem que passar na locadora, não é?E eu fiquei com vontade de ver o Djavan, depois desse papo todo.

Ela, visivelmente chateada:

- Claro. Tchau!

- Tchau.

Já a uns cinco metros ele se vira:

- Uma última pergunta...

- São paulina! Ela grita.

- Eu também!

Correm ao encontro um do outro e se enlaçam num beijo selvagem.

é por aqui que vai pra lá?