30.4.03

Chega. Deu. Eu desisto. Não brinco mais. Acabou. Era isso. Enchi o saco. Torrei a minha paciência. That's all folks. Não quero mais saber. Recolhi as antenas, baixei o periscópio, desliguei o radar. Não procuro mais, não dou mais mole, não poupo o trabalho. Vai querer? Problema seu, vire-se ou desvire-se, conforme o caso. Não se trata de nenhum tipo de voto de castidade, mas de cansaço puro e simples. Cansei a minha beleza. Há vagas, mas o departamento de recrutamento e seleção foi desativado por tempo indeterminado. Os interessados devem mandar currículo em três vias com foto, acompanhado de carta de intenções de próprio punho e de recomendações, ficha corrida, atestado de bons antecedentes e ligar um dia sim outro não para ver se já tem alguma resposta. Não fechei para balanço, mas não faço mais propaganda. Aquela coisa de mala direta, panfleto na rua, comercial em horário nobre, marchandising na novela das oito, encarte em revista, página inteira em jornal - tô fora. Agora vou ser cool, tipo obra rara que tem que ser garimpada em sebos, edição de 1.000 exemplares, para colecionadores, lançada há trinta anos. Não facilito: sorrisinhos, charme, insinuações, entradas, bola picando? Forget it. Vai ter que fazer promessa para Santo Expedito, Santo Antônio e Nossa Senhora Desatadora de Nós. Vai ter que rebolar meu nêgo, que agora o furo é mais embaixo, o arroz é mais soltinho e a rapa é na tampa.

Tá a fim? Muito bem, me convença por que você é, afinal de contas, o homem da minha vida.
E anda logo que eu estou com pressa.

Não Discuto

Eram onze horas da noite e eu fui à locadora com meu amigo Uri, Uri Geller devolver o DVD que tínhamos assistido.
Minha mãe, muito preocupada, relutou, dizendo para não sair a essa hora da noite porque os traficantes do bairro já tinham dado o toque de recolher, mas eu não liguei.
Entregamos o DVD na locadora e voltamos para casa em passos lentos.
Já no quarteirão de casa vimos um veículo suspeito descendo a rua, à 10km/h. Saveiro, vidro fumê, carrão rebaixado, ligas metálicas, calotas cromadas, aerofólios, sonzão da porra, Racionais MC's e o carro pulando como um orangotango no cio.
Meu amigo, muito calmo, cochichou:
- Agora a gente vai morrer...
Eu disse:
- Ah não! Fica sossegado! Aja com naturalidade! Comece a dançar no ritmo e cantar a letra da música.
- Playboy bom é chinês ou australiano! Fala feio, mora longe e não me chama de MANO!

Na realidade eu acelerei o passo para não cruzar com o carro, mas não adiantou, a Saveiro vinha em nossa direção. Em um milésimo de segundo pensei nas várias possibilidades de abordagem do motorista do automóvel:
"Você sabe pra que lado fica Jericoacoara?"
"Tá indo pra onde? Quer uma carona?"
"Porra! Cê conhece essa nova do Racionais?"
"Quanto vale a chupeta?"

O carro se aproximou e em uma fração de segundo o vidro abaixou, surgindo uns cinco rostos na janela, com um cano preto (ou algo muito semelhante a um cano, preto) na mão, gritando:

- MÃO NA CABEÇA! MÃO NA CABEÇA!

Falou que eu ia botar a mão na cabeça.

Saí num disparo fenomenal em direção à minha casa. Em linha reta. Como nos desenhos animados, quando o personagem corre do tronco da árvore em linha reta, ao invés de correr para o lado, e sempre acaba atingido.
Eu era um alvo fácil até para Muhammad Ali, Michael J. Fox ou o Papa João Paulo II. Corri em movimento retilíneo e uniforme até me sentir seguro, ou ouvir o carro queimando os pneus com cinco adolescentes desprovidos de cérebro lá dentro dando gargalhadas e achando tudo aquilo muito engraçado.

Mantive a calma.
Procurei por câmeras do programa do João Kléber ou do Serginho Mallandro.
Não encontrei nada.
Achei então melhor procurar por câmeras do educativo Jackass, mas também não achei nada por ali. Cocei a cabeça sem entender qual era a daqueles caras.
Uns dois minutos depois perguntei pelo meu amigo.
MEU AMIGO?
Sumiu.
PORRA! MEU AMIGO SUMIU!

Pensei que tinham levado o filho da puta, mas ele não é nenhum filho de dono de multinacional, então achei que um seqüestro seria meio inviável.
Não tinha ouvido nenhum disparo.
Provavelmente tinham zoado a gente com um cabo de guarda-chuva ou coisa que o valha.
Gritei pelo nome de Uri:

- URIII!
Silêncio.
- URIII GELLERR!
Mais silêncio.
- JÁ ACABOU A BRINCADEIRA URI. PODE SAIR DAÍ. OS CARAS FORAM EMBORA.
Gafanhotos e pererecas respondiam em uníssono:
- CRII, CRRI, CRRI! RABIT, RABIT, RABIT!
Caralho.
- URI, SAÍ DAÍ PORRA! ERA UMA BRINCADEIRA, AGORA JÁ ACABOU! VAMO EMBORA.

Meu amigo Uri surgiu das profundezas do pântano que fica na frente da minha casa.
Levantou com elegância do mato, onde o capim atinge cerca de dois metros de altura. Ajeitou o cabelo, e veio em minha direção, todo sujo de barro. Parecia uma criança pré-primária recém rolada na terra. Uma beleza.

- Porra meu. Puta brincadeira sem graça.
- Cada um se diverte como pode, Uri. Cacete! Você se jogou no barro, cara.
- Ah. Queria salvar a minha vida.
- Tá certo.

- E o que você fez?
- Corri.
- Correu?
- Corri.
- Pra onde?
- Em linha reta.
- Muito inteligente.
- Muito inteligente é se jogar no barro. Tem altos calangos, rãs, sapos e gafanhotos nesse mato. Deve rolar maior suruba de bactérias e micróbios aí.
-Mas eles podiam atirar!
- Eu sabia que era brincadeira..
- Então por que correu?
- Porque nunca é bom confiar demais. Ia acabar com a graça dos...
- URI! CORRE! CORRE! ELES TÃO VOLTANDO!

Ouvia-se de longe o ronco do motor do carro arrancando em nossa direção.
Eu corri, de novo.
Meu amigo se jogou no mato, de novo.
O automóvel virou a esquina.

- Ele virou, Uri!
- Ah! Ah meu, vai se foder!

- VOCÊ SE JOGOU NO MATO, DE NOVO?
- ME JOGUEI!
- CARALHO! COMO VOCÊ É BURRO!
- BELEZA, CORREDOR!

Moral da História: Sei lá qual é a moral da história. Talvez seja "brincadeiras com armas não têm graça" ou "também morre quem atira", ou ainda "? Você gosta de sair por aí com seus amigos de carro para ameaçar transeuntes com uma arma? Então você é um babaca."
Mas o que importa é que não foi engraçado.

não vá se perder por aí

Educação Sexual

- Mãe, o que é TPM?
- TPM é quando o seu pai aperta o tubo da pasta de dente no meio, aquele inútil desgraçado.
- E mãe...
- Sai daqui, moleque! Pára de encher o saco!

...

- Pai, qual é a diferença entre o homem e a mulher?
- Simples, filho. O homem tem pinto e a mulher tem uma terrível dor de cabeça.

...

- Pai, o que é "pensão alimentícia"?

...

- Pai, é verdade que pra eu nascer você colocou uma sementinha na barriga da mamãe?
- Até hoje ela não conseguiu provar isso. E pára de me chamar de pai, moleque.

vida ou-

– Sabe, vó, eu matei um grilo um dia desses.
– Ah, é?
– É.
– Por quê?
– Porque ele estava vivo.
– Só por isso?
– Vivo e dentro da minha casa.
– E por isso você o matou?
– Sim.
– Matou como?
– Com um murro e uma pisada.
– Um murro?
– Sim. Ele tava na parede. Então eu dei um murro. Ele caiu. Eu pisoteei.
– Coitadinho.
– E eu nem sinto remorso.
– Se não sentisse remorso nem se lembraria disso.
– ...
– Né?
– ...
– Pedro?
– Sabe que de vez em quando eu odeio muito a senhora? Mas só por uns instantes.

Utopia Dilucular

A CORRENTE

Esta Corrente é tão antiga quanto a Humanidade; suas origens se dissolvem no discurso confuso dessa Grande Mentirosa, a História. A Corrente não pode ser interrompida, não pode ser quebrada; o Céu e a Terra passarão, mas a Corrente permanecerá. Você, agora como Modesto Elo desta Corrente Indestrutível, tem como dever passar adiante este texto para mais vinte pessoas, num período de quarenta e nove horas após o seu recebimento. Procedendo assim, o seu Ser estará em Harmonia com a Lei Imutável do Universo, que é a Lei da Causa e do Efeito; e também a Corrente será conhecida e expandida, aspergindo suas Bênçãos sobre seus Elos. Porém, de acordo com a atitude de cada um ao receber a Corrente, podem advir tanto Bênçãos como Desgraças, senão vejamos:

- Gregor Samsa recebeu a Corrente e ignorou-a; numa manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, deu por si na cama transformado num gigantesco inseto;

- O Faraó do Egito riu-se da Corrente e Deus mandou uma penca de Pragas sucessivas sobre ele e, de lambuja, mandou Moisés dar no pé com todos os escravos judeus, causando um tremendo déficit na mão-de-obra da Construção Civil;

- Juan Cleber nem deu bola pra Corrente e uma doença rara transformou seu cérebro em Miojo sabor Galinha Caipira; desde então ele tem utilizado apenas o Bulbo Raquidiano para pensar;

- Derrik Hewlett Packard, um nerd muito supersticioso, usou um programa de envio de SPAM e mandou a Corrente para 35 milhões de e-mails. Um deles caiu na caixa postal de Hannibal Lecter, que localizou Derrik e brindou-o com um peeling de ácido fluorídrico gratuito, graças à Corrente;

- Severino da Silva recebeu a Corrente e a enviou para vinte pessoas. Um dia, chegando em casa, encontrou a mulher dando para um pastor da Igreja Universal, o que trouxe incontáveis Bênçãos àquele lar e, nove meses depois, um filho Ungido que fez companhia aos seus onze meio-irmãos;

- Deusdolina Cícera de Canjibirra, gari, encontrou um papel com a Corrente na rua e seguiu à risca as instruções; depois de uma semana, foi atropelada por uma perua escolar cheia de pré-adolescentes que prestaram, com inépcia mas muito boa-vontade, os primeiros socorros. Disso resultou uma lesão na espinha dorsal que a deixou paraplégica e aposentada precocemente por invalidez, recebendo uma nababesca pensão de um Salário. Viram como a Corrente funciona?

corrente pra frente do Padre Levedo

29.4.03

A força das mulheres frágeis

Elas não põem o pau na mesa, não decidem quase nada, falam baixo, sorriem pouco.
São a versão moderna da mulher do seculo XIX, trêfegas e românticas e e mortalmente anêmicas e doentes, que resolvem os problemas desfalecendo estrategicamente e tendo como álibi os apertados espartilhos da época.

Precisam ser amadas pelo que são, do jeito que são. E que sejam perdoadas pelo que não são - porque mais não podem ser.

Elas sofrem mais do que as outras, choram mais do que outras, suplicam mais do que as outras, desmaiam mais do que as outras.

Mesmo com a vida ganha, estão sempre insatisfeitas. Mesmo com teto e comida, sentem frio e fome. Mesmo com um homem do lado, teimam em namorar a solidão.

Elas não conseguem e ponto. Elas não atingem e pronto.
A mulher frágil não agüenta o tranco, não tolera o peso. Então simplesmente não o carrega.

São bola de ferro, fardo e cruz.

E assim conseguem o que querem.

elasporelas

O telefone toca..

