28.11.02

MEUS DIAS NESSA ILHA DESERTA ESTÃO CONTADOS
por Bruno Galera

Em mais uma de minhas incursões ao coração da cidade de Porto Alegre, decidi desvendar os mistérios daquela caixa feia e suja que fica ao lado do Mc Donald´s da Rua dos Andradas. Um bagulho que parece um um shopping, e que realmente se chama "Centro Comercial Rua da Praia".

Entrei e imediatamente subi a primeira das escadas rolantes que subia. Sim, porque tem umas que descem, também. Enfim, me elevei até o próximo andar acima do térreo.
Logo que se chega ao próximo andar, percebe-se que o arquiteto que desenvolveu a estrutura interior do prédio não ligava muito pra coisas simples como LÓGICA e ORGANIZAÇÃO. A disposição de corredores e lojas é totalmente caótica e não obedece a nenhum padrão previsível ou mesmo aceitável prum ser humano médio.

Duas escadas levam para um mesmo andar, lado a lado. Duas escadas separadas por PAREDES. Além disso, é impossível achar as escadas rolantes ou saber qual o destino a que elas remetem o visitante, já que muitas delas atravessam dois andares de uma vez só. Desesperado e tentando alcançar novamente o andar térreo, por onde teoricamente entrei, dei QUATRO VOLTAS em torno de uma farmácia. Não suportando mais a tontura e o absurdo de estar perdido dentro de um shopping center, rumei até uma porta dupla que levava pra algum tipo de lugar escuro, tal qual um estacionamento, só que SEM CARROS. À essa altura, meu medo me fez recuar e tentar a sorte em descobrir minha localização com um dos vigias SEM FARDA do local.
--"ONDE CARALHOS É A ESCADA ROLANTE"?
Não acreditando na resposta bonachona e aparentemente simples do despojado segurança, fiz meu próprio caminho. Confiante como um BOI, atravessei multidões, pisoteei crianças e driblei bad boys do funk, até finalmente atingir meu objetivo. "A escada rolante ao lado da que usei para subir deve descer até o térreo", pensei. Qual não foi o meu choque ao ver que AMBAS as escadas tinham a função de levar os transeuntes para RIBA. Não parecia haver nenhuma forma de se descer que não fosse indo contra o sentido da esteira que trazia mais e mais consumidores para o piso superior.
Sem mais esperanças de sair daquela PIT TRAP, entrei na farmácia e implorei por socorro, mas não sem antes dar uma disfarçada comprando um pacote das camisinhas em promoção e um punhado de chicletes VALDA. Uma das atendentes, muito solícita, me deu algumas indicações, que eu acatei prontamente. Entrando numa espécie de VÓRTEX, consegui sair daquele andar nefasto. Só que não fui parar no térreo. Algo como um SEMI-PISO abaixo do dito cujo e acima dos restaurantes é onde eu fui cair.

"Dane-se", gritei, enquanto dava uma geral pelo ambiente. Essa parte do shopping era repleta de SORVETERIAS e FLIPERAMAS, indicando, talvez, a lógica da minha localização. Devia ser algo como uma praça de lazer pra depois do almoço. Entrei numa grande porta de onde ecoavam ruídos eletrônicos procurando por gente DE BEM.

