Nos últimos dias deslizei-me em caneta sobre papéis. Evidentemente não poderia escrever todas as cartas que prometo e que afirmo com veemência querer. Faço escolhas entre cidades e códigos postais. Escorrego-me então entre linhas que revelam-me muito mais do que o teclado. A caneta é um objeto que despe seu dono. Não há tecla “delete”. A carta sela um texto que não poderei reler, refazer. Depois de enviada, não posso mais rasgá-la. Não posso tirá-la das mãos do destinatário. Por isso, quando exercito-me em caneta sobre o papel, raramente releio. Procuro enfiar o papel dobrado rapidamente no envelope e, sem mais pensar, depositar em uma caixa dos correios. Está feito. Não conto que me arrependo porque nem lembro mais o que foram as linhas que revelei. Sei apenas que abri uma cortina, deixei um raio de luz adentrar um recinto pessoal. Tenho medo de meus deslizamentos porque me sinto muito mais atingível, menos protegida. Adquiro meu tamanho real, minúscula poeira sobre o mundo. E quando sei que o destinatário me descobre assim, estremeço dentro de mim. Mas só quando estou despida posso ter o afeto ou o desafeto sincero. Então arrisco os deslizamentos porque não viveria sem saber como é tocar e ser tocada. Correr riscos é caminhar a vida. Estar vulnerável é estar em um momento de coragem. Absoluta poeira minúscula que provoca a caminhada dos homens vestindo camisa amarela.
palavras empoiradas da Walkwoman
9.5.03
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