- Alo..
- Oi Dé tudo bem?
Do outro lado aquela voz gostosa, macia, sedutora de alguém que no ano passado me ajudou em diversos trabalhos,me deu a placa USB que faltava pro meu Scanner,foi me seduzndo aos poucos com aqueles olhos azuis e quando eu decido ceder aos encantos, ele diz que só faria sexo sem beijar na boca, prostituto filho da mãe!
- Bele, e ai, como é que ta, fazem uns 5 meses que nem te vejo, aconteceu alguma coisa?
- Tudo ótimo, vai fazer alguma coisa amanhã?
- Nem..
- Nem o que?
- Nem vou fazer nada
- Posso ir aí na sua casa? Queria que voce visse um trabalho,aí a gente resolvia umas pendencias
- Nem..
- Nem o que? Porra meu vc nao falava gíria antes.
- Só
- Vai conversar sério ou vou ter que desligar na sua cara?
- A tua voz continua a mesma,mas a tua educação...
- Pode ma ajudar fazer o trabalho ou nao?
- Pagamento adiantado, 5 beijo na boca sem sexo.
- Vai jogar na cara?
- Aham.
- To precisando de voce..
- E eu to precisando dormir.
- Comigo?
- Nem, to sem grana pra pagar o serviço completo.
- Terceira vez que voce me ofende.
- Na quarta voce desliga?

Desligou.

Casos e Acasos Virtuais

Meu pais e meu irmão vieram ao meu casamento. Minha mãe chegou dia 16 e meu pai e meu brother dia 21. Com minha mãe não tive problemas, a gente ficou nessa de fazer lembrancinhas de casamento, dar um toque especial no vestido, bater papo e dar umas voltas no centro. Com a chegada do meu pai e do meu irmão começou o inferno: Eles queriam ir pra lá e pra cá, turistas mesmo e eu tinha que ir junto, deixando de descansar, de pensar na festa, de ligar pros meus amigos. O resultado foram inúmeras brigas justo quando eu necessitava de um pouco de paz.

Tive desentendimentos com o Dani, não brigas, mas foi foda. Com meus melhores amigos idem e eu achando que estava fazendo a coisa certa e nada, o resultado era dar mancada com minha família e com meus amigos. Sabe quando você se sente um lixo, uma merda mesmo e não consegue fazer nada certo? Pois foram assim meus últimos dias de solteira, uma bosta total.

Na festa, que era um almoço dos bons, eu e Dani nos sentamos na mesa central. Imaginem um U com os noivos no centro e os convidados nas "pernas" do U. Meus pais estavam do meu lado, perto, mas a nossa mesa era destacada, não fazia o angulo. Minha família estava naquela de não entender nada, não curtir, não sorrir. Minha mãe é bem mais amigável e até que se divertia, mas meu pai criticava quanto vinho ela bebia e ficava, a cada prato, perguntando se era bom, como se ela fosse uma cobaia de corte que experimenta e diz pro rei que não tem veneno. Meu irmão se sentou no meio dos dois e quando eu me sentei a primeira frase que ele disse foi, ao ver somente vinho nas mesas: "Quero uma coca". Eu tinha acabado de me casar e porra, o cara não se enxerga? Eu respondi, em voz alta mas num português bem veloz: "Pede você a coca". E minha mãe pediu a coca dele.
Nem um sorriso, nem um abraço, nada.

chi:ko:rit:a weblog

Meses atrás, num arroubo de juvenil imbecilidade, escrevi seu nome num tronco de árvore. Estava andando, vi aquele tronco coberto de musgo, peguei um graveto e alguns segundos depois lá estavam as seis letras enfileiradas. Dei meia-volta e não pensei mais no assunto.

Semana passada, estando no mesmo lugar, lembrei-me do fato. Segui o mesmo caminho que fizera naquele dia, atravessei o lago, andei alguns metros pela trilha e lá estava ele, nitidamente gravado no tronco como se em vez de um graveto eu tivesse me valido de ferro e fogo.
Então senti uma certa melancolia. Porque aqui dentro seu nome já não é tão legível. Fica mais difícil a cada dia discernir o significado daqueles arabescos que vão aos poucos sendo cobertos pelo velho musgo da alma. Pressinto o dia em que poderei escrever o nome de outra mulher ali, sem maiores problemas.

Quanto ao outro tronco, o real e palpável, nada que uma motosserra não resolva.

Jesus, me chicoteia!

27.4.03

DIARRÉIA

Consegui convencer meu corpo cansado e o meu cú frouxo para conseguir chegar sem maiores danos até o posto de sáude. Ao chegar, uma fila enorme formada de mulheres acalmando crianças chorosas no colo, velhinhos limpando seus narizes catarrentos pela décima segunda vez em seus lencinhos, conseguindo a proeza de dobrá-los mais vezes do que as leis da física permitem. Mocinhas com seus 16 anos e barrigas de 7 meses e meio. Material para dar e vender para qualquer antropólogo que queira aventurar-se por estas bandas pobres.

Enfrentei a tal fila, trançando as pernas, contraindo a bunda e tentando não pensar no que era quase inevitável. Cheguei a pensar em simular um desmaio, uma convulsão, mas cheguei a conclusão de que as recepcionistas estava fartas de tais encenações quando vi o tédio rascunhado no rosto de cada uma.

Usei de gestos leves e voz baixa para informar que eu precisava de um clínico-geral. Usei da mentirinha que havia esquecido o comprovante de endereço, afinal, eu estava num posto de saúde de Taboão da Serra. Moro em Embu das Artes, mas o posto de saúde mais próximo de casa é o da cidade vizinha, e eu não poderia correr nenhum risco, meu cu não agüentaria muito tempo. Pela minha cara, a recepcionista deve ter pensando que eu realmente não estava em condições de lembrar ou de procurar nas gavetas um comprovante de residência, de modo que aceitou o endereço falso que informei e apontou-me o corredor para que eu aguardasse minha vez para a consulta.

Mal entrei no corredor e fui olhando porta por porta, na esperança de encontrar a milagrosa palavra "masculino" ou "banheiro" ou "homens" ou o desenho de uma cartola ou de um meininho como nos sinais de trânsito, o lugar aonde eu poderia render-me à minha diarréia que estava cobrando o prêmio por sua paciência. Adentrei o tão sonhado banheiro e descobri que ele não era tão "dos sonhos" assim. Não havia sabonete líquido para lavar as mãos, ele era pequeno e o mais desesperador era que NÃO HAVIA PAPEL.

Saí, e sem pensar em vergonha ou qualquer timidez, afinal, vergonha maior seria ter as calças borradas, entrei na enfermaria e, educadamente pedi licença às enfermeiras e peguei um dois três quatro quatro cinco seis pedaços de papel. Elas não ligaram, provavelmente outros já haviam feito o mesmo. Corri para o banheiro, e ainda descobri triste que a porta não possuia trincos. Numa demonstração ímpar de paciência e coragem isolei a borda do vaso para então começar o ritual de evasão, sempre com os reflexos em dia para gritar "TEM GENTE" ao menor movimento da porta.

Apesar do prazer que sinto em demorar-me quando vou ao banheiro, até havia levado uma revista para matar o tempo, como faço de costume, não quis arriscar-me a perder a voz de tanto gritar para alertar minha presença. Voltei ao corredor de espera, esperei mais alguns minutos e escutei meu nome sendo chamado por uma voz feminina no consultório número três.

Era uma mulher nova, mais alta do que eu, usando óculos e cabelos alaranjados. Fez as perguntas de praxe, arriscou o nome da bactéria, impronunciável e "imlembrável". Pediu para que eu sentasse na maca para que utiliza-se o estetoscópio em mim. Pediu que levanta-se a camisa. Deu atenção a minha tatuagem horrível nas costas, disse ter gostado. Os olhos arregalaram-se quando viu meus piercings no mamilo. "Posso?" ela perguntou, ao que eu respondi com uma sacudida de ombros, nem imaginando o que ela queria dizer com isso.

Deu uma mordida de leve no mamilo esquerdo, que resultou num "ai" abafado meio bichistico da minha parte. "Doeu?" "Não beibi, não esquenta". Voltou a dar moridelas e lambidas, e o cu avisando que estava com saudades do banheiro sem trinco na porta. Soltei um "Porra" baixinho por entre os dentes e ela "Oi?". Segurei seu peito esquerdo e disse "Beibi, infelizmente o que eu preciso hoje é de um remédio." "Oh, desculpe". "Sem problemas". Ajeitei a camisa enquanto ela escrevia a receita, "Ei, até que você não tem um garranchão.". Ela sorriu e voltou a escrever. Carimbou a receita e o atestado que eu pedi para poder faltar ao trabalho com a consciência tranqüila. Na despedida, enfiei a língua em sua garganta e pedi desculpas pelo meu cú.

Corri na enfermaria para pegar os os sete papéis (mais um pra garantir) e de lá para o banheiro mais uma vez e mais uma vez cometi o ritual de isolar e mijar pelo rabo e gritar "TEM GENTE". Dali, fui pra uma sala também cheio de enfermeiras e de gente internada. Dei a receita para o enfermeiro bicha que antes de olhar para a receita abriu um sorriso para a camisa que eu usava, com a estampa de uma banda inglesa "Nossa, nunca que eu ia pensar que alguém por aqui ia gostar deles também" e começou a cantarolar as músicas da banda, imitando os treijeitos do vocalista enquanto preparava a agulha e o soro.

Como não havia mais macas, tive que contentar-me com a cadeira dura de plástico, ouvindo o enfermeiro (ainda) cantando as músicas enfermaria afora. Eu tentava encontrar uma posição confortável, e olhava para o soro que parecia descer cada vez mais devagar. Curvei-me abaixando a cabeça sobre os braços cruzados sobre as coxas, torcendo para pegar no sono, para dois minutos depois ser advertido pelo enfermeiro que aquilo só faria o soro descer mais devagar. Então juntei mais duas cadeiras e joguei-me sobre elas, esquecendo a dor nas costas e o enfermeiro só apareceu para avisar que o soro havia acabado.

Saí do posto de saúde com o sol do meio-dia fritando os piolhos, com um algodão tapando o furo do soro e torcendo para que Cristiane tivesse comprado maçãs e preparado uma jarra de chá-mate gelado antes de ir para o trabalho.

um oferecimento Enloucrescendo

Idéia para Cena Inicial de um Filme de Intriga e Espionagem Internacional

Casal está na espera da PIzza Hut. A atendente informa que levara entre 21 e 22 minutos para serem atendidos. Enquanto esperam, resolvem se beijar. Se posicionam ao lado de um lixo de metal vagabundo e se abraçam.

Passados alguns segundos, um sujeito pede passagem e joga algo no lixo. Como o recipiente é de metal, faz um barulhão. O sujeito se retira. O casal, ouvindo o barulho, olha para o lixo para ver o que o rapaz jogou. Na parte destinada ao cinzeiro, há um alce sentado. O alce da tchau para o casal.

O casal se vira para o rapaz que jogou o alce no lixo. O sujeito faz uma cara de "é memo?" e exclama:
- é reciclável.

E esse é pontapé inicial para um filme de espionagem, ação e intriga internacional, uma vez que o alce tem documentos secretos que se caírem nas mãos erradas podem causar a terceira guerra mundial e se caírem nas mão certas virarão um belo passaro feito com a milenar arte do origami.

roteiro dos Veríssimos

Das vantagens de se ter marido
(ou As agruras de um descasado)

Dormir. Dormir sozinho é a pior conseqüência de não se ter marido. Mesmo que você procure coisas boas aí, como poder dormir na diagonal ou ter o edredon só para você, não adianta: dormir juntinho do marido é uma das coisas que dá sentido à vida.
E nem vou comentar o que é chegar da balada, ainda fritando, e ter de encarar aquela cama enorme e vazia...

Sexo. Não que falte gente para transar. Disponíveis não faltam. Mas o círculo se restringe se buscarmos aqueles que nos animam. E mais ainda, se quisermos alguém que não dá vontade de mandar embora logo depois que gozamos.
Marido está sempre ali do lado, pré-aprovado e pronto para te usar e ser usado. E depois de gozarem ninguém precisa falar nada. Ou podem dizer um simples eu te adoro, se abraçar e cochilar...

Almoço. Sabe aquele dia no meio da semana, pouco trabalho, duas horas de intervalo e que nenhum de seus amigos pode almoçar com você? Bem, não preciso falar mais nada...

Viagem. Chegar de viagem e não ter ninguém te esperando é o fim. E mesmo que ele não possa ir te buscar, chegar em casa e encontrá-lo na sua cama é um dos maiores prazeres existentes. Isso se o marido não viajar com você, o que é ótimo. Viagem de ônibus, sem marido, não dá. No ônibus você pode invadir a poltrona dele, dormir escorado no seu ombro e se levar uma manta, ainda passar a viagem toda de mãos dadas com ele.

