12.1.03

O vídeo texto ( Post II ):

A entrevista

Algumas pessoas, quando querem dar um novo rumo pra vida, vão à cartomante; outras vão ao shopping e outras mudam de endereço. Eu abro o jornal. Vou passear meus olhos pelas sessões de classificados, leilões, trocas, "casa muda", oportunidades - sempre surge algo que mexe com a minha rotina - mas, naquele dia, eu precisava de um emprego e lá fui eu para a rua que sobe e desce, trabalhar com telecomunicações.
Eu não manjava nécas de pitibiriba do assunto, não sabia nem ligar um computador, mas me disseram que não precisava de experiência e, sendo assim, por cinco mil dólares, eu preenchia todos os requisitos.
Preeenchi uma ficha na recepção e em seguida me levaram para conversar com um rapaz que me explicou o que eu teria que fazer caso fosse contratada.
A antiga Telesp disponibilizava um sistema de consultas chamado vídeo texto que era acessado por um terminal. Fisicamente o terminal era o cruzamento de um notebook com uma televisão de dez polegadas (há dez anos atrás era um fenômeno!). Era plugar na linha telefônica, na tomada e voilà: banco de dados com todos os assinantes de linhas telefônicas, acesso ao SERASA, policia federal, DETRAN, bancos e outras maravilhas de uma época onde era raro até as empresas terem computadores. No máximo, encontrávamos perdidos um XT jurássico ou o top de linha na época, o 286.
Eu, que nunca tinha visto nada igual na minha vida, fiquei lá, boquiaberta com todas aquelas possibilidades, mas aquilo era um trabalho e, se eu quisesse levar o meu terminal para casa, eu teria que estar lá no dia seguinte às sete da manhã.
Sete da manhã era algo realmente assustador e fiquei me perguntando se não era melhor desencanar e voltar para a minha vida de fotógrafa. Era tentador ter um brinquedinho daqueles por vinte e quatro horas em troca de um trabalho, mas o horário era de lascar. Foi aí, que o rapaz me mostrou o vídeo papo, que era uma ferramenta onde todos os usuário do vídeo texto que estivessem on line podiam conversar uns com os outros. Era o avô do chat! E qual o ser humano que não enlouqueceu diante do seu primeiro contato com o chat? Eu pirei com o vídeo papo e aceitei o emprego na hora.
Levei o meu terminal para casa e assinei um milhão de termos de compromisso de que o devolveria em trinta dias caso eu não conseguisse instalar o sistema em pelo menos uma empresa durante este período. Todo dia às sete da manhã eu teria que comparecer na rua que sobe e desce, depois apresentar o vídeo texto aos clientes. Ganharia cerca de mil dólares para cada contrato fechado (baba!) e ainda poderia passar a noite inteira conversando no vídeo papo. Melhor, impossível! Saí de lá empregada e louca para bater papo no vídeo papo.

O vídeo texto ( Post III )

A primeira noite no vídeo papo

Nem preciso dizer que virei a noite papeando no video papo, né? Vício, vício, vício. Montes de nerds tímidos, troca-troca de telefones e "trimmmm!", o despertador histérico que nunca tinha sido usado, gritava na minha orelha que era hora de trabalhar. Eu, morta de sono, a noite toda romanceando naquela porcaria viciogênica... estava perdida. Como conciliar noites de zumbi no teclado, encontros às escuras com paqueras virtuais, o despertador tocando às cinco da manhã e trabalho em horário comercial. Aquilo não era vida! Mas eu precisava parar de reclamar, tomar um banho e ir para o meu primeiro dia de trabalho na Teletel.
Os dias não seriam tão fáceis como eu havia imaginado...

--------------------->>> Continua.

embebido em AMARULA COM SUCRILHOS

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