8.12.03

Febre assim me lembra das noites aquela que foi quase a primeira, encerrada num tempo diverso em que o calor era só por dentro, em que o ar me batia gelado em nacos de pele ardente e tudo parecia suspenso numa dimensão de irrealidade. Me lembra de quando o tempo escorria viscoso das paredes cheirando a mofo e meus sentidos todos se eriçavam num alerta que estranhamente retumbava atordoamento. Era eu e eram todas ali entre mãos e beijos e línguas, não havia foco nem rumo no caldo de sentipensamentos. Lembra a noite que hoje me volta como sonho, que quase me assombra as madrugadas, a noite quando numa cautela que nunca mais eu dei as costas para o abismo e ele não deixou mais de chamar meu nome daquele momento em diante.

E era o abismo mesmo de sempre que ontem uivava sob o meu corpo outra vez febril quando eu te pedi falo e âncora, quando eu quis em mim a marca inexorável do presente em suor, em porra. Quando eu te desejei em todo fluido que pontuasse o antietéreo, o barro espesso cotidiano. Eu e não mais as outras todas. Vida, a nossa vida que eu busco depois de todo o vôo, todo mergulho.

Agora uma brisa fura a massa quente da