Supermercado. Mesmo que fazer supermercado não seja uma tarefa conjunta, um marido sempre participa desse evento, mesmo que seja nas compras de lanche ou ajudando a subir com as sacolas. Sendo solteiro... pode desistir. Não conheço nenhum amigo que faça supermercado com amigo. A não ser, é claro, que dividam o mesmo apartamento...

Lanche. Lanchar ou tomar café sozinho é terrível. Principalmente se você é daqueles que adora arrumar a mesa, colocando todos os pratos, copos e talheres possíveis e tudo o que tem na geladeira para poder lanchar tranqüilamente. E nem falo da quantidade de comida que sobra na geladeira se você é sozinho...

Não sair. Quando você tem marido você pode desistir de sair em pleno sábado à noite. Simplesmente dizer, ah, vamos ficar em casa? e desmarcar ou dar um bolo no planejado para ficar assistindo um filme, namorando ou indo dormir mais cedo. E no outro dia ele ainda vai acordar cedo e disposto como você.

Bem, além disso tudo, um marido te dá presentes, às vezes por motivo algum, oferece para pagar sua conta no restaurante, cuida de você quando você bebeu demais, empresta roupa, dinheiro, carro, escova de dentes, te abraça à noite se você tem pesadelo e te dá conselhos mesmo que você não queira ouvi-los.

Olha, se não for assim, não dá para enquadrar na categoria marido. Pois a única pessoa que cuida melhor de você que um marido é você mesmo. E vice-versa.

polêmica na Bárbara e Heliodora

No teto do quarto do filho, Orestes mandou pintar um surpreendente Cristo agonizante, banhado em luz solar e crucificado em rosas renoirianas. As rosas pareciam tão plenas de luz, tão reais, tão desabrochadas e frágeis, que as visitas olhavam disfarçadamente para o chão, buscando encontrar algumas pétalas tombadas. Orestes sorria, inflado de orgulho, ao contemplar as inesperadas reações que o Cristo das Rosas causava nas pessoas. E sempre repetia ao seu único herdeiro: “Orgulha-te, Orfeu! Tens o próprio Filho de Deus a vigiar-te o sono e a abençoar-te os sonhos! Qual outra criança, nesta cidade, neste país, tem o privilégio de adormecer e despertar debaixo de uma obra de arte assim... divina?”
Certa noite, após o jantar, o menino comentou: “Na escola, papaizinho, chamam-me de Pequeno Belzebu, chamam-me de Cabeça de Cavalo... Também dizem que o meu cérebro vai crescer sem parar e sair, aos pedaços, pelos meus ouvidos e pelos furos do nariz!”
Orestes não tirou os olhos do cálice de sirop de grenadine, quando murmurou: “Somos o que somos, e não devemos dar importância aos que nos olham com espanto ou desdém. Chegará o dia, escuta-me, menino, em que seremos nós a rir de todos esses ignorantes, desse que hoje se divertem à nossa custa. Nesta vida, Orfeu, nada como um dia após outro... para que a Implacável Justiça de Deus se manifeste!”
No inverno daquele mesmo ano, um raio explodiu no interior da capela do Colégio Marista. Morreram três professores e oito alunos. Entre os feridos, vinte garotos e o bedel, estava Orfeu. Sobrevivera, mas suas feições ficaram irreconhecíveis.
Assim que voltou do hospital, Orestes apanhou uma bacia, aqueceu boa quantidade de alcatrão e, com a mistura negra e viscosa, pintou todo o teto do quarto do filho. Em minutos, fez desaparecer completamente o magnífico Cristo crucificado em rosas. A revolta que aquele homem sentia, profunda, corrosiva, não dava lugar a qualquer forma de arrependimento, muito menos ao mais débil receio de ser castigado por Deus. Daquele dia em diante, Orestes, o pai de Orfeu, tornou-se o mais descrente entre os descrentes.
...
Faz noventa e cinco anos que tudo isso aconteceu. Noventa e cinco anos... quase 1 século! A casa onde viveram Orestes e seu filho há muito já foi derrubada. No local, existe agora um bar ordinário, com paredes pintadas a óleo, num verde muito escuro, quase negro. Uma escadinha estreita leva ao segundo pavimento, que serve de depósito. Lá, entre engradados de cerveja, mesas quebradas, imprestáveis cadeiras de plástico e pilhas de jornais velhos, uma vez por ano, sem que ninguém veja ou saiba, infalivelmente, repito, uma vez por ano... chovem rosas; perfumadas rosas renoirianas.

conto do Caderno Mágico

26.4.03

texto sem título

Vocês acreditam que se pode amar mais de uma pessoa ao mesmo tempo? Amar mesmo, como namorados, não amor de mão, pai e irmãos, amor carnal, mas amar, não gostar, amar, esse sentimento que todos acham único, o Amor propriamente dito, tão confuso e indescritível, talvez alguns achem que Camões conseguiu Lê-lo, acho que ele enxergou um começo, mas nada o explica, por que dizem que só podemos amar uma pessoa? Por que não podemos ter mais de uma mulher e quem disse que não poderíamos várias? Estamos tão obcecados com a idéia de que só se pode amar uma vez na vida uma única pessoa que é absurdo pensar de outra maneira, choca, escandaliza, magoa...Machuca.
Perverso, como diriam as crianças "o amor é uma flor roxa, que nasce no coração do trouxa", sim, nasce mesmo, deixa a gente bobo, propício a cometer loucuras.
Você já traiu? Não? Por quê? Porque ama? HAHAHAHAHA não me faça rir...
É só o amor, é só o amor, que conhece o que é verdade... Piada...
Somos bestas, criados com o principio judaico cristão, não há amor mutuo, aqui é tudo muito egoísta, muito mesquinho, apenas um! Aquela com quem você se casará e passara sua vida, se separar é porquê não é a pessoa certa. Será? Ela pode ter sido por um tempo, e agora não mais! Agora não mais!! Quem disse que o amor é eterno? Deus? Ou você leu em algum diarinho imbecil?
Sim, nós podemos amar mais de uma pessoa, não se engane, curta a vida, não se arrependa, muda que quando a gente muda o mundo muda com a gente, não se sinta mal, não se mate por isso, ou talvez não, talvez eu esteja errado, acho que não consigo concluir isso pois não existe conclusão, não existe uma verdade, existe sim idéias, mas que podem mudar, da noite por dia...

Diarréia Mental- Um erro se comete ao equivocar-se

25.4.03

A oração é sua dose diária de conformismo. Cada vez que você reza é como se você estivesse afirmando "eu tenho alguém pra me ajudar e me apoiar quando estiver na merda" ou "eu não sou capaz de fazer nada sozinha(o) e preciso sempre de alguém para me apoiar". É um belo certificado de "oi, eu sou uma fracassada.com.br"
Não tem ninguém pra pedir ajuda. Somos sozinhos nesse universo mas como isso é muito assustador as pessoas criaram Deuses.
Deus é uma coisinha que eles inventaram pra você dormir a noite.
É fácil perceber isso porque quando temos um puta problemão ou um probleminha a frase que mais se ouve é "ai meu Deus" "se Deus quiser" "Deus me ajude" e as pessoas rezam, e as pessoas fazem promessa e as pessoas pedem ajudas divinas de milhões de santos. As pessoas tacam tudo na mão de 'Deus' e vão dar o rabo.

Abscesso

ela já deve estar de saco cheio de tanto que eu chamo ela de marmota, ela já deve estar de mau humor de tanto que eu fico insistindo que ela é uma marmota legal, ela já deve estar puta da vida com as minhas musiquinhas idiotas em homenagem a ela, ela já nem quer mais me ver pintado de ouro mas ainda assim eu continuo, eu estou aqui, é amor, eu quero que ela me veja, eu quero passear com ela na londrina desolada depois que (quase) todos os nossos amigos se foram e passear com ela à noitinha e andar em lugares novos e dizer a ela que ela tem a mim e eu tenho a ela, sou um cachorro fiel ao lado dela, uma cachorro dócil e quero que ela saiba que eu desejo muitas felicidades a ela e etc etc mas o mais importante é dizer que a gabi é uma marmota legal/ a gabi é que tem o know-how/a gabi é que sabe o canal/a gabi é a maioral/a gabi é uma marmota suuuuper legal! gostou, gabi, da minha musiquinha idiota, é infantil, é debilóide, mais é de heart pra heart, é de love pra love que faz aniversário, 24 anos no dia 24 de março: passeia então comigo, amor, nas avenidas da cidade desolada, bebe comigo nas mesas desoladas dos bares, caminha comigo na desolação da uel e pode ficar de mau-humor que eu vou rir do seu mau-humor e deixar você mais feliz. mas me acompanha na higienópolis, na direção da ísis, me acompanha na mato grosso na direção do miguel, me acompanha, amor, na direção da cidade sonhada, imaginada, onde nós dois vamos brincar de mímica e pintar os quadro maaaaaais horrorosos da face da terra!

radiografia da maçã no escuro

- Meu amor, se você um dia me trair, não me deixa saber?
- Eu não vou te trair.
- Mas tudo bem se rolar, só acho sacanagem que eu fique sabendo. Se um dia isso acontecer promete que não me deixa saber?
- Humm... E se já tiver acontecido?
- ENTÃO SUA ÚLTIMA CHANCE É AGORA! CONTA LOGO!

na corda bamba de A Bêbada e o Equilibrista

Todos têm seus dias de ser louco ou sentimentalista. Estes são os meus.

- Você... perdeu a memória?
- É.
Quem perde a memória nem reticências tem pra usar: não sabia o que dizer. Afinal, nunca tinha visto aquela pessoa na vida. Decerto poderia até conhece-la, dalgum lugar, mas agora não tinha a menor das idéias donde.
- Sou casada com o senhor.
"Ai, meu Deus" - não se lembrava qual religião, se era expressão ou crença, se tinha um ou vários ou ainda se era ateu, mas era o único pensamento cabível no momento. Por um segundo e não mais do que isso, embora parecesse uma eternidade, imaginou as possibilidades:
"... e se eu amo, e se eu odeio, e se finjo? É por interesse, por chance, por outra, por mim? Tenho filhos? Gosto das crianças? Com sal ou sem nada? Que programa assistir no domingo?..."
E assumiu. Perdeu a memória e queria começar simplesmente do início. Começar do começo, como é certo. Não queria saber o que perderia: pediu a todos que nunca tentassem. E nunca lembrou.
Saiu ganhando.

Esta barra é azul. Se não for, contate-nos. Gratos

Telefone tem cada uma. Uma amiga minha:
- Por favor, Anderson está?
- Não tem ninguém aqui com esse nome.
- Não tem? Anderson Luís?
- Ah, sou eu mesmo.

Capricho Girl

Dez coisas

1. Você já parou para pensar sobre como vai morrer? Velha e dormindo? Atropelada por alguém que ia ao Carrefour comprar dentifrício? Com um tiro, em troca dos R$ 50 que você não entregou ou não tinha? Nos braços de uma mulher? Tenho pensado na morte com freqüência desde os 9 anos, pelo menos. Fico olhando para os nós dos meus dedos e digo, para os nós apenas, puxa, virarei pó. Pelo convívio com a idéia, morrer não me incomoda. Ao contrário: dá uma justa perspectiva às coisas.

2. Para o que você vive? Por um bom pedaço de bife?*

3. Morrissey, em Cemetery Gates, pergunta onde estão aquelas pessoas 'com amores e ódios e paixões como as minhas/ elas nasceram e depois viveram e depois morreram'. It seems so unfair, I want to cry. Não acho injusto e nem quero chorar por quem se foi. A cada qual seu período. Que vivam. Eu vou.

4. Diga de uma vez todas essas coisas bonitas que estão embaixo da sua língua antes que ela morra. Isso não vai te matar, então diga. Ela não quer um réquiem.

5. Será que atribuir valores às coisas (a minha tão amada caneta Parker, a minha sagrada cerveja enquanto rebolo esta bundinha gostosa no meu bar favorito) nos salva ou nos condena?

6. E a convivência com os outros, será que nos ensina alguma coisa ou nos leva ao encasulamento? Digo sempre que a Rua Augusta é a prova do meu amor pela humanidade: agüentar o ronco de um motor às 3 da manhã sem ir pra sacada e gritar FILHADAPUTA não é para qualquer um. As pessoas não se dão conta do barulho que fazem. Nunca.

7. Amigos deveriam vir com a tecla PERDOAR.

8. Vamos então morrer todos cancerosos para que as pessoas continuem a levar suas vidinhas insossas?

9. Por que o meu cdplayer se desliga sozinho toda a vez que passo pelo Banco Safra, na esquina da Augusta com a Paulista?

