Damned sitting ducks
Humm... Estou eu aqui, sossegado, torcendo contra o nosso cinema, desejando danos vocais ao Arnaldo Antunes (o Arnault Daniel da ruindade), quando vem uma amiga, na janelinha do MSN, e reclama com exagerada franqueza que eu tenho que parar de atirar nele. Que é um alvo fácil demais. Que desonra a minha sportsmanship.
E a culpa é minha? Tenho que parar de atirar nele só porque ele está lá paradão com aquela cara de idiota? Eu digo para ele: Mexa-se, imbecil. É tão divertido atirar em você quanto atirar no mar. Mas ele só sorri, aquele sorriso estranhamente esquizofrênico, visto nas pessoas que acabaram de matar os pais. E diz: Parado, parado. O alvo alvo parado. O alvo é calvo! É sempre nesse momento que não resisto e atiro.
Eu sei, mil pessoas já atiraram nele, nesse momento, e pelo mesmo motivo. Ele está lá gemendo na campina. Mas até o jeito com que ele geme é irritante: deus dor, adora deus... sacrifício sacrifezes... Mais mil tiros. Seu corpo quica na planície desolada.
Então está bem, ele é um alvo fácil, um alvo alvo fácil. Mas caramba, nem bem a fumaça baixou e já dá para ouvi-lo repetindo palavras vagamente parecidas de novo. É só o que ele faz, é um autista... (Artista autista...Todo artista é um autista, geme ele. Atiro de novo, e durante um breve, lírico segundo, vejo seus dentes voando como vespas contra o céu de verão.)
E não tenham pena dele, porque ele não morre – ele é simbólico. Seu trabalho será continuado por cada jovem sem talento que achar demais que luxo e lixo sejam palavras tão parecidas. Olhe, me distraí um minuto e ele já está sendo resgatado por professores universitários com bandeirinhas brancas. Só um segundo enquanto atiro no nariz postiço de Décio Pignatari.
Está bem, quem é um alvo difícil, então? Me mostre, me mostre. Eles todos ficam rebolando na planície.
pontaria de Alexandre Soares Silva
15.2.03
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