26.5.03

Ao mais velhos:

Vocês não sabem tudo. Viveram mais, têm filhos, problemas, doenças e rancores, mas não sabem mais. Me viram nascer, riram dos meus erros, muletas e sustos, mas não sabem mais. Não sabem qual o meu filme predileto, qual a minha música predileta, comida predileta, nem que eu não tenho nada predileto.

Não sabem o final das minhas frases nem as consequências morais dos meus atos. Aquele telefonema que talvez fosse de um amigo ou de um fone erótico, do necrotério ou engano encobre muito mais do que pensam. O trocadilho, o riso falso, forçado até, denota a cultura do livro que eu li e escrevi e vocês não. Vocês têm a noção do seu espaço, do crepitar dos seus ossos, o ideal de um ideal frustrado, desilusão e alegria quantitativamente maiores, mas e a intensidade?

E, acima de tudo, por mais espelhos que tenham em casa ou câmeras que lhes filmem as rugas, não sabem a cara que fazem enquanto acham que sabem de tudo, vista pelos meus olhos castanhos; e eu rindo não sabendo nada.

Aos mais jovens:

Eu não sei de tudo. Eu não sei as novas gírias, o novo sucesso, a nova moda, o novo brinquedo. Eu não entendo frases soltas e, se não rio das suas piadas, é ora porque já as ouvi milhares de vezes, ora porque não as entendi. Não sou obrigado a achar que toda essa empolgação é original; tenho o direito de acreditar que suas novas verdades me são velhas mentiras e exigir uma explicação formal. Não me comunico bem por gestos, monossílabos ou cropolalia.

Acho muitos dos seus valores supérfluos por que os meus assim os são. Se comento algo que vocês acham interessante ou original não é por conhecimento concreto da vida, mas porque já li ou ouvi o que vocês ainda não tinham ouvido e alguém precisava ser o prmeiro a lhes passar adiante. Tenho tantos pecados e aspirações quantos vocês, e se vocês veêm pela frente um mundo grande demais e um coração pequeno demais, talvez tenham de ler e ouvir um pouco mais.

E, acima de tudo, aproveitem a felicidade que lhes inundam o corpo entre o café da manhã e o desejo de morte ao fim da tarde, pois quando ficarem velhos vão achar que sabem de tudo ao fitarem olhos castanhos e sorrisos ignorantes; mas aí já vai ser tarde.

conselho bom e de graça no Zazoeira

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