10. Vamos todos morrer. Viva.

* A pergunta é do Lama Yeshe, mas formulada de outro jeito.

questões do Tome Uma Xícara de Chá

24.4.03

Parecia filme
Mais uma vez, a roupa de oncinha. Sexta-feira Santa a dentro. Tiara de diabinho. Deus, uma puta velha com tiara de diabinho, blusa de oncinha e Despeito De Dar Dó. Sim, tudo com D. De Deus, de Diabo, de Demência. Desamor. Lá, na escadaria do prédio da mais fodida de todas as avenidas. A mais fodida de todas as vidas. Os dois. Na escadaria.
- ... continua doendo.
- A culpa não é minha, essas coisas acontecem.
- Não diga que a culpa não é sua. Não quero acreditar. É minha?
- Não, essas coisas acontecem.
- Eu não quero que doa.
- Mãs não dói tanto assim.
- Não é você quem está sentindo isso. Posso desistir?
- Desistir?
- Sim, desistir. Para que as coisas deixem de doer.
- A gente não conhece o amanhã. A questão não é desistir ou não.
- Não sei agir assim. Já disse! Qual o mal de dizer sim ou não?
- ...
- Responde, porra. Sim ou não.
- A gente não conhece o amanhã.
- Estou pensando no hoje, no agora, nessa dor. A dor é presente. O passado cicatriza, o futuro não dói agora. Só o presente. Essa dor. Você não enxerga isso?
- Você não precisa disso.
- Nunca passei por isso.
- Você é bem melhor do que isso.
- Eu fui.
- Foi?
- Sim, agora sou isso. Acho que a coisa já cristalizou.
- Desandou.
- Não mude minhas palavras. Porra, você sempre muda minhas palavras.
- Schiiiiiiiii...
- Não estou berrando.
- Schiiiiiiiii...
- Caralho, você não entende nada. Dói demais. O que eu faço?
- Eu não posso ajudar. Você disse que queria trepar com meu amigo.
- Eu disse isso?
- Disse, naquele dia.
- É, naquele dia doeu.
- Não é hoje que dói?
- Começou naquele dia, com aquela cena. Doeu.
- Vamos entrar.
- Quero ir embora. Que ódio. Odeio você.
- Mentira.
- Odeio, sim. Odeio.
- Não seja louca, você é melhor do que isso.
- Vá tomar no seu cu.
- Tchau.
- Tchau. Beija minha mão?
- Beijo. A gente não conhece o amanhã.

Juliana não tem epidímio

De uma "sem noção" ao telefone

- Alôoou!
- Alô.
- Tuto pem?
- Tudo. Quem tá falando?
- Focê não reconheceu minha foooz?

(ninguém avisou a ela que ao telefone a voz da gente além de mudar, fica igual a de qualquer pessoa não é!?)

- Sou eeeu, a #&@%*.
- Fala #&@%*.
- Preeeto [como é que é? Eu? Preto!? Isso deve ser sarcasmo... Iso TEM que ser sarcasmo.], focê pote facer um fafor...

* * *
O resta da conversa não lhe interessa!
* * *

Muleres (os capixabas falam assim) se há duas coisas que vocês fazem e deixam nós homens putos da vida, essas coisas são:

1 - Não se identificar quando ligam, assumindo que conheceremos a voz;

2 - Falar com voz de criança portadora da Síndrome de Down.

Ah, e antes que este post acabe, preto é a-pu-ta-que-o-pa-riu!

telefonema do Tem, Mas Acabou

Eu odeio insetos.
Odeio. Odeio muito.
O único inseto com o qual eu já me dispus a ter um relacionamento amistoso foi a Josefa, e deu no que deu. Então a minha tolerância com esses seres asquerosos, cheios de linfa, antenados, com seis patas e cobertura quitinosa não é lá muito grande. De formigas a baratas, se cruzar o meu caminho, morre. Dentro da minha casa, claro. Não vejo motivos para matá-los fora daqui, a menos que sejam abelhas, marimbondos, vespas e picadores em geral.
Pois eu chego na minha sala e lá está um grilo enorme. Marrom. Feio. Seis patas. Cobertura quitinosa. Antenas. Na parede. Já falei que ele era feio? Já? Pois então. Lá estava ele, aquele artrópode monstruoso. Me lembrei imediatamente do Marco e de sua tentativa de diálogo com um bicho desses há algum tempo. Eu não sou tão tolerante.
– Eu odeio insetos.
– ...
– Eu vou até a cozinha preparar um copo de leite e um queijo quente.
– ...
– Se eu voltar e você ainda estiver na minha parede, vira estatística.
– ...
– Vou abrir o blindex totalmente. Com um salto, você alcança a liberdade. Aproveite que hoje estou generoso.
– ...
– Pergunte para suas amigas baratas o que acontece com elas quando invadem minha casa.
– ...
– Eu matei uma com as mãos, dia desses. Se eu matei um bicho nojento daqueles com a mão, imagina o que eu sou capaz de fazer com um inseto limpo e inofensivo como você.
– ...
– Eu assisti um episódio de No Limite, certa vez, em que os participantes comiam grilos fritos com farofa.
– ...
– Me senti tentado a provar, admito.
– ...
– E você está muito bem nutrido.
– ...
– Você tem 7 minutos e meio pra ir embora. Até mais.
Fui à cozinha. Quando voltei, o grilo ainda estava ali, na parede.
Foi esmagado com um murro.
Não, não o comi. Já estava satisfeito.

Utopia Dilucular

Viro o resto da cerveja quente no bico, tomo tudo. Solto um arroto e atiro a garrafa em direção ao cesto. Ela solta um gritinho agudo e se aninha junto às outras sete companheiras.

"Preciso parar de beber". Rio alto da minha própria afirmação. Venho me prometendo isso há ... bom, já perdi a conta, mas a forma esférica e inchada que minha barriga adotou pode atestar que já faz muito tempo.

Paro por um instante e observo as marcas de gordura e sujeira no teto. Estou pensando seriamente em contratar uma faxineira. Sempre achei que cuidar de uma casa seria baba perto do que eu já fiz. Acho que estava enganado.

Às vezes eu simplesmente saio do ar. Como agora. Tenho a impressão de que fiquei apenas um minuto ou dois observando o teto, mas afinal percebo que a manhã já passou e o fim da tarde se aproxima, e só agora me dei conta de que estou aqui parado.

Arrasto minha bunda até a beira da poltrona velha de couro. Me apoio em seus braços e com um gemido me levanto. Puta que pariu! Como minhas costas doem.

Calço minhas pantufas e caminho trôpego até a cozinha. Uma porrada de panelas se acumulam sobre a pia. O cheiro de comida azeda me causa enjôos mas não tanto quanto a idéia de limpar aquilo tudo. Resolvo deixar como está. Vou até a geladeira velha com a pintura azul celeste descascada e abro com cuidado. Essa porcaria anda dando choques. Pego mais uma cerveja, e com um gole destruo mais uma promessa.

Vou andando até o terreiro com a garrafa na mão. Uma velha figueira toma conta da maior parte do diminuto quintal. Vários vasos de bonsai e uma espreguiçadeira velha tratam de ocupar o resto do espaço.

Pego um vaso de cor preta e me sento . Coloco-o num caixote de laranja improvisado como mesa à minha frente. Trata-se de uma Jaboticabeira. Um belo exemplar. Eu a podo cuidadosamente com um alicate apropriado para o corte. Ele possui o fio mais agudo e afiado, evitando que os galhos sejam amassados no ato da poda. Dou um trato nela por umas 2 horas até que consigo o resultado esperado. Recoloco-a em seu lugar e busco mais uma cerveja na geladeira.

Ligo a TV e me jogo na poltrona fazendo-a estalar. Pego o velho controle remoto no formato e tamanho de um tijolo e começo a procurar algo decente pra se ver.

TIC!

Um casal de jovens choram abraçados um ao outro com um papel na mão. Ele parece tentar persuadi-la a fazer algo. Ela parece relutante mas é clara sua fraqueza. Ela logo vai ceder. Depois de mais 5 minutos de choro e promessas do rapaz ela finalmente concorda. Agora eu percebo, eles estão numa clinica. Ela entra numa sala de onde, 10 minutos depois, sai vestida com um avental azul, carregada numa cadeira de rodas.

Esse casal tirou o primeiro filho que foram capazes de gerar juntos.

TIC!

Um garoto segura uma mulher ao menos 20 anos mais velha que ele pelos cabelos e a puxa em direção à cama. Ela resiste mas parece gostar. Ele a atira com força e a esbofeteia no rosto quando tenta se levantar. Ela chora e ele levanta sua saia com força. Rasga sua camisa e puxa seu sutiã. Seus seios são firmes e ele os chupa com voracidade. Ela segura sua cabeça e a força ainda mais contra eles. Ele abre suas pernas, puxa sua calcinha para o lado e a penetra com força. Ela solta um grito. Ele fode com força fazendo gritar cada vez mais alto.

A porta se abre. Um homem entra armado. Dá um tiro no garoto que cai morto encima dela. Ela fica atônita por alguns segundos. Olha pro marido com a arma na mão e pro filho morto, com o pau dentro dela.

Ele atira de novo. E de novo. Ela para de gritar.

Mais uma vez.
Ele cai.

TIC!

Dou um belo gole na cerveja enquanto assisto um jovem trancado em seu quarto. Ele acende uma vela e tira do bolso uma pedra branca, semelhante a um sabão esfarelando. De baixo da cama ele puxa uma caixa de sapatos e de dentro dela retira uma seringa, uma colher e uma borracha. Coloca um pedaço da pedra na colher e a põe sobre o fogo da vela. Espera pacientemente até que derreta. Suas mãos tremem. Ele obviamente está sob efeito de álcool ou outras drogas, ou ambos.

Depois de derretido ele despeja todo o conteúdo dentro a seringa. Amarra a borracha no braço e sem procurar muito se pica. Cai instantaneamente para trás, batendo com a cabeça no chão e entrando em convulsão. Como se fosse ensaiado, alguém começa a bater freneticamente na porta. Ele baba. As batidas aumentam de força. Seus olhos viram, ele treme muito. Começam a chamar por ele. Sai sangue de sua boca.

Arrombam a porta e entram. É seu pai e sua mãe. Eles o encontram morto.

"Meu Deus!!!! Meu Deus!!!! " eles gritam.

TIC!

Não me perdôo por ter sido tão ingênuo e tão estúpido em tentar criar a perfeição. Me angustia ver minha própria criação se destruir e não poder fazer nada. Me sinto de mãos atadas. Minha tesoura não serve para podar seus galhos. Não posso lhes ajudar a tomar a forma correta.

Só me resta assistir.

Me levanto, pego mais uma cerveja e volto aos meus bonsais.

Cacofonia zapeante

Sabia que seria assim. Sabia q aquele olhar desconfiado, amedrontado e curioso logo daria lugar a um olhar sem barreiras e disposto a ultrapassar qualquer fronteira. Sabia q seria exatamente assim. E tratou de fazer sua parte. Tratou de desarmar aquela desconfiança toda. Estendeu os braços, chamou com as mãos e numa voz suave e meiga disse: "vem comigo, vem... deixa eu te mostrar..." O olhar sucumbiu. Perdeu a desconfiança e o medo e se lançou àquelas mãos. Mal sabia q seria levado ao quarto gelado e escuro. Ainda hj não achou a saída. E qdo cansa da busca, sentindo frio e medo, se perde em meio a lágrimas e perguntas.

medos em Devaneios Insones

23.4.03

O Copy&Paste ganhou um presente super-simpático:



Obrigado ao pessoal do Triglicerídeos Prozaicos.

Beijos do Pessoal do Copy& Paste pra vocês.

Ratapulgo, Ticcia e Anita (não necessariamente nessa ordem).

(...)

Parou numa funerária, para pedir informações. Lá disseram quanto custava um caixão. O atendente tinha uma voz grave demais para uma ocasião simplória. Enquanto ele via os diversos tipos de esquife, achou por bem avisar ao atendente que ninguém havia morrido, não senhor. Ele estava fazendo uma pesquisa, porque queria tratar da morte ainda vivo. O atendente lhe sorriu e o convidou a se sentar no pequeno escritório cheirando a lírio. Disse com um sorriso que tinham planos especiais para as pessoas que, como ele, eram precavidas o suficiente para tratar da morte enquanto vivas. Sentado, durante uma meia hora ele leu panfletos e mais panfletos, como se escolhesse uma viagem ao Caribe mas estivesse em dúvida quanto a que ilhas visitar. Indeciso ele jamais fora. Por isso saiu da agência funerária com a certeza de ter encomendado uma boa morte.

