30.6.04

Ontem me aproximei de uma barraca de ervas e garrafadas, no centro de São Paulo. Curioso, fiquei mexendo nas ervas e lendo os rótulos das garrafas. O dono, só me olhando. Até concluir que eu não estava achando o remédio que procurava:

- O senhor queria pra quê?
- Saudade. Tem?

catarro verde

Os relógios gritam "Você está atrasado!" porque é para isso que foram feitos. Tal qual papagaios monossilábicos, não sabem dizer outra coisa. Quando estamos adiantados, os relógios calam. Mas ficam bufando de raiva, e esperando (um relógio esperando algo é uma imagem insólita) que voltemos a estar atrasados para que possam soltar o grito que lhes sufoca a garganta, que eu não sei onde fica, já que a única certeza que eu tenho sobre a fisionomia dos relógios é a de que eles usam bigodes - os ponteiros. Menos os digitais é claro, mas isso é porque eles são orientais.

vale o que está escrito

19.6.04

À VISTA

Assim que ele a olhou bem dentro dos olhos, ela sentiu que ele examinava seu peito como uma prateleira de supermercado: alguns medos em conserva, angústias em lata, frustrações defumadas. Amizades de consistência firme, algumas com prazo de validade vencido, alegrias a granel, tristezas embaladas à vácuo. Uma saudade torrada e moída, um saco de felicidade empoeirado. E, ora, ora, desejo suculento e fresco, aroma maduro. Isso.

Ela exigiu que fosse à vista, cash. Não, nada de cartões de crédito. Isso de esperar trinta dias, e quem sabe receber só o pagamento mínimo, ainda que o saldo esteja posteriormente sujeito à cobrança de juros e correção monetária, não lhe agradava. Cheque, nem pensar. Entrega-se o produto, esvazia-se o estoque e depois não há compensação. Consignação? Não, também não. O produto é perecível e para consumo imediato. Se acondicionado fora das condições recomendadas pelo fabricante se deteriora rapidamente. Tem garantia, claro, mas só contra defeitos de fábrica. Não aceitamos devolução.

Vou levar.

Assim que ele a tomou nas mãos e sentiu o peso, achou que o pacote poderia estourar.

E quem discute?

16.6.04

O pior desse negócio de quebrar a cara com freqüência é que você vai adotando certos cuidados, tirando aos poucos toda a graça da aventura amorosa. Eu, que sempre fui maluco e arrojado quando se tratava do sentimento com nome de paçoquinha, me vejo agora olhando para os lados com desconfiança, avaliando o terreno, como uma barata de laboratório cansada de levar choques a cada passo em falso.
Dizem que é bom ter cuidado, ir com calma, essas coisas. Sei não, sei não... Sinto-me como o velho trapezista que, balançando-se preso por um cabo de segurança e vendo a rede lá embaixo, dá um sorriso triste e sente saudades do tempo em que se lançava no vazio de olhos vendados.

Jesus, me chicoteia!

15.6.04

MORRE MAIS UMA PARTE DA MINHA INFÂNCIA

Um dia desses, há mais ou menos três semanas eu estava na cantina da universidade especulando com uns amigos sobre quem seria a pessoa famosa mais idosa ainda viva. Sem contar o Papa, claro, devido às especulações sobre o fato de ele ter sido substituído por um robô que do original só tem a pele. Dercy Gonçalves, Tonia Carrero e Paulo Autran, dinossauros do teatro brasileiro foram rapidamente lembrados. Hebe, que atuou na primeira transmissão nacional de televisão, em 1950, também. Walter Mathau e aquela velhinha simpática que fez Conduzindo Miss Daisy já bateram as botas, senão certamente seriam lembrados. Mas ninguém lembrou de Ronald Reagan, um ícone dos anos 80 que voltou a estar em evidência nos últimos dias por ter batido as botas, o que no caso de um ex-ator e ex-cowboy-na-casa-branca (cargo atualmente ocupado por Bush) é muito mais do que figura de linguagem.

