26.9.03

Manual de Falta de Estilo d’A Tabuletra

Comece pelo teorema fundamental do enchimento de lingüiça: a falta de assunto é assunto.
Enquanto estiver escrevendo mantenha uma atitude positiva: convença-se de que o seu texto é legal, convença-se de que muita gente vai gostar, convença-se de que vão chover comentários e convença-se de que você é um completo idiota, caso contrário teria alguma coisa pra fazer além desta bosta.
De vez em quando, fale mal de si próprio e do que você está escrevendo. Isto garante a indulgência dos leitores e dá a impressão de que você tem autocrítica. E pode subestimar a inteligência do seu público à vontade. Afinal, estão lendo o que você escreveu, não é mesmo? Ofenda seus leitores um pouquinho. São todos meio masoquistas ou não perderiam tempo com esta palhaçada. Minta muito, mas sempre falando a verdade. E abuse dos termos contraditórios: os babacas adoram.
Sempre escreva uma frase seguida de outra que a explique ou complemente. Desta forma você enche mais espaço e faz todo mundo pensar que você sabe do que está falando. E faça da frase que você acabou de escrever o assunto da próxima. Seu texto praticamente vai se escrever sozinho.
Seja o quão desonesto quiser, mas nunca diga uma falsidade. Os leitores não perdoam.
Tome uma frase que você já escreveu e reescreva, mas de uma forma diferente transformando verbos em substantivos, substantivos em verbos e substituindo termos por sinônimos ou antônimos. Se alguém questionar pergunte se ele ou ela é contra a reciclagem e faça uma denúncia ao Greenpeace.
Escolha um parágrafo anterior e altere alguns termos. Inverta a ordem das sentenças, mude alguns verbos e complementos e você terá dito a mesma coisa só que de outro jeito. Em caso de reclamação mande o infeliz ler de novo porque “ele ainda não entendeu a proposta”.
Frases prontas de diretor de teatro são muito boas para alçar à condição de verdade suprema, o nada que na verdade é intrinsecamente, sua substância última. Ou não. O mesmo se aplica a frases de Caetano Veloso.
Quando você achar que não dá para espremer mais nada inclua alguma coisa totalmente sem pé nem cabeça, do tipo “entrou Chico-Bento, saiu Chiquita Bacana”. É garantido: em menos de um ano vira bordão de novela.
Escolha um verbo tal como “convencer” ou “escolher” e escreva-o quatro vezes. Escolha um tempo verbal esquisito (pode ser o imperativo aumentativo pretérito do gerúndio perfeito) e conjugue seu verbo neste tempo. Escolha variados complementos para formar frases com o verbo conjugado. Apague a última cópia do verbo e coloque qualquer porcaria no lugar. Tudo mundo vai ficar bobo. Igualzinho a você.
Pegue uma característica de frase que você ainda não conseguiu sacanear e detone antes que o texto chegue ao fim. Aproveite e acrescente ainda alguma bobagem. Carniça gorda que nem essa não se encontra todo dia. Trate de arrancar até o último nervinho dos ossos e depois ainda tire uma lasca de costela para palitar os dentes.
Encerre a fatura fingindo que faz uma referência velada ao texto do qual você plagiou este aqui, especialmente se não tiver plagiado. E aguarde ansioso pelo primeiro mané que vier correndo dizer: “ih! Você ta imitando o Fulanoff Beltranovich”. Agradeça ao Pai pela graça recebida e mande: “você foi o único que não percebeu a homenagem”.

Letra Morta

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