(...)

fragmento de "O protagonista não morre" em O Polzonoff

É só olhar para baixo, à esquerda, e ali está a Rua dos Pinheiros. Dá para ver a quadra toda, a partir da esquina com Pedroso. O Oregon não dá para ver, porque fica coberto por uma construção. Mas dá para ver a Projeto 4, onde a gente comprou o Palio. Mas isto não é nada. É só olhar um pouquinho mais para o lado e ali está a Rebouças. Entre as construções é possível ver alguns trechos da avenida, com os carros passando incessantemente. E logo atrás começa uma grande área verde, quase sem prédios, pois é, ali são os Jardins. Agora dá uma conferida aqui. Olhando para baixo está a Antônio Bicudo. Dá para ver a fachada do cartório de registro civil e a placa do cartório de notas. E também a fachada do Nello´s. Agora podemos saber quando o Nello´s está lotado e quando está vazio, só olhando pela janela. Logo ali a direita está a Artur e seguindo com os olhos estão aqueles predinhos charmosos que comentei. Quinta, no dia da feira, deve ser legal ficar olhando o movimento. E dá até para ver a esquina da Bicudo com a Teodoro Sampaio. E erguendo os olhos vemos toda uma série de construções. À direita ao fundo é fácil de reconhecer o prédio da Editora Abril, com a antena e parte do luminioso visível. Mais fácil de identificar são os prédios da Faria Lima. Lá está o prédio da Telefônica e os dois blocos de prédios da Brasil Invest, onde tinha uma agência do Meridional, e tem dois prédios marrons ao lado, um deles é o da Caixa Econômica Federal, mas ainda não sei precisar qual. Seguindo a linha dos olhos pela Faria Lima e lá está o San Paolo. É um dos prédios mais bonitos de São Paulo. Uma vez eu disse pro Marco Ribeiro que aquele prédio era Art Deco e ele ficou rindo de mim, achando que eu estava tirando uma com a cara dele. Para mim é Art Deco, mas não sei nada de arquitetura mesmo, devo estar errado. E olha ali, atrás do San Paolo, é o arco do Shopping Iguatemi. E lá no fundo tem aquela obra polêmica da Marginal Pinheiros. Era para ser um prédio duplex de alto luxo, mas se descobriu que construiram vários metros acima do permitido. A obra foi embargada e está há cerca de três anos parada. E olha ali outra coisa curiosa. Aquela placa do BCN gigante, que desconfio que esteja na esquina da Rebouças com a Eusébio. Ela dá as horas e a temperatura a noite toda. E olha o avião passando. Eu até contei. Passa um a cada 8 minutos. Eles parecem andar paralelo à Faria Lima, descendo, em direção a Congonhas. E passam helicópteros também.
E esta é só a vista da sala, a da área de serviço é ainda mais legal.

Passamos semanas olhando apartamentos e se queixando dos armários, do carpete, do banheiro, da garagem.
E tudo o que precisávamos era uma janela com uma vista como esta.
O sentido de São Paulo é a visão.

Desgarrado

Prova de amor

- Você me ama?
- Claro que amo. Mas por que a pergunta?
- Porque eu quero uma prova de amor.
- Prova de amor? A essa hora da noite?
- É. Eu quero, eu quero, eu quero.
- Hmmm... você quer que eu te traga a lua?
- Não, eu não quero a lua.
- Deixe-me ver... já sei! Você quer que eu colha a orquídea mais rara da Amazônia prá você?
- Não, Môr. Você sabe que eu sou alérgica a flores. Eu não quero orquídea nenhuma.
- Então você quer que eu escreva o seu nome no céu com um monomotor?
- Claro que não, seu tonto? Prá todo mundo ver e ficar me apontando na rua? Não quero.
- Então o que você quer, minha linda?
- Enche o tanque do meu carro prá eu ir à praia, amanhã?
- Do jeito que a gasolina anda cara? Nem pensar! Vá de ônibus, oras.

Alea Jacta Est

Ateísmo

Minha principal objeção ao ateísmo é que ele é feio. Ele é feio... É como decorar mal a sua própria mente. Substitui os vitrais de Chartres por um quadro de mendigos comendo laranjas em Lambeth. É o bicheiro, o rapper, o documentarista checo das visões de mundo. O Paulo César Pereio da mente humana. Sim, insisto: o ateu tira Deus da sua sala mental (não suficientemente real, cru, entende?) e manda entrar o Paulo César Pereio pelado bebendo uísque. Com maior ou menor sofisticação, cada vez que um ateu fala, é o Paulo César Pereio que fala pela boca dele.

Alexandre Soares Silva

Não sei se por uma feliz conjunção astral ou porque deus ficou com peninha mesmo da minha secura, o fato é que há uma semana tenho tido um affair levinho com um garoto (não, não há nenhuma meiguice aqui, o rapaz tem 19 aninhos).
E como todo garoto que se preze, o indivíduo tem surtos de maturidade, bom-senso, etc., mas na maioria das vezes é um menino. No sentido irritante da coisa.
(Pulamordedeus, há "meninos" e meninos de 19 anos. Unanimidades e generalizações são burras, compreendam por favor, deixem eu contar minha história direito).

Como todo mundo já sabe - ou suspeita - eu sou baixinha (1,er... 58m - tá, não vou mentir). O cara consegue ser menor que eu.
Não, ele não é anão. Tá mais pr'aqueles homens-guabiru, sabe? Pratica esportes, tem um corpo perfeito, mas tudo em miniatura.

Onde eu estava mesmo? Sim, pois a imaturidade do rapaz associada ao consumo imoderado de álcool fez com que esse relacionamento futuroso, pioneiro, desafiante socialmente subisse no telhado.
E ainda sonhei com ele essa noite: o rapaz, bêbado, invadia uma loja de móveis e queria porque queria compra um berço à guisa de cama. Deitava nela pra mostrar como era perfeita, se enrolava em posição fetal e chupava o polegar.

O que isso quer dizer, Bial? Adryanaaaaaaaaa, socorre sua amiga, sua tratante. Tô muito mal?

pedofila braba do Arroz-de-leite

22.4.03

Há uma certa doçura quando apontas o ridículo que foi a minha vida, há uma certa doçura e cerveja. Mão sem cigarro, poderia ter batido na mesa: assim não, como quem impõe distância, mas já era. Dedo em riste seria o espelho que me faltava. Não houve. Enquanto escolhias uma música no jukebox e eu já meio bêbada via os faróis dos carros na Consolação, trilha de vermelho se indo, nem quis me procurar no meio dos escombros, como faria quando eu era ridícula. Lúdica e ludicrous. Total incompreendida. Meu nó na garganta só se desfez na esquina da Augusta, mas aí eu já nem estava para os faróis dos carros. Eu te adoro e vê: nada nesta mão, nada na outra. E o meu beijo nem tem gosto de lágrima.

Depois disso, Tome uma Xícara de Chá

Em Qualquer Lugar

Você dança com seu vestido florido, de tornozelos brancos emoldurados em sandália baixa, fazendo o barulho de chuva assim que espalha pequenas quantidades de cascalho pela grama. Carrega em sua expressão uma leveza concentrada , um cerimonial para solstícios de verão.

Entende que quando a vejo, não vejo mais ninguém. Que os sons de seus movimentos são amplificados em meus ouvidos, a tal ponto que só escuto o farfalhar de seu vestido contra o vento. Pisca os olhos de maneira mais intensa que o normal, como se houvesse algo nesse ar para se ver além de luz, esperança e paisagens.

Existe uma estrada além dessas cercas, preguiçosamente se estendendo através do portão. Chama a noite com seu calor, perde os contornos depois daquele morro, dando a entender que existe muito mais além. Pisca um olho para você, e percebo que está apaixonada pelo que o destino pode te dar.

Você caminha entre as flores dos canteiros, que se misturam às flores de seu vestido, em nuances, pinceladas de primavera em pleno entardecer. Encara todo caminho como algum lugar onde você não consegue se perder. Todos os amores perdidos não são achados, e não te perseguem enquanto acelera para algum lugar.

Os seus namorados, os seus erros, seus acertos não te perseguem nesse entardecer.

Você não olha para mim, e não sei porque isso não me assusta. Se encantado ou enfeitiçado, eu não posso perceber. Só entendo que você é livre, meu carro me chama com um brilho de sol no vidro no canto de meus olhos, e eu não posso esperar. A cidade se esconde em algum lugar querendo me acolher, me mostrar suas ruas antigas que sobem e descem sem me pertencer, mas me emprestando entre suas grandes casas um lugar para viver.

Você se senta ao meu lado, e sabe que é hora de partir. Joga suas pernas sobre as minhas, a pele florida a me aquecer. Me diz que a estrada continua, e que não adianta mais fugir. Se o passado nos assombra, se nossa pele se abrir, sempre haverá sangue nesse mundo pra correr.

Em minhas veias. Em suas têmporas.

Você me beija por um instante, e é hora de partir.

roads do Cardiotopia

As maravilhosas compras

Sábado fiz as compras de Páscoa. Fui colocar remela nos olhos, como diz minha mãe, já que todo ano me prometo um ovo bem grande de presente (já que ninguém me dá nada mesmo) e nunca cumpro. Depois de salivar diante do ovo de trufa da Nestlé, lembrei do preceito do VP “um minuto da boca, o resto da vida no quadril” e afastei de mim aquele cálice, Pai.

Comprei uma colomba para os meus padrinhos, um ovo para minha afilhada e um coelho para minha sobrinha. Yara tinha pedido para eu comprar os chocolates para ela dar aos filhos (eu, inclusive) e netos. Resolvi que não ia comprar nada para mim porque sei que estou gorda e assim o fiz. Uma caixa de bombom para minha irmã, uma para meu irmão, um ovo para cada uma das netas e bombons para o neto. Como o viadinho só come Serenata de Amor e nas Lojas Americanas estava em promoção “3 por R$1,00”, comprei nove para ele.

Em casa, pensei:

– Pô, mas nove é um número ímpar... Não pega bem dar nove bombons...

E comi um.

– Ah, quem dá oito, dá seis..

E comi mais dois.

O final de semana passou e eu comi os nove bombons.

3x4 Colorido

AUTOBIOGRAFIA

Mesmo sob a geléia sonora que sufoca meus pensamentos aqui nesta boate vermelha, posso ouvir os gemidos do casal, deitado sob a cama redonda do motel barato. O ranger da porta, abafado pela canção que o rádio, 50 centavos por hora, tocava. Penso num tapete, daqueles que auxiliam aos iniciantes na arte da dança, os pés e setas desenhados didaticamente num padrão conhecido. Nesse tapete eu poderia definir meus próprios passos adentrando aquele quarto úmido, com o casal copulando sobre os lençóis surrados de porra e joelhos. Por um tempo incomensurável pus-me estático espectador do casal-máquina. Via o vapor, as engrenagens, o ritmo industrial da humanidade...
Não, moça, espere um pouco que minha memória está funcionando depois de muito tempo estancada num ponto só. Da última vez, pude apenas recordar até o som do rádio. Que música tocava? Não sei porque não ouço músicas. Românticas, amargas, não sei diferenciar. Posso sentir o ritmo, e sei que o casal fodia com base nele. Veja, moça, a questão não é porque eu estava lá, parado, observando o casal, mas sim porque não tenho o direito de recordar do sentimento que tive naqueles momentos todos que agora formam um álbum em minha mente e que parasitam minha consciência. Por dois anos, aproximadamente, vaguei de quarto em quarto de zonas e motéis baratos à procura daquele cenário. Mais de uma vez encontrei rádios idênticos, ou camas idênticas, ou paredes, contrapisos, lâmpadas, abajures, cortinas... Quantos sósias terá você neste mundo? Pense num número. Diga. Certo. Tenho três, conheço todos eles. Vê comigo o casal, na cama? O homem ali parece-se comigo. A mulher parece-se com você. Não sei se você é inteligente, preciso pronunciar porquês? Obrigado. A partir daqui, alcanço somente uma recordação: a sensação de um gelo metálico em minhas mãos. Talvez você possa me ajudar com isso. Tome essa arma e veja se é gelada o suficiente.

genérico incolor

Escolhendo nossos irmãos

Não sei bem porque quis falar disso. Na verdade, sei, foi por causa de uma prima. Fui para a festa de oitenta anos de uma tia, neste feriado, em Goiânia (aquela sucursal do inferno...). Apesar de eu, via de regra, gostar de festinhas de família, esta foi especialmente chata. Muitos parentes desconhecidos (minha família é absurdamente grande). Um restaurante horrível. Milhares de pernilongos me comendo pelos tornozelos. Um calor miserável. Uma umidade tal que é uma afronta a qualquer cidadão brasiliense que realmente goste da secura habitual de Brasília (como eu). Este era o quadro. E eu lá. Enfim...

