16.9.03

***posts escritos há alguns dias, quando as coisas perdiam cor e sentido***

1.

Trato feito: ela deixaria de escrever, deixaria de espalhar aos quatro ventos sua felicidade patente, deixaria de demonstrar aquilo que sentia. O que sequer notavam, porém, era sua capacidade absurda de desligar-se de tudo o que fazia dela um ser assim, pouco-natural. Ela certamente afrouxaria os laços e retomaria parte do que perdera por opção. Por ter optado pela calma que, a certa altura, fazia-se tão necessária. Não, ela não voltaria aos erros de macaca-velha-e-louca. Já não precisava deles. Já não queria provar o quão macho-moderno era seu princípio de vida. Era livre o suficiente para criar, recriar e destruir quebra-cabeças homéricos. Pois sabia que esses atos não retirariam dela a liberdade alcançada a duras e dolorosas penas. Poderiam até utilizar as mais-que-embotadas verdades rasas. Diriam que sua vida ainda era guiada por dependências materiais, que ela não faria nada caso terceiros não a apoiassem, que até sua comida era dada pelas mãos dos outros. Sim, teriam plena razão. Sua sobrevivência dependia, e muito, da boa vontade alheia. Sua completude emocional, no entanto, pertencia a ela. Partia dela. E estaria presa a ela. Até que deixassem de podar suas vontades e respeitassem o espaço de seus anseios. Até que não estivessem tão estupidamente atrelados a opiniões, palpites, grupinhos-de-colegas-que-poderiam-ler-as-verdades-dela. Ha. Ela não precisava disso. desse medo capenga e infundado. Suas verdades eram, por sorte, maiores. E melhores.


2.

Escrevo com a televisão ligada, porque silêncio faz com que eu me disperse. Gosto muito de escrever. Preciso disso. Mesmo. E doeu a ciência de que eu não poderia mais digitar o que bem quisesse. Como se sempre houvesse um censor. Não, isso não se faz. Quando a iniciativa abusiva parte de alguém que diz adorar o que escrevo, penso que talvez eu não seja dada, mesmo, a compreender os outros a fundo. Se mal alcanço a superfície, imaginem o choque de aprofundar-me. Valham-me os meus. Aqueles com os quais convivo sem grandes repercussões. Os amigos, os parentes, as pessoas que entendem essa minha frivolidade desejada. Essa vontade enorme de abrir, abrir e abrir sem medo. Sim, sofri as maiores maldades devido a fofocas e mal-entendidos. Chorei tal qual uma porca assim que notei o quão deficientes tendemos a ser no quesito "vida alheia". Floreamos, temperamos, modificamos e apimentamos toda e qualquer situação. E seus protagonistas escolhem entre o silêncio contemplativo dos que conhecem a verdade dos fatos e a insurreição dos que se vêem ultrajados. Sim, sou pós-graduada em boatos. Mas imaginei que esse seria o momento de subverter a ordem das coisas. De ser quem sou sem rodeios. De escrever, escrever e escrever sem que necessitassem de entrelinhas e tradutores. Não. Era o momento de calar. Mais uma vez, calar. Calar como se os acontecimentos petrificassem e a vida deixasse de ser. Mas eu não precisava desse sofrimento gratuito. Saí, respirei, conversei. Revi amigas queridas, sorri meus sorrisos francos. E jamais - repito: jamais - voltarei a moldar meus dias com o escopo de fazer com que não sofram. Foi dada a largada. Era pegar ou largar. E largaram. Provavelmente sem sofrer. Sem que houvesse qualquer preocupação referente a meus sofrimentos. E não sou boa nesses assuntos, visto que não sei lidar com rejeição. Prefiro não ocupar o pódio a ocupar segundo e terceiro lugares. Mereço mais, preciso de mais, e farei o impossível para que minha atuação seja tão verdadeira-forte-e-precisa quanto a realidade. Para que deixe de ser atuação. E eu possa mostrar o que há de mais natural e comum em mim.

Mulher de Oncinha

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