18.7.03

Fim

Pararam as obras. Tá tudo parado. O trânsito está congestionado.
Pararam as ampliações. Lacraram as portas. Colocaram um cadeado no lugar.
Pararam as máquinas. Ficou um silêncio. Pararam as doações de sangue.

Um coração parou.

Parou no meio da linha, a caneta com a tinta seca. Parou entre duas bocas o último beijo, a última saliva de um amor amargo, prestes a acabar. Tardou. Parou. Tudo. Apagaram as luzes, esvaziaram as garrafas, a tinta descascou, e até o porteiro, com suas luvas de lã e cachecol azul, se foi, sem ao menos ser questionado se queria sair, se queria ficar.

E por ali, ficaram aqueles restos e sobras de uma construção que nunca foi concluída, que nunca foi aceita, que ficou no papel perfeita, na maquete, reluzente, mas no concreto, interminada. Pararam tudo, interditaram o pipoqueiro, e também os banheiros, afastaram todo e qualquer tipo de vida que estava por ali. Chamaram o controle de pragas, para acabar com as possíveis baratas e insetos que por ventura viessem aparecer depois do fim, e acabaram espantando para longe não só as serpentes, pulgas e ratos piolhentos, mas também o casalzinho de joão-de-barro, que feliz, se aninhavam por ali.

Fecharam tudo, bateram as portas, apagaram as luzes, enxotaram vidas, calaram o silêncio, varreram as cinzas e purpurinas, tomaram o último gole, até o vazio, deram um jeito de esconder. Acabou-se o asfalto onde a gente estava acostumado a andar.

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