Dos poucos parentes que eu conhecia, a imensa maioria era de Brasília. Pessoas que, apesar de serem alvo da minha estima, só vejo em ocasiões sociais, tais como aniversário ou Natal. Dentre estes, tem uma prima, a Ju, que só vejo raríssimas vezes. Sempre que eu estou numa festa, ela não está. Ou vice-versa. Nesta, coincidiu de estarmos as duas.

Como a gente nunca se vê, fiz a tradicional pergunta "e você? como está? conte-me sua vida..."
E ela contou. Por horas. E contou detalhes que eu só contaria para minha melhor amiga. E eu, claro, dei conselhos. Acabou que ela quer que eu conheça o novo namorado para ver "o que eu acho dele".
Comentando, mais tarde, sobre essa conversa com a madrinha dela (claro que não falando o QUE conversamos mas o QUANTO conversamos), ela disse que era bom que a gente conversasse, qua Ju era uma pessoa muito sozinha, muito sem amigos e que ela não tem com quem falar da dúvidas existenciais dela, essas coisas...

Bem, por que toda essa história? Pelo seguinte:
Fiquei pensando na Ju, depois disso. Ela é uma garota de 24 anos, linda (mesmo) e super agradável. 1000 vezes mais simpática que eu. Talvez um pouco mais tímida, mas só um pouco. E não tem amigos. Não tem amigos. Como assim "não tem amigos"?

Não consigo conceber uma pessoa sem amigos. Sempre tive amigos. Vários. Às dezenas. Alguns mais próximos, outros nem tanto. Dentre eles, sempre houve alguns que eram os melhores, tipo pau para toda obra. E, dentres estes, sempre houve o melhor ou a melhor. Aquele que era uma parte de mim. Aquele que, mesmo tendo saído da minha vida, eu sempre vou amar.

Amigos, para mim, são irmãos. Costumo dizer que, se meu namorado me traísse com a minha melhor amiga, eu seria capaz de perdoá-lo. Mas nunca seria capaz de perdoá-la. Minha melhor amiga é uma parte de mim. Me conhece. Em tudo. E sabe disso. É a pessoa em que mais confio e sabe disso. É uma das pessoas que eu mais amo e também sabe disso. Não pode me trair. Nunca. Ou não merece todo o meu amor e toda a minha confiança.
Já fui traída por amigos? Já. Por um melhor amigo? Já. O que aconteceu foi que me afastei definitivamente da pessoa em questão. Mas não perdi a confiança na Amizade. Arranjei novos amigos e confio neles como se nunca tivesse queimado minha mão. Em se tratando de amigos, o provérbio "gato escaldado tem medo de água fria" não funciona comigo. Este gato escaldado aqui continua se jogando na água, com prazer.
Não sei como seria minha vida sem meus amigos. Acho que não seria. Não conseguiria passar por ela sem alguém ao meu lado. A minha tia disse que a Ju se apaixona muito rápido. E é verdade porque ela está saindo com esse novo namorado há menos de uma semana e já está completamente apaixonada. Acho que isso se dá pelo fato de ela não ter amigos. Não tendo em quem se apoiar, ela deposita todas as expectativas em quem se aproxima, no caso, o namorado.

Vou ligar mais para ela. Para conversar, para saírmos juntas, sei lá. Para ela desabafar. Para ela ter uma amiga.

C'est la vie ...

Roleta Russa

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr – CLICK

– Alguém precisa morrer, Ivan.

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr – CLICK

- Alguém sempre precisa morrer, Bóris.

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr – CLICK

– Sempre. Desejos antagônicos só devem ser resolvidos pela anulação total do outro, Ivan.

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr – CLICK

- Ou a anulação de si mesmo, Bóris.

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr – CLICK

- Na esperança que a não-existência traga o não-desejo, Ivan.

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr – CLICK

- Ou que a aleatoriedade do gesto de puxar o gatilho seja o modo definitivo de saciar todos os desejos. Como em uma novela em que o autor perdeu o rumo da trama: Alguém precisa morrer. Alguém sempre precisa morrer, Bóris.

Rrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrrr – CLICK

– Mas tem certeza que você colocou uma bala neste tambor, Ivan?

– Você está louco, Bóris? Alguém poderia acabar se machucando!

Na manhã seguinte o corpo de Ivan foi encontrado ao lado da arma. Morto a coronhadas.

Ora Bolas

Era uma época difícil, eu trabalhava como DJ num quiosque da baixada santista das seis ao meio-dia. O pior emprego que eu já tive. Tinha que trabalhar vestido de caiçara, era o uniforme do local pra enganar os turistas que vinham buscando um ambiente semelhante ao da novela Tropicaliente. Um chapéu de palha, um filé de merluza no bolso da camisa e a barra da calça molhada de mar. Um dia eu levei um amigo chamado Misto Eleazar comigo. O Misto era o tipo de cara que ia jantar na casa da namorada e fazia analogia entre o espaguete e as minhocas do quintal dele.

— Vivi, toca aquela agora.
— Depois, Misto, depois.
— Toca agora.
— Qual?
— Aquela.
— Depois.
— Tá!

Ele tinha comprado um chapéu cata-ovo e inventado uma cantada baseada nele. Ele queria que a cantada congruísse um elogio à donzela a um elogio ao chapéu, que deveria ser notado e elogiado também pela donzela.

— Esse chapéu tem classe, mas a sua bunda tem muito mais classe.

Pelos meus cálculos, até as onze ele tinha tomado uns trezentos e setenta tapas. Ele veio me pedir a primeira dica do dia sobre as mulheres.

— Vivi, eu quero entender o mecanismo, sabe? A 'engrenagem'. Eu quero saber como 'funciona' a coisa. O que faz o mundo girar? Tantos picolés nesse quiosque, um só é premiado. Quem ganha merece? Esse é o grande enigma: o vestibular da vida. O universo feminino?

Eu limpei a testa com o filé, disse pra ele tentar reproduzir a cantada em inglês. Ele seguiu em frente e tomou outro tapa.

— This hat is classy, but your asshole is even classier.

Quebrei uma cadeira de isopor na cabeça dele. Quase desacordado, tudo o que ele falava era "paz, amor e fritura", freneticamente.

Um agrokid metido a caubói entrou, se deparou com o pobre Misto se debatendo no chão, tomou um bom gole de óleo de soja e completou uma frase inteira enquanto arrotava:

— Se eu somar todos os dentes dessa espelunca não dá os trinta e dois da minha boca.

Num ato de solidariedade, os caiçaras levantaram, colocaram todos a mão no peito e entoaram em coro o hino do Payssandú.

Clube da Comédia

21.4.03

Madrugada abafada em qualquer bairro brasileiro. Uma luz acesa no topo de um edifício. Um casal discutia:
- Então é assim? - questionava a mulher com cara de choro.
- Aham. - respondeu o homem, tirando suas roupas do armário.
- Vinte anos de casado no lixo?
- Aham.
- Você vai realmente me trocar por aquela piranhazinha?
- Aham.
- Só porque ela é vinte e cinco anos mais nova do que eu?
- Aham. - O homem colocava suas roupas na mala.
- Isso é injusto!
- Aham. - Continuava arrumando.
- Mas o que eu fiz? Eu nunca fiz nada contra você, nunca lhe faltei com a verdade!
- Aham... - respondeu ironicamente.
- Você sabe que aquilo que eu tive com o Hernani não significou nada!
- Aham... - ainda irônico.
- Meu amor, eu te amo!! - e abraçou o esposo.
- Aham - respondeu, como quem não acredita, e empurrou-a no sofá. Fechou a mala, dirigiu-se à porta.
- Eu não vou deixar você partir! Você só sai daqui sobre o meu cadáver!
- Aham.
O homem sacou um revólver da cintura e acertou a esposa bem no centro da testa. Olhou seu corpo estatelado sobre o carpete, trancou a porta e desceu pelo elevador.
Na garagem, rumou a um Voyage prata, onde uma jovem ouvia música. Abriu a porta:
- Vamos para casa amor? - perguntou a ninfeta mascando chiclete.
- Aham.
Ligou o carro e partiu.

KSW 5.0 | Não se anime, a gerência é a mesma...

Pra mim, abrir geladeiras alheias sempre foi um sinal de intimidade. Não só comigo, mas com a minha família, minha casa. Fico estressada só de imaginar uma pessoa qualquer entrar na minha casa, abrir a geladeira e ficar parada diante dela. Porque todo mundo faz isso: fica horas, parado e olhando, decidindo o que vai tirar ou colocar.
Tinha um namorado que ficava curioso pra saber o que tinha na daqui de casa, que eu nunca deixava ele abrir. Eu tinha intimidade com ele, sim, mas, ao mesmo tempo, não queria que ele a tivesse com a minha casa. Acho que no fundo são ciúmes do meu espaço, mania de canceriano. O fato é que hoje eu percebi que tenho uma certa intimidade com a casa desse mesmo ex-namorado.
Engraçado foi me dar conta disso. Chegamos com chandelle e eu coloquei na geladeira, assim, como se estivesse na minha casa! Acho que, se ele fizesse na minha, eu enfartava!!! No namoro a gente sempre se entrega mais num aspecto ou outro. Eu era apaixonada por ele, mas não deixei ele me conhecer totalmente! E ele talvez não fosse totalmente apaixonado por mim, mas me deixou abrir a sua geladeira!

Palavras achadas por uma Garota Perdida

2 horas de papo, entre mensagens e ligação de celular.
2 horas a menos de sono.
Ela dizendo que você é engraçado e a faz rir.
Você dizendo que ela é linda.
Ela dizendo que não quer que você mande mais mensagens nem ligue, pois precisa ficar longe de você, ao menos por enquanto.
Você dizendo que tudo bem. Mas "devemos temer o que pedimos, pois podemos acabar conseguindo".

Cerveja Blog

Noite passada (ou foi na anterior? Não me lembro, e não faz diferença) eu sonhei que tinha comido a Savannah. Sabe a Savannah, aquela conhecidíssima atriz pornô que era realmente a mais gostosa de todas, e que [reza a lenda] sofreu um acidente e ficou desfigurada, por isso se matou?

Poizé, a Savannah. Sonhei que eu sonhei que tinha feito a maior festa com o brioco dela, e quando acordei do sonho no sonho contei sonhando pra Excelentíssima o que eu tinha sonhado, ela ficou braba comigo. Braba não, ficou possessa e quis acabar comigo. Só porque eu não tinha sonhado com camisinha.

Se no sonho já deu isso, será que vale contar pra Excelentíssima que eu sonhei que sonhei que tinha comido uma puta morta?

SÓ MATANDO ponto com ponto bê érre

20.4.03

sal
acordei com vontade de mergulhar no mar gelado, bem cedo, quando ainda não tem ninguém na praia, a maré baixou e a areia está virgem de pegadas. ouso sonhar que estou nua, minha pele quente do sol da manhã. meus pés na areia fria esperariam a próxima onda, que viria bem de leve e gelaria meus pés. o resto do corpo arrepiaria de frio e eu ficaria de olhos fechados alguns instantes, entre ir e não ir, entre acabar logo com a tortura ou desistir. entraria pouco a pouco, como sempre faço, sentindo parte do corpo seca e quente do sol e outra parte fria da água salgada. meu corpo se arrepiaria todo e a cada onda que viesse e molhasse um pedacinho não planejado eu daria um grito abafado. chegando ao ponto de mais frio que calor, eu esperaria a próxima onda e mergulharia de olhos fechados, e aí não faria mais sentido gritar, sendo abraçada pela água fria, de volta ao meu elemento. eu emergiria outra: molhada e gelada, respiração alterada pelo frio, os olhos molhados de sal, meu corpo todo tenso de frio, cheio de gotinhas escorrendo. eu seria a primeira mulher, saindo da espuma do mar, respirando o ar da primeira manhã do mundo.