No tempo em que Reagan estava caçando comunistas no Afeganistão ou vendendo armas ilegalmente ao Irã para depois repassar o dinheiro, também ilegalmente aos guerrilheiros da América Central, minhas aulas de Educação Artística na escola eram quase sempre dedicadas a desenhar mapas e esquemas para a detonação da Terceira Guerra Mundial, coisa que eu e todos os outros alunos da escola achávamos que ia acontecer antes que completássemos doze anos. Na época não sabíamos que desde o fim da crise dos mísseis em Cuba, quando o mundo esteve realmente pela bola 8, os riscos de algum maluco realmente apertar o tal botão vermelho eram muito remotos. Mas vá dizer isso para uma criança de 8 anos...

Com a morte de Reagan morre mais uma parte da minha infância, que começou a ir embora no rastro da frustração deixada por aquela porcaria de cometa Halley. Não que eu nutrisse alguma simpatia por ele, ainda mais que o único filme em que o vi atuar é ¿Em cada coração um pecado¿, de 1942, mas é que ele estava lá por bastante tempo, e ao contrário de alguns de meus bonecos playmobill, ele demorou uns vinte anos para quebrar. Um bom filme aquele aliás, dirigido pelo mesmo Sam Wood que foi o responsável pelos melhores filmes dos Irmãos Marx, além de ter sido um dos diretores de ¿...E o vento levou.¿. Tanto o filme quanto o diretor foram indicados ao Oscar, mas ambos perderam para ¿A rosa da esperança¿, de William Wyler, diretor que ainda levaria a estatueta outras duas vezes, uma delas com Bem-Hur. Dizem que esta é a melhor atuação filmada de Reagan, se bem que aquela cena em que ele, já presidente, foi alvejado por um maluco em 81 era muito mais impactante do que qualquer coisa que ele já havia feito até então. Principalmente porque se aquele sujeito (John W. Hinckley Jr.) tivesse melhor pontaria, os anos oitenta, a minha infância e o mundo poderiam ter sido completamente diferentes. Mesmo porque se Reagan tivesse morrido naquele atentado quem teria assumido a presidência seria Bush (o pai), e ele provavelmente teria metido os Estados Unidos em alguma guerra antes de 84 e não teria sido reeleito naquele ano, porque a economia iria estar em recessão. Como o Bush atual só parou de beber em 86, eu me arrisco a dizer que é possível que se o pai dele tivesse perdido a eleição de 84, ele não tivesse conseguido e hoje em dia, ao invés de estar no número 1600 da Av. Pensilvânia brincando de Dr. Fantástico ele estivesse em uma confortável cela acolchoada tentando afugentar elefantes cor-de-rosa. Maldito atirador vesgo!

Falando em Bush Jr, a máquina da reeleição já está trabalhando a todo vapor para associar a imagem de Reagan à dele através de panfletos, cartazes e programas de TV. Eu pergunto: Por que não mandam empalhar o corpo dele de uma vez e saem em turnê com ele pelos Estados Unidos? Assim pelo menos alguém naquela gangue teria um pouco de personalidade. Aproveitem e empalhem o cometa de Halley também para eu finalmente poder vê-lo.

vale o que está escrito

14.6.04

por mais que eu esteja na pqp, sozinho, sem drogas e com muito pouco pra me divertir de verdade, eu fico feliz pra caralho quando encontro meus amigos online...
ta, eu sei q é óbvio, e talvez inapropriado para diabéticos (exceto para o grillo, é claro), mas porra, é a pura verdade.
eu fico aqui, perdido no lobby do hotel, rindo sozinho, as vezes alto...recebendo e mandando arquivos, links, e trocando várias idéias...as melhores possíveis...por que será que as vezes a gente precisa estar longe pra apreciar tudo aquilo de melhor que se tem por perto?
denovo, óbvio, insatisfação talvez seja a característica humana mais perene. seguida de medo e preguiça. mas mesmo assim, verdade.