Aproveitei a chance para dar uma conferida nas últimas TENDÊNCIAS da cena GAMÍSTICA mundial.
Cogitei a possibilidade de desafiar um guri de uns 14 anos que socava violentamente os botões da máquina "Capcom vs. X-Men" (um "clone de Street" com o PLUS de agregar personagens dos dois mundos do título), mas meu instinto de proteção à honra falou mais alto e eu recuei.
Resolvi jogar um Street Fighter Champion Edition, clássico das antigas e grande precursor da onda de BRAWLERS que perdura até hoje. "Nesse eu sou fudido".
Pra não arriscar uma derrota humilhante logo de cara, escolhi o KEN, aquele americano loiro que parece o He-Man de robe e que tem uma boa média geral de força e agilidade. Logo de cara enfrentei o Zangief, RUSSO PRETO temido pelo famoso PILÃO GIRATÓRIO. Tão famoso que o primeiro movimento que o CARINHA controlado pelo computador fez foi justamente esse, DRENANDO minha ENERGIA pela metade. "Filho da puta!", berrei. "Agora vou te baixar-lhe um Tatsu-Maki-Senpu-Kyaku". Enquanto isso, uma pequena multidão se reunía à minha volta pra rir daquele evento GROTESCO: um magrão de camisa de JOGADOR DE RUGBY suando feito um condenado e berrando palavras de ataque em japonês. Sim, esse era eu.
Pra aumentar minha agonia, como nos velhos tempos, um maloqueiro DA FINA colocou uma ficha pra me desafiar sem perguntar nada. Tremi um pouco, mas meus ANOS DE EXPERIÊNCIA que adquiri nos FLIPERS de Capão da Canoa serviram como consolo. Agora é lutar. Não vai ter como fugir.
O primeiro round foi PEGADO. Fiquei só na defesa esperando o pau no cu parar de mandar aquelas MAGIA de merda. Quando ele veio pra cima, larguei o infalível COMBO TRIPLO "voadora forte + soco médio + dragon punch". Tonteei o louco e tentei mandar um ESPECIAL, me esquecendo que aquela máquina não era da SNK. O cara saiu da TONTERIA, me emendou umas 32 rasteiras impossíveis de defender e me ganhou. Corno.

"Melhor ir pros jogos de corrida", pensei. Mas eis que no caminho avisto o tal de DANCE GAME, que consiste num tablado com 4 botões gigantes indicando as direções cima-baixo-esquerda-direita. O GAMEMANÍACO escolhe sua música duma extensa seleção de technos japoneses e tem que acompanhar as flechas que vão aparecendo na tela numa velocidade crescente, que acabam fazendo com que o usuário vá dançando gradativamente. E realisticamente, se tu não for um PREGO como eu. Passei a bola pra não ser humilhado de novo e fiquei assistindo um magrelo jogando com uma música a UM MILHÃO DE BPMs, o que fez com que ele desenvolvesse uma dança que lembrou uma girafa surda tendo um ataque epilético.
A galera curtiu e até bateu palmas pro cara, que pegou sua pastinha tranqüilamente e seguiu seu caminho sem nem cumprimentar o pessoal. Esse era mestre e parecia saber disso.

Lembrei que precisava sair daquela merda e procurei fazer alguma coisa que fizesse com que o vigia me ACOMPANHASSE ATÉ A RUA. Roubar estava fora de cogitação. Por esse motivo, optei por algo mais FESTIVO e certamente menos perigoso. Largando minha mochila, sentei no MEIO do caminho, tirei um livro e comecei a ler em posição de lótus. Alguns segundos depois de ouvir inúmeros cochichos de questionamento por parte dos passantes, um faxineiro meio vesgo veio correndo e pediu calmamente que eu me levantasse dali.
--"Pica", respondi seguro e sem tirar o rosto das páginas abertas.
Foi o bastante pra que um BATALHÃO de homens de terno e walkie-talkie em punho surgisse pra me retirar do local. Não resisti e, por algum capricho da MÃE SORTE, não levei uma biaba sequer. Conduzido pelo PESSOAL, meu sorriso ia aumentando à medida que chegávamos perto da saída do shopping, que estava sendo brindada por um belo pôr-do-sol tipicamente porto-alegrense. Algum dos seguranças me deu um tapinha no ombro e ordenou, com aquela voz de brigadiano contrariado:
--"Circula, magrão".
--"Pode crer, véio".
Sentado sozinho no meio-fio, olhei pra todos os lados tentando ter alguma idéia da minha localização. Não me parecia familiar. Não, não podia ser.
Putos. Não foi por essa porta que eu entrei.

editado do RAOUL DUKE : GONZO JOURNALISM EXCELENTIA

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