***

machos

não sei o que me dá, mas não posso ver homens trabalhando com serviços pesados. quando vejo homens com picaretas e pás, levantando pesos e suando, algo desperta dentro de mim. sinto frio e calor, não consigo despregar os olhos dos músculos em movimento, da roupa suja, da concentração que impede que eles percebam uma fêmea ali do lado paralisada, ofegante. hoje vi um rapaz de 20 e poucos anos quebrando uma calçada, com uma britadeira. uma mistura de brincadeira de menino com o vigor de homem, ele ria das pequenas pedras deslizando, os outros passando e rindo com ele, uma comunidade de meninos-homens desafiando a natureza. destruir e construir, sem deixar pedra sobre pedra. quase chego mais perto para sentir o cheiro do homem ali concentrado na tarefa das pedras, os braços fortes em movimento sem me ver. meus olhos fixos em cada parte dele, nem sei se alguém percebeu minha fascinação. vários homens juntos construindo mundos, indiferentes aos caprichos da natureza, indiferentes aos desejos (nem tão) secretos de uma mulher parada na rua, esperando um ônibus na calçada, observando com olhos brilhantes.
o ônibus chega e eu fico olhando ainda muito tempo a obra e aqueles homens que aprendemos desde meninas a desprezar. quando menina eu os via como as lesmas do quintal: com repulsa e prazer maldisfarçado. pois hoje, eu fêmea desprezo toda a assepsia e civilidade, sonho sonhos de violência e sexo, cheios de suor e saliva, com homens cheirando a terra.

*> OuTrAs PaLaVrAs *<

Dúvidas do fundamentalista

A Dra. Laura Schlessinger é uma radialista norte-americana de extrema-direita. Apesar de ser judia, ela é adorada pelos fundamentalistas evangélicos, uma vez que defendem rigorosamente os mesmos princípios. Seu discurso é tão virulento que o programa que apresenta nos EUA foi proibido no Canadá, onde a lei proíbe a pregação de ódio contra minorias. Há cerca de três anos, ela causou furor ao condenar o homossexualismo com base nas Escrituras, uma vez que em Levítico 18:22 tal prática é considerada uma abominação. E emendou: “A Palavra de Deus é eterna e imutável”. A afirmação fez com que um anônimo internauta escrevesse a pérola abaixo:

Querida Dra. Laura
Obrigado por fazer tanto para educar as pessoas a respeito das Leis de Deus. Aprendi muito com seu programa e tento compartilhar esse conhecimento com o maior número possível de pessoas. Quando alguém tenta defender o estilo de vida homossexual, por exemplo, eu simplesmente lembro-lhe que Levítico 18:22 claramente classifica isso como abominação. Fim da argumentação.

Entretanto, eu preciso de conselho seu a respeito de outras leis bíblicas e como segui-las da melhor maneira. Em especial:

* Quando eu queimo um touro no altar como sacrifício, sei que isso cria um odor suave ao Senhor (Levítico 1:9). O problema é com meus vizinhos. Eles dizem que o odor não lhes é agradável. Devo castigá-los?
* Eu gostaria de vender minha filha como escrava, conforme autorizado em Êxodo 21:7. Na sua opinião, qual seria o preço justo que eu deveria pedir por ela hoje em dia?
* Eu sei que não posso ter contato com uma mulher quando ela está no seu período de impureza menstrual (Levítico 15:19-24). O problema é como saber. Eu tentei perguntar, mas a maioria das mulheres se ofende.
* Levítico 25:44 sustenta que eu posso ter escravos, homens e mulheres, desde que comprados de nações vizinhas. Um amigo meu afirma que isso se aplica aos mexicanos, mas não aos canadenses. Pode esclarecer? Por que não posso ter escravos canadenses?
* Tenho vizinhos que insistem em trabalhar no dia sagrado (sábado para os judeus, domingo para os cristão). Êxodo 35:2 sustenta claramente que eles devem ser mortos. Estou moralmente obrigado a matá-los eu mesmo?
* Um amigo meu acha que, embora comer crustáceos seja uma abominação (Levítico 11:10-11), é uma abominação menor que o homossexualismo. Eu discordo. Qual de nós está certo?
* Levítico 21:20 afirma que não devo me aproximar do altar de Deus se tiver um defeito em minha vista. Tenho que admitir que uso óculos de leitura. Minha visão precisa ser 20/20 ou há alguma flexibilidade aí?
* A maior parte dos meus amigos homens usa o cabelo aparado, incluindo o cabelo das têmporas, apesar disso ser expressamente proibido em Levítico 19:27. De que forma eles devem morrer?
* Eu sei, graças a Levítico 11:6-8, que tocar a pele de um porco morto faz de mim um impuro, mas posso continuar jogando futebol se usar luvas? (aquela bola oval de futebol americano era feita de couro de porco)
* Meu tio tem uma fazenda. Ele viola Levítico 19:19 plantando duas culturas diferentes no mesmo campo, assim como sua mulher ao usar roupas feitas de dois tecidos diferentes (algodão e poliéster). Ele também costuma praguejar e blasfemar. É realmente necessário ter o trabalho de reunir toda a população da cidade para apedrejá-los (Levítico 24:10-16)? Não podemos simplesmente queimá-los vivos numa cerimônia familiar reservada, como fazemos com aqueles que dormem com as sogras (Levítico 20:14)?
Sei que a senhora estudou a fundo esses assuntos, por isso estou certo de que pode me ajudar.

Obrigado por nos lembrar que as palavras de Deus são eternas e imutáveis.

Seu fã devoto

Só para lembrar que não apenas os judeus estão submetidos a essas leis, vale transcrever aqui um trecho do Evangelho segundo Mateus 5:17-19: “Não penseis que vim abolir a Lei ou os Profetas. Não vim abolir mas completar. E eu vos garanto: enquanto não passar o céu e a terra, não passará um i ou um pontinho da Lei, sem que tudo se cumpra. Quem, pois, violar um desses preceitos, por menor que seja, e ensinar aos outros o mesmo, será chamado o menor no reino dos céus; mas quem os praticar e ensinar, será chamado grande no reino dos céus.”

só poderia ser um Espírito de porco

19.4.03

Bruxas

Aqueles olhos. E aqueles lábios.
E como ela fodia bem.
Depois, quando tudo tivesse passado, você chegaria à conclusão de que foi justamente por aí que ela te enfeitiçou. Pela buceta.
Sejamos francos: você gostava de exibir aquela mulher. Gostava de se sentir amo e senhor de uma criatura bonita e sensual, que atraía o desejo dos homens e a inveja das mulheres. E ela era só sua.
E você era só dela.
No começo tudo bem, era o que você queria. Até começarem as crises de ciúmes.
Que eram apenas um pretexto. Porque tudo era motivo para briga.
Era uma relação sadomasoca, mais do que você gostaria de admitir. Porque não se restringia só à cama.
E acabou como sempre acaba esse tipo de relação. Na porrada. Você não se orgulha disso.
Até hoje, quando você saiu com os amigos que a conheceram, ocasionalmente algum deles faz a pergunta: por onde anda ela?
E a mesa faz um minuto de silêncio.
Você não tem a menor idéia de onde anda aquela mulher que te enfeitiçou.
Mas que ela existe, existe.

Pequeno Dicionário de Arquétipos de Massa

Por que você não me quer? O que há de tão desinteressante em mim para que você me esqueça? Por favor assinale as alternativas corretas abaixo e devolva-me. Porque eu babo, eu interpreto vírgulas, gosto de visitar o Talavera Bruce e fujo de feriadão na Região dos Lagos, me deixo embalar pelo marasmo, dou sugestão de epitáfios em chás de bebês, costumo medir o espaço entre o teto e o alto da minha cabeça, a minha capacidade de tolerar incertezas é maior do que a sua, os meus sinais de dependência são mais claros do que os seus, finjo que não te conheço no elevador, na melhor das hipóteses fico na dúvida, deixo resto no prato, sei reconhecer os benefícios da urinoterapia, papo hóstias, confundo hipertexto com subtexto, aprecio os versinhos de Ho Chi Minh e os haicais de Yoko Ono, não quero ver Carandiru hoje à noite nem amanhã nem depois, acho que segundo o índice Big Mac você ganha pouco, desconfio que a Miss Idaho Potato foi assassinada, coloco gelo na cerveja quente, acredito piamente que a Lua é uma cabeça que subiu aos céus, você não consegue se entrosar com meus amigos mirmecólogos, faço dietas para não parar de comer, sou canhota em público, sou hipocondríaca com a saúde dos outros, sou de estatura mediana, meio magra meio gorda, meio por dentro meio por fora, sou exatamente o que sou, não sou diferente de ninguém, sou diferente de todo mundo. Tecle Reply.

Prosa Caotica

Já viu seu pai chorando?

Hoje eu vi.

Foi foda. Comecei a chorar também.

Ele chorou me contando como recebeu a notícia do meu nascimento. Diz que foi uma das maiores emoções da vida dele. Saiu do hospital correndo em direção à praia, chorando, em busca de um orelhão prá ligar prá Brasília dando as boas novas. Foda, cara. Já tô chorando de novo só por lembrar. Não fazia idéia de que era tão importante assim prá ele. E ele não faz idéia do bem que me fez. Eu aqui, achando que tenho problemas, haha. "Você tá começando agora, gatinha, eu já passei por isso tudo e muito mais".

Meu pai, velho.

Chorando.

Inesquecível.

(Tinha deletado esse post por ter achado meio meloso demais, mas estou defecando e me locomovendo - o melhor dos eufemismos! - para o que possam vir a pensar.)

me Jane you Tarzan

Lua cheia

Será que você está como eu, janela aberta e olhos atentos à lua e a seu brilho rabeando no mar? Será que você também sorri sentindo o vento desarrumando seus cabelos, como eu, agora? E será que, se você está com os olhos na lua e o vento no rosto, você está pensando no que eu estou pensando?

Alea Jacta Est

Sonhos infantis

Como toda criança eu sonhava muito, tinha idéias mirabolantes do tipo, assar goiaba verde pra dar pros meus primos menores comer, ser um dia capturada por um ET gigante do formato de um chiclete Ploc de tutti-frutti, sair lambendo os blocos recém rebocados da construção da minha casa só para conseguir bastante minerais, comer as rosas do jardim da minha mãe pra ficar com hálito perfumado, entre outras coisas. Mas uma coisa que eu sempre escondia de todos era como eu imaginava que seria meu futuro.
Eu sempre discutia isso com a minha boneca Chapeuzinho Vermelho, passava horas dialogando com a minha filhinha sobre como seria nossas vidas depois que a mamãe (no caso eu) crescesse. Segundo meus cálculos, quando eu tivesse 10 anos de idade seria adulta o suficiente pra morar sozinha, eu já tinha planejado tudo, ia construir um cômodo com caixas de geladeiras do lado do ferro velho perto da minha casa, por que dessa maneira ficaria muito mais fácil de arrumar material pra construir, a caminha da minha filhinha seria feita de uma caixa de melissinha que eu tinha ganho no natal passado, a minha seria feita com a caixa do fogão da minha mãe, eu acho q ela não iria se importar.
Eu cataria papel na rua e venderia no ferro velho e compraria arroz e feijão a granel, cozinharia numa latinha de goiabada que eu acharia na rua. Pra minha filhinha eu compraria danoninho pra ela crescer forte e feliz. Eu teria também um tambor bem grande onde eu apararia a água da chuva pra tomar banho e lavar minhas roupas. No quintal, teria um enorme jardim com flores plantadas dentro de potinhos de margarina. E daí quando eu estivesse bem velha, com mais ou menos 22 anos eu me casaria com o balconista da padaria por que assim ele poderia levar leite e pão quentinho todos os dias pra nossa casa.
No final dessas conversas eu sempre chorava, por que eu achava que ia sentir muita saudade da minha família, mas que a vida era dura mesmo e eu tinha que enfrentar aquilo. Naquela época eu não sabia o que significava isso, só sabia que era o que minha mãe falava pra mim quando eu pedia um pônei de presente de aniversário.

Em caso de coma - Me coma!

O CÃO QUE FALAVA

Um ventríloquo achava-se em péssima situação financeira, mas, além de ser magnífico na profissão era ainda bastante esperto. Por isso, não se atrapalhou muito; saiu andando pela rua e catou o primeiro vira-lata que encontrou. Com o bicho debaixo do braço, caminhou até o boteco mais próximo, e, chamando o gerente de parte, disse-lhe:

- Olhe aqui. A única coisa que ainda tenho no mundo é este cachorro, que sabe falar. O senhor quer me dar duzentos reais por ele?