100 dias numa caixa de areia

Perdi uma excelente oportunidade de me matar hoje com a salsicha vencida que tirei do freezer. Cheguei a ferver a bonita e a separar cebola e massa de tomate pra fazer o molho, mas as pintas laranjas, amarelas e cor de cocô que nela se alastravam eram por demais repulsivas. Parti, cheirei e joguei no lixo. Tsc. Eu não sou mais de nada mesmo. Se bem que comi presuntada logo em seguida. Prevalece, portanto, o pendor para o suicídio lento e gradual. Aguardemos.

Nervocalm Gotas

12.6.04

Tem um telejornal local aqui em Trento , que è em alemao .

A propaganda do gàs tambem : em alemao .

Preciso dizer mais alguma coisa ????

Preciso sim : Puta que pariu !!!!! Onde foi que eu vim parar , meu rei ?!!!

Quattrostagionado por Dani

11.6.04

Cristina me conheceu de barba. Mas eu já estava com saudade do meu rostinho lindo e resolvi tirar. Correr o risco de ser rejeitado, chutado, espezinhado, repelido, desprezado por ela. Ou não. Procurei meu barbeador elétrico e cadê?, sumiu no mocó. Soquei a bota na lâmina mesmo, arrancando aqueles puta chumaços de pêlos lambuzados com espuma de barbear. Encerrado o escalpo que me entupiu a pia, verifiquei se não tinha sobrado nada no meu rostinho lindo. Nada. Beleza. Tomei meu banho quinzenal, passei rolão no suvaco e me mandei para o Centro da cidade. Caralho. Só no caminho fiz a descoberta no espelho retrovisor. Puta que pariu, um pêlo! Tinha sobrado um pêlo de barba um pouco acima da minha bochecha direita. E não era um pelinho, era um pêlo considerável! Nem que eu quisesse conseguiria aquela façanha, mas ele estava ali, ali, ali. Parei o carro e puxei o pêlo com os dedos. Nada. Catei aquela tesoura vagabunda que vem no kit de primeiros socorros e ela não cortou. Puxei o pêlo com as unhas. Puxei tanto, que ele acabou enrolando. Agora eu tinha um pentelho no rosto! Nem por uma xana eu ia deixar a Cristina ver aquilo. Lobisomem de um pêlo só? Foi quando eu lembrei das ferramentas do carro. Não, nada de usar macaco ou chave de roda, mas alguma coisa útil haveria de ter. E achei meu alicate! Grandão, revestido de plástico laranja. Com ele consegui finalmente arrancar o pêlo pentelho. Alguns passantes me estranharam olhando para o retrovisor e tentando acertar, com o alicate no rosto, alguma coisa invisível para eles, mas em São Paulo o que mais tem é louco então tudo bem. Cristina? Gostou do meu rostinho lindo. Ela é do tipo que curte beleza interior, sabe? Pâncreas, fígado, baço, essas coisas.

catarro verde

10.6.04

Christiano, pálido como farinha de mandioca, suava frio. O cano da pistola, a pelo menos um metro e meio de distância, mantinha-o em silêncio apavorado. Os olhos - sim, Chris estava sem chapéu - tinham a resignação de quem está pronto para ir de encontro a São Pedro nos próximos instantes. Enquanto isso, Samuel encarava-o, praticamente deixando Rodrigo fora de percepção. O jovem misterioso tentou falar. Samuel esforçou-se em ouvir, mas o processador de fala estava com suas pilhas descarregadas.
- Fala mais alto - disse Samuel.
- Eu... eu... só pedi fogo, uai! Não precisa apontar este trabuco nimim!
- Você pediu fogo, agora vai ter.
- Sam, calma...
- Calma o quê?! Pelamordedeus, vocês estão malucos.
O dedo indicador de Samuel empurra a alavanca. Christiano vê sua vida, seus amores perdidos, seus filhos que nunca irão nascer em toda essa fração de segundo. O coração empurra o diafragma para a baixo, e quase ao mesmo tempo, sobe até as amígdalas, juunto com um pavoroso berro que também durou uma fração de segundo.
Rodrigo, de olhos arregalados, não moveu uma célula de seu corpo; nessa fração de segundo, sabia que não podia e não devia fazer nada para ele também não levar uma bala entre os olhos. Samuel estava louco, era preciso interná-lo imediatamente.

