3.7.03

Respiro goles de palavras em sílabas, dígrafos arranham um pouco a garganta e hiatos são tragados numa só inspiração. Ficar sem palavras é ficar sem ar. Escrever é minha necessidade fisiológica mais premente. As palavras são absorvidas e expiradas. Transformar o mundo internamente e codificar as impressões que ele deixa é meu metabolismo primário. Comer, defecar, urinar, copular, tudo isso pode ser adiado, mas o absorver, esvair, deglutir, expelir palavras não me dá descanso e não admite postergação. As palavras amotinam-se e me enlouquecem se não as expurgo. Escrevo porque a mim não dão outra escolha. Intransigentes, tiranas, despóticas, apropriam-se da minha vida, dos meus dias, dos meus olhos e só através delas consigo enxergar meu rosto. Minhas palavras são os cacos do grande espelho que me reflete e são a grande rede em que me enredo.
Ninguém chega a mim senão por elas.
Tomai e comei todos vós: isto é o meu corpo.


então não discuto

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