O gerente ficou logo na defensiva, desconfiado.

O ventríloquo começou a trabalhar. O cachorrinho deu um latido estridente e disse:

- Claro que eu sei falar! Vou aproveitar para reclamar que a comida neste boteco não presta. Já estive aqui uma vez!

O gerente coçou a cabeça espantadíssimo. O ventríloquo sorriu com ternura para o cão, e disse ao outro:

- O senhor vê, para mim é uma tristeza me separar dele, mas eu preciso muito desse dinheiro. O senhor está disposto a comprar o bichinho?

- Duzentos reais é muito. Eu dou cem.

Dizendo isso, enfiou a mão no bolso por trás do avental, e tirou o dinheiro.

O nosso amigo não estava em condições de regatear. Agarrou a nota, agradecendo comovido, e foi saindo. Mas quando já se aproximava da porta, o cachorro gritou:

- Então eu não valho mais de cem reais, hein? Pois só por isso eu agora nunca mais falo uma palavra!

E, ao que parece, cumpriu a promessa...

Padre Levedo

18.4.03

– Pedro, me dá uma ajuda?
– Claro. No quê?
– Ignorante. Com seis letras.
– Heim?
– Nas palavras cruzadas, pô. Ignorante, com seis letras.
– Pode ser néscio, beócio, obtuso ou bronco.
– Começa com b.
– Deixa eu ver.
– ...
– É beócio.
– Como você sabe?
– Porque o paraíso da bíblia é o Éden, e bronco não tem e.
– Ah. É verdade.
– ...
– Como é mesmo a palavra?
– Beócio.
– Como se escreve isso?
– Ai, meu ovo.
– Com s ou com c?
– Com c, néscio.

***

– Pedro...
– O que foi dessa vez?
– Me ajuda aqui.
– Escuta, quer que eu faça as palavras cruzadas pra você?
– Ah, deixa de sacanagem. Só mais essa vez.
– Fala.
– Auto-biografia famosa, com 9 letras.
– Eu me odeio, por Pedro Nunes.
– Bah. Babaca.
– ...
– Mas ia vender um bocado.
– Só pelo título.
– Você tem tino comercial.
– Obrigado. Mamãe diz a mesma coisa desde o dia em que troquei suas córneas no mercado negro por uma moto Honda, uma torradeira elétrica e um cão para cegos.
– Você vai citar meu nome no livro?
– Provavelmente.
– Quero 20% dos lucros pelo Best-Seller.
– Vou declarar que você não consegue fazer palavras cruzadas nível Moleza sem pedir ajuda.
– Então quero 40%.

a volta dos vivos-mortos em Utopia Dilucular

MEA CULPA

Queria pedir perdão à aranha maior que minha mão espalmada, mas não havia outra opção além de matá-la. Armadeiras são perigosas, e não podem ser removidas do recinto como aracnídeos mais pacíficos, tais quais as caranguejeiras.

Em épocas anteriores, vivíamos rodeados de aranhas furiosas, escorpiões e até mesmo cobras nesse condomínio. Com o desenvolvimento da zona semi-rural de Porto Alegre, esses encontros com os bichos selvagens diminuíram, mas vez que outra eles aparecem pra lembrar quem é que realmente manda nessa área.

De qualquer forma, eu tentei: encontrei essa safada semana passada, na PORTA da minha casa, chegando duma festa. Fui tolerante o suficiente e dei a volta, pulei o muro e deixei que ela tivesse tempo pra escolher outro lugar pra se instalar. Eis que hoje ela me aparece com as patas erguidas a um metro da minha cabeça, em posição de ataque.

um tapa na aranha do BIG MUFF

'sabe quanto tempo eu fiquei sem falar com ninguém?'
'não, nem imagino.'
'pois é, eu perdi as contas. a coisa mais impressionante quando tu tá sozinho é que o tempo é moldado de acordo com o teu desespero.'
'ah...'
'mas não é isso que eu queria dizer, eu nem sei mais o que eu queria dizer, é que eu fico assim sozinho, não falo com ninguém e finalmente tomo coragem um dia de te ligar e te dizer o quanto gosto de ti, o quanto sempre gostei, a importãncia que eu não te dei e tudo o mais, quantas vezes eu, na reclusão que busquei, fiquei ensaiando isso comigo mesmo, sempre respondendo mal, sempre me humilhando, eu não sei por quanto tempo, eu não sei mais falar com ninguém, acho.'
'...'
'então?'
'então o quê?'
'tu também gostou de mim como eu ainda gosto de ti?'
'não sei.'
'não sabe?'
'claro que não. a única coisa que sei agora é que tu ligou pro número errado. aqui é uma padaria, não a casa da shirlêi.'
'...'
'alô?'
'não, tá, eu devo ter ficado muito tempo recluso... é isso, ela se mudou daí faz tempo?'
'eu já disse que não sei da tal shirlêi. mas eu acho que a padaria tá aqui faz uns quatro anos... eu só trabalho aqui faz três mes, na telentrega..'
'quatro anos...'
'é.'
'tudo bem. faz o seguinte, então. me traz duzentos grama de presunto, duzentos de queijo, manteiga sem sal e uns cinco pão massinha.'
'qual o endereço?'

como assim dois uísque?

o sabor das coisas simples da vida

O feijão começa a chiar na panela de pressão. Aqui do escritório ouço o barulho do vegetal sendo transformado. Alimento. Sacia nossa fome de bicho, nos mantém vivos e saudáveis. O aroma começa a chegar aqui. Cheiro de comida feita em casa. A boca começa a salivar levemente. Sabor de infância. Sabor de vida simples, de preocupações tolas. De filosofia de cozinha.

Fiz uma auto-proposta ano passado de procurar cozinhar em casa. Há anos e anos moro sozinha. Nunca fui de cozinhar. Quando comecei procurava seguir receitas de livros por medo de me aventurar neste universo tão complexo que é o mundo dos alimentos. Cozinhar é arte, sim. Cozinha simples, arroz-com-feijão, é mais ainda.

Comer para mim sempre foi algo social. Quando me aventurava numa destas alegorias do machismo chamada fogão, era em momentos raros de presenças amigas em minha casa. Resolvi ser adepta da cozinha solitária para economizar e também para criar hábitos alimentares mais saudáveis.

Hoje não há muita opção. Também não tenho vontade de sair para almoçar fora. Não cozinho todos os dias: preguiça. Mas quando cozinho, me deleito com este universo de magia e simplicidade. E percebo: não tenho jeito mesmo. Sou metida à besta até pra fritar ovo!

[boop it]

Tédio

O tédio me incomoda. Desde criança fugia dele, brincando com papéis ou conversando com Edgar, bom companheiro das horas intermináveis de tédio. Na minha vida, o que caracteriza o tédio não é tão somente o ficar sem fazer nada, mas sim a sensação de que isso nunca vai acabar e que sua vida é uma história sem rumo, sem enredo, sem grandes viradas, com um final bem previsível. É uma coisa cíclica, que começa com a vontade de não fazer nada, a falta de estímulo propriamente dita, seguida do fato de não ter realmente nada pra se fazer e depois o sentimento de tristeza por ser tão pouco, tão limitado. Esse sentimento de deixa com vontade de não fazer nada! Esse é o meu tédio. Oi, bom te conhecer, mas não foi um prazer.

Palavras achadas por uma Garota Perdida

Estava treinando telepatia com a Marina hoje.

- Nós estamos em rede, eu e você. Imagina que o seu cérebro é um HD. Manda o arquivo para uma pasta compartilhada e eu vou tentar acessar, pelo Windows Explorer aqui da minha cabeça.

Aí a gente dá a mão e fica tentando adivinhar a palavra que a outra está pensando. Ela transmite e nada. Eu transmito pra ela e nada. É isso que dá usar o Windows como exemplo hahaahhaha.

Céu azul lindo demais na ilha de Rinos - parte II

17.4.03

O Mais Nobre Esporte

Politicamente incorreto é um esporte. Trata-se de contrariar politicamente corretos. Eis tudo. Não é uma filosofia, uma religião. Não diga ao sujeito que está tentando ser politicamente incorreto, ah, que bobagem, esqueça os politicamente corretos, não seja politicamente incorreto só pra chocar, pára com isso, cansei. É como dizer para um atirador olímpico atirar onde lhe der na veneta, chega disso de atirar em alvos, que artificial, que coisa.

E eu convido a todos, pratiquem, pratiquem. Nada melhor que causar um chilique em cinco blogueiros antes dos waffles matinais. De tarde você descobre cinco posts furiosos antivocê. Significa, cinco pontos.

Uma boa medida de falta de inteligência, ou QI negativo, é a capacidade de se irritar com idéias. Significa que nunca as ouviu. Significa que não leu muito, nem pensou muito, mas mandou muitas mensagens irritadas. Este sujeito defendendo isso-ou-aquilo! (significa que você nunca leu livros sobre isso-e-aquilo? Não sabia que há prós e contras?)

O politicamente correto é um movimento que surgiu não sei bem quando de pessoas que colocaram as cabeças em cima de um muro, como patos num stand de tiro, e disseram: “Por favor, choquem-nos”. Ser capaz de resistir a isso é sinal de falta de vitalidade, espírito esportivo, zest for life, essas coisas.

Ora, vamos. Experimenta.

Alexandre Soares Silva

Ensaio aberto para show de João Bosco.

- Bá bé bi pi bó dó... bá bé bibi... bá bá bu...
- Tá errado.
- Bé bidi bó. Hã? Como assim.
- Tá errado. Eu tenho todos os seus discos, além dos bootlegs. Na gravação dessa música, que você cantou pela última vez em 82, a letra não diz "bá bé bibi", e sim "bá bá bebé", como você pode conferir nesse pirata de 76 que eu trouxe pra tu autografar.

O segundo personagem, o fã de João Bosco, é fictício.

mau humor

Situação real, ontem à tarde.

Meu irmão adolescente de 17 anos chega em casa radiante porque comprou uma furadeira. Isso mesmo, uma furadeira. E não é qualquer uma, é uma furadeira verde! Entendem? Eu não entendo nada de furadeiras. Pra ele era uma *super aquisição*... pra mim, era uma furadeira verde.

Eu estava aqui no computador dele, postando o texto ali de baixo, quando ele entra no quarto:

- Olha o que eu comprei! Calma, não olha ainda! Deixa eu arrumar!

E arrumou, sei lá o quê, mas arrumou. Demorou, fez um puta suspense, eu já tava achando que ele tinha comprado alguma coisa pra mim... que nada.

- Pronto, pode olhar!

E eu viro pra trás e lá está ele, com uma furadeira na mão. Acho que a preparação toda era tirar da caixa e fazer uma pose daquelas de caixa de furadeira (eu não sei se isso existe, mas imaginem). Olho pra ele com desdém:

- Hhmmm... é uma furadeira.

- (sorriso de uma orelha à outra) Acabei de comprar : )

- (sem nenhuma intenção de me passar por animada) Puxa, que legal.

Ele ficou revoltado.

- Você viu direito? É uma furadeira! Vai, me ajuda a pregar essa prateleira aqui.

Comprou vários acessórios que iriam compôr o set (incluindo um treco de plástico que impede que a sujeira caia no chão - ela cai direto no treco de plástico), milhões de parafusos (e eu quase apanhei quando chamei de "prego", sem querer) e a prateleira, que ele diz que já tinha aqui em casa.

Eu desconfio seriamente que a tal prateleira foi comprada com o único propósito de estrear a furadeira, mas fiquei quieta. Não ia estragar a alegria dele. E tá. Pregou a prateleira a parede. E arruma daqui, arranja livros dali, entope a prateleira de coisa. Hm, bom. Pelo menos colocou a coleção do Julio Verne que eu comprei num sebo de aniversário pra ele. É, ficou legal.

- Olha, olha como ficou bom! Mãããe, já coloquei a prateleira!

E vem minha mãe olhar. Soltou um "hhhmm, que lindo" daqueles bem despreocupados, perguntou sobre a sujeira e saiu do quarto. Acho que nessas horas é que ele sente falta do meu pai em casa. Vira pra mim e:

- Você jura que não acha nada demais nela?

- É uma furadeira... é o mesmo que você me mostrar um martelo, sei lá. Não acho graça em martelo.

- Não é um martelo.

- Eu sei, mas...

Mas não adiantava. O mal já estava feito. Ele se levantou, guardou tudo, olhou pra mim incompreendido:

- Mulheres, humpf.

E foi ver seriados gravados da Sony na sala.

Sullen Girl