Ônibus dos Pensadores

7.6.04

O caso dos dois papeizinhos

Mais uma história para minha autobiografia não-autorizada:

— Alô?
— Lúcia? — o nome não era esse.
— Sim.
— Oi, é o Márcio. Tudo bem?
— Oi, Márcio. Tudo e você?
— Tranqüilo. O que está fazendo de bom?
— Tô aqui no lançamento do livro de minha tia e vou fazer uma performance daqui a pouco — ela era atriz.
— Que bacana. E, escuta, o que você vai fazer depois?
— Eu? Por que?

Como assim? Afinal, já havíamos pré-combinado de fazer algo.

— Ué, queria saber se você não estava a fim de fazer alguma coisa mais tarde.
— Não posso. Depois que sair daqui vou encontrar meu marido e pegar umas coisas na casa de minha mãe.

Marido? Ela não tinha marido. Puta desculpa esfarrapada, pensei.

— Então tá. Depois a gente se fala. Tchau.
— Tchau.

Desliguei o telefone com aquela sensação "que coisa estranha". Mas, afinal, as mulheres nunca dizem claramente "cara, não estou a fim de sair com você, não se enxerga não?". Mais delicadas, elas dizem algo do tipo: "Putz, hoje não dá porque é o Dia da Árvore" ou "Sabe o que é, meu cachorro está muito doente, quem sabe na semana que vem". E, se você for esperto, não liga mais para não ouvir alguma outra frase-bomba de efeito moral.

Por isso, encolhi os ombros e disse para mim mesmo "então falô, não quer, não quer". Já ia dando o assunto como encerrado quando, súbito, me caiu uma ficha. E, olhando para os dois papeizinhos em cima da mesa ao lado do telefone, comecei a entrar em pânico.

Coincidências misturada com estupidez é receita certa para destruir sua dignidade. Uns dias antes desse telefonema, precisava gravar uma locução feminina para um trabalho que estava fazendo em meu estúdio. Só que a voz precisava ser bem jovem, quase adolescente. Como não tinha ninguém com essa característica em meus contatos, sai a caça de locutoras novas para testar e mandar a prova para o cliente.

Pedi uma indicação o Tomas, que é ator e racha o aluguel comigo. Ele me falou:

— Chama a Lúcia. Ela é atriz e faz locuções também. A voz dela é bem isso que você quer.

E foi o que fiz. No entanto, também havia chamado para o teste outra pessoa, uma atriz com quem já havia flertado. O nome dela? Advinha. Isso, Lúcia (que vou chamar de Lúcia II). Então, fiz o teste com as duas, em momentos diferentes. Tudo no maior profissionalismo, claro. Anotei os telefones das duas em dois desse papéis de bloquinhos que servem para a gente anotar as coisas e depois fazer uma puta confusão. Enfim, dois pedaços de papel de mesma aparência, escritos da mesma forma a lápis. Só mudava o sobrenome de cada uma, o resto era igual. E deixei ao lado do telefone.

No mesmo dia, o cliente me informou que havia aprovado a voz de Lúcia. Liguei para ela e dei a boa notícia. Depois ligue para Lúcia II, dizendo que o trabalho não ia rolar. Conversamos um pouco e disse que ligaria depois para marcar algum programa.

Antes de terminar a história, vamos recapitular: duas mulheres de mesmo nome, mesma idade, vozes parecidas, dois papéis quase idênticos posicionados bem próximos um do outro e um idiota fazendo a ligação.

