A Dama de vermelho
Quando entrei no quarto da Clínica Psiquiátrica Pinel, tomei um susto. O Getúlio, mesmo sob efeito de sedativos, parecia transtornado. Olhou para mim desconfiado com um sorriso que mais parecia um espasmo. O Getúlio trabalhava no meu táxi à noite. Das 6 da tarde às 6 da manhã, direto, sem falhar um dia sequer. Até que fez aquela maldita corrida: Era madrugada, ele não sabe precisar a hora. Disse que estava meio cochilando, com a porta do táxi aberta. Quando deu por si ela já estava sentada no banco de trás. Usava um vestido longo, vermelho, de um tecido brilhante, como se viesse de um baile. Trazia um crisântemo branco na mão. Seu rosto era alvo, emoldurado pelo cabelo moreno escorrido. A maquiagem pesada escondia os olhos negros com olheiras. Ela disse onde queria ir: Oscar Pereira. Só isso, mais nada. Tinha uma voz grave, estranha, com um tipo de reverber, quase masculina.
O Getúlio disse que ligou o taxímetro e arrancou João Pessoa abaixo. Logo, notou que a mulher soluçava. Era um choro quieto, contido. Um grunhido quase inaudível, enquanto cheirava a flor. Aliás, o cheiro também era estranho: um cheiro forte, como se o táxi estivesse cheio de crisântemos. Já na altura da Azenha, como o choro não parava, o Gegê resolveu desligar o rádio onde Bruno e Marrone lamentavam uma ida paixão. Não adiantou. Pelo retrovisor via as lágrimas negras de rímel escorrendo pela face pálida da mulher.
Quando subiam a Av. Oscar Pereira, entre os cemitérios, notou que o choro cessou. Resolveu, então, olhar para trás e conversar com a mulher. Mas já não havia ninguém no táxi além dele e de um crisântemo branco sobre o assento traseiro.
Pobre Gegê, a medicação continua pesada. Sem previsão de alta.
Taxitramas
8.3.04
Assinar:
Postar comentários (Atom)
Nenhum comentário:
Postar um comentário