Voltando à história, olhei para os dois papeizinhos e lembrei que Lúcia havia me dito que era casada, com cara que inclusive eu sabia quem era. Já em pânico chequei o número que eu havia discado e... Nãããããããoooooooooooooo... Puta que o pariu idiota de merda não acredito que você fez isso!

Imediatamente, telefonei para o mesmo número para tentar desfazer o mal entendido, se que isso era possível. Caiu na caixa postal, claro. Maldito olho mágico de celular. Mas se eu fosse ela também não atenderia. Afinal, só um cara muito mala iria ligar logo em seguida depois de levar um fora. Deixei uma mensagem meio desesperada na caixa postal, sabendo que nem ela nem ninguém acreditaria nessa história. Eu mesmo não estava acreditando.

Tentei mais uma vez de outra linha. Caixa postal de novo. Caracas...

O Tomas estava em casa, felizmente, e falei:


— Fiz uma puta cagada, me ajuda — e contei a história.

Ele riu muito enquanto dizia "não acredito que você fez isso". Acho que ele só acreditou porque me conhece bem e sabe de minhas "capacidades". Assim, telefonou para Lúcia e explicou minha cagada. Depois me passou o telefone e pedi desculpas a ela, que acabou achando graça de tudo. Ufa! Escapei com apenas alguns arranhões morais.

Acabei não conseguindo falar com Lúcia II naquele dia, o que foi até bom porque o episódio já tinha tirado minha vontade de ter um encontro. Acabei ligando alguns dias depois. Quando perguntei se queria fazer algo na sexta ou sábado ela me contou que andava meio ansiosa porque estava procurando apartamento para ir morar sozinha e que preferia deixar para a outra semana.

Não sei se era verdade ou não. Pode até ser. Mas, na dúvida, não liguei novamente.

Chez Nigro's - Movimento pela Insanidade Coletiva

6.6.04

Três coisas que odeio no Unibanco Arteplex:

1. O comercial da Regina Duarte
É tão irritante, mas tão irritante que sinto uma vontade quase incontrolável de atirar objetos na tela. Ou pelo menos de gritar um ?ãããããããããããã?.

2. Os comerciais com o Falabella e a Débora Bloch
Em especial aqueles em que eles fazem a "segurança do patrimônio"

3. Os comerciais com a hiena Hardy
Ela é tão desgraçada que quase faz parecer os três citados acima legais.

no escurinho do cinema com a Central de Manicures

Cuba, Ilha de Magia e Chatice...
Naquela época do ano a casa ficava infestada de romancistas-que-falam-de-cuba. Giravam em torno da lâmpada ouvindo Elis.

-Foram pra debaixo do sofá.
-Tem um atrás do quadro.

Eu tentava não matar: recolhia num copo de requeijão e a ajuda de um jornal, e os soltava do outro lado da estrada, com mão trêmula.

-A resistência heróica...

Quando eu ouvia isso de resistência heróica às vezes voltava e matava mesmo, pisando de chinelo e depois esfregando o chinelo na quina da calçada.

-Ai, tá mexendo a perninha ainda.
-Tá fazendo discurso.
-Fidel é conhecido por sua grande coragem pessoal, seu grande carisma...

Eu pisava de novo.

Às vezes um deles caía no meu cabelo quando eu estava escrevendo e me dizia que o romance é uma grande ferramenta para aferir a saúde política de um povo, essas coisas. Ou me pedia para entrar no pen club de Osasco, presidido pelo grande Dr. Mirandinha, dermatologista e poeta, autor do grande e injustamente esquecido "Veredas da Resistência" (ed. COGITEC, 1976). Eu levantava em pânico dizendo que nem morava em Osasco e dando tapas no pescoço, sentindo o romancistinha de boina correndo pelas minhas costas.

História verdadeira:

Na palestra do romancista A, o romancista B cutuca o romancista C e diz baixinho:

-Se eu algum dia virar tamanha besta solene, me mata.

Muita gente gostou da palestra do romancista A - mostrou grande indignação moral temperada pelo seu conhecido humanismo. Na saída, foram todos comer feijoada e terminaram cantando London London.

Nesse ponto chega o dedetizador.

-Essa época do ano... - diz, coçando a nordestina cabeça.

Os verdadeiros fregueses do restaurante ficam consternados:

-Quem são? Parecem humanos...
-Estavam usando talherzinhos e tudo!

O romancista A grita "Por Fidel!" e cai morto da lâmpada. Nobremente bóia na salada de frutas. À guisa de epitáfio ouve-se Dona Salete, que dá aula de matemática para alunos da sexta e sétima série no Colégio Arquidiocesano e secretamente acha Cuba superduper, dizer alcoolizada a grande frase, "ai gente, também não precisava matar."

Direto da lâmpida de Alexandre Soares Silva

Sala de Espera

Quando a gente pensa que tem todas as respostas, vem a vida e muda todas as perguntas.

Requintes de Crueldade

No seu lugar, eu não fecharia meus olhos ainda.
Não apagaria a luz nem trancaria as janelas.
Porque existem coisas que você precisa entender.
Coisas que você precisa ouvir de mim.

Eu não diria uma única palavra agora.
Não tiraria conclusões, não pararia para pensar.
Porque existem coisas que eu preciso te dizer.
Coisas que você quer ouvir de mim.

meu paredro

5.6.04

Hoje tente me amar. Venha, levante o queixo. Deixa que eu te dê uma rosa, um escravo, um torrão de açúcar. Hoje, tente fazer com que eu seja indispensável, com que eu seja matéria-prima dos seus dias, esse que, quando se ausenta, torna a respiração dificultosa e inútil, porque viver, sem mim, se torna inútil. Hoje. Me dispa em ternuras tão ingênuas pra que quando estivermos inteiramente nus, um vele com inconsciência e febre a existência do outro e então, finalmente, não existiremos. Não seremos senão vultos morenos e plásticos, nódoa no lençol alvo. E a rosa, o escravo, o torrão de açúcar descansarão em esquecimento enquanto o fogo emprestar sua dança furiosa, enquanto o pavio arder submisso e intranqüilo. Hoje me faça sua essência, sua causa e efeito. Faça com que esse gesto de adoçar com colônia tuas veias e vestes seja um jeito de dizer que me ama. Hoje borde detalhes em teus vestidos compridos, costure flores de vôos longínquos. Espere eu voltar de uma guerra infinda, mesmo que receba carta que me acuse morto, cotovelos envelhecidos no parapeito, me espere com resignação de viúva e fervor de amante.
Componha uma sonata, traduza um soneto. Hoje tente me amar. Venha, levante o queixo.

Tabacaria

Insônia

Acordou no meio da madrugada, qual este que vos escreve, e não consegue dormir? Sem problema, vasta é minha experiência no assunto, basta fazer o seguinte:

0) Não abra o livro mais próximo na página 23;
1) abra a latinha de cerveja mais próxima;
2) redija uma nota suicida ou uma redação sobre suas meias;
3) abra outra latinha de cerveja;
4) engula 20 a 40 drágeas de diazepam ou equivalente;
5) amarre um saco plástico na cabeça;
6) aperte "Publish";
7) bons sonhos.

dies iræ

4.6.04

Amigos,

De novo, sem consultar niguém, resolvi mudar. Uma das vantagens da democracia é que você tem o direito de ser ditador, se ninguém reclamar.

Mas se alguém não gostar, sou o primeiro a dizer "desculpe". Guardei o template antigo, então, para tudo há solução.

Ainda é preciso arrumar uma coisa ou outra, (deve haver algum deslise). Portanto, se alguém encontrar erro, por favor avise.

Colegas de trabalho, entrem em "edit my profile" para que o linque no nome de vocês, à direita, leve a algo diferente do que um aviso de "nem rolou".

Favor confirmar o recebimento deste memorando, em três vias carbono, e com a assinatura da D. Lindaura, a secretária.

Chefinho Rata, espero que seja do seu gosto.

Grato,

Henrique

Parabéns, miúda

... e que não continues a destruir-me os teclados do computador deitando-lhe cola por entre as teclas e as membranas.
(a tua mãe, quando te vir aqui, dá-me um tiro)

No arame

Se voce está desesperada porque dia 12 está chegando e você está na fissura de encontrar alguém e não consegue, eis aqui minha mais famosa simpatia para o seu desencalhe total:
Simpatia para conquistar seu amor :
Amarre o pescoço do Santo Antonio com o seu mouse , dê 3 voltas com o fio e pendure atrás do monitor.
Baixe pelo Kazaa as seguintes músicas:
- Eguinha pocotó
- Você é meu amor (de qualquer grupo de pagode)
- Segura o Tcham
- Pense em mim ,chore por mim.
- Funk das cachorras (ou algo semelhante a isso)
- Ave Maria com Jorge Aragão.
Coloque as caixinhas de som perto do ouvido do Santo, ligue o som em modo repetitivo e faça a seguinte oração:
"Adorado Santo Antonio essa sequencia vai repetir até meu homem surgir."
Saia do quarto, tranque a porta e vá pra rua.
É tiro e queda.Só não esqueça de pedir perdão pro Santo depois.

...

Nina, minha irmã, resolveu convidar mamãe para ir a um show de Punk Rock em algum lugar lá da Zona Sul em São Paulo, mas antes fez algumas recomendações:
- Mãe, por favor, nada de falar Supimpa, ok?
- Ok, vamos lá mina, vai ser do balacobaco!
- Não mãe, peloamordeDeus, balacobaco é pior que supimpa!
- Balacobaco é Supimpa!
- Ah mãe, assim não dá! O Carlinhos vai lá e você falando Balacobaco?
- Ta, ok, lets go now, o que devo falar então?
- Ah sei la, fala Fodasso!
- Fodasso?
- É, fodasso pra tudo. Não precisa falar mais nada, ok?E também não fica parada, tenta se sacudir um pouco.
- Ok mina, lets go now!

Foram as duas pro show.

- Mãe, não precisa ficar balançando os braços no ar, o show não começou ainda.
- Ué, você pediu pra eu não ficar parada.
- Ih mãe, olha o Carlinho chegando..olha la hein..
- ok.
- E aí Tia Sô, bele?
- Fodasso!
- Tá gostando do ambiente?
- Tá Fodasso!
- Não sabia que a senhora gostava de punk rock.
- Pois é, Fodasso!
- Mas a sra curte essa banda também, porque é nova e tal.
- É fodasso, né?
- É tia, é sim, super. Será que vai demorar pra começar?
- É, já tá fodasso.
- Manêro esse jeito da senhora balançar os braços pra cima mesmo sem musica, é bem style.
- É fodasso!
- Nossa queria que minha mãe fosse manêra assim também.
- Mas é fodasso!
- Nina, sua mãe é D+
- Ahh..ela é bem fodassa né?
- Fodassa nada, fodassa é meio ultrapassado, eu diria que ela é supimpa mesmo!
- Supimpa?
- É, ela é supimpa!
- É isso aí mãe, você é supimpa, viu?
- E você é fodassa Nina, supimpamente fodassa!

Fata

Chego na academia. Depois de correr 30 minutos da esteira (e colocar os bofes pra fora), encaro aquela bicicleta em que a gente fica confortavelmente assentado e pode ler coisas legais que lembrou de levar para a ginástica. Duro é quando você descobre que esqueceu de levar coisas legais para se divertir enquanto pedala aquele negócio chato... Aí você olha pro lado e tem uma moça bonita como as modelos de capa de revista, com jeito de simpática e um jornal inteirinho, do tipo este aí me interessa muito. Aí você espera ela ler uns dois cadernos e arrisca:
- Desculpa incomodar, mas você poderia me emprestar a parte do jornal que já leu?
E ela, com a cara mais impassível do mundo, responde, monossilábica:
- Não.
Além de bonita, inteligente e egoísta. Quando crescer quero ser assim.

Linda e Loura

2.6.04

Vida Besta

'Titiôôôô..., o que é dadaísmo?'
'Senta aqui no colinho do titio que ele explica. Pronto. Dadaísmo, minha querida, é o que tua tia Janete fazia.Ela saía e dava, dava, dava, dava, dava, dava.Por isso o titio descarregou um trezoitão na cara dela.'
'Que looouco, tio! Quando eu vou poder fazer isso também?'

Adianta dizer que a menina cresceu e prestou vestibular pra letras?
Adianta chamar a vida de besta?

Uns choram. Outros vendem lenços.

1.6.04

Hoje, num restaurante perto do escritório:
- Por favor, uma Coca-Cola, sem gelo e limão.
- Light, Light Lemon? - perguntou o garçom.
- Gelada e normal mesmo.
Sempre achei que quem pede a versão Light da bebida é que deveria especificar o seu pedido. Pois é, birra minha, mas penso que o sabor que existe há um século é que deve ser o pedido default, não a inovação recente. Enfim, chega a Coca-Cola correta, mas acompanhada de um copo com gelo e limão.
- Desculpe, mas eu pedi sem gelo e limão (preciso parar com essa mania de pedir desculpas mesmo sem ter feito nada de errado).
- Ah, tudo bem, vou trocar o copo - e vem um só com gelo. E depois um só com limão.
- Tudo bem, é só tirar o limão, eu quero só o copo mesmo - disse eu, enquanto o garçom me olhava como se estivesse pensando "ele vai beber essa Coca-Cola assim, pura?".

Veja só que coisa esquisita: o sujeito fala "uma Coca-Cola" e recebe a bebida com todos os acessórios e opcionais, Light ou Light Lemon gelada com gelo e limão; eu preciso especificar "uma Coca-Cola normal gelada, sem pedras de gelo e sem limão" para receber a versão simples. O meu idoso interior (que quando contrariado parece com o Zagallo) levanta seu dedo indicador torto em riste e resmunga "isso não faz sentido!". Da mesma forma que os apreciadores de whisky têm a expressão "cowboy" para o drink puro, deveria haver um termo similar para a Coca-Cola.

Qualquer dia desses fico ranzinza novamente e publico aqui minhas observações sobre esse costume insensato de tirar os picles dos sanduíches do McDonald's, outro absurdo.

Concatenum

Em mim habita eternamente o que de mim fizeste, este algo subjascente às incredibilidades da vida, aos reveses do mundo que tem o sarcasmo do teu sorriso. Em mim, um entardecer desperto há pouco tinge-se de cores insuspeitas que me acompanharão até o fim dos dias, como me acompanhará a outra de mim que se inaugurou pelos teus olhos e que comigo já se confunde irreversivelmente. Em mim o tanto de ti que se confundiu comigo e tornou-se a minha parte mais eu mesma.

Não Discuto

They call me The Howlin' Guava

Estou tentando virar bluesman. Todo dia eu encho a cara de bourbon e tento tocar dois acordes no meu violão - até agora, não saí do primeiro, que só acerto quando estou sóbrio. Já compus, mesmo sem acompanhamento, 115 músicas que começam com os versos "I woke up this morning/ My baby was gone". Cada uma delas tem sutilíssimas variações no tipo de interjeição utilizado ("boom, boom", "hey, hey", "yeah, yeah", "iac, iac" e assim por diante). Ainda assim, já estou bem perto do coma alcoólico e não consegui ser reconhecido como um legítimo homem-azul do delta do Tamanduateí. Penso que estejam faltando só o chapéu com estampa de oncinha e pena e a aprovação do pessoal da UnB, certificando que sou black e sou proud. Vou a Brasília bater o mojo na mesa e impressionar esses branquelos. I spell M-A-N...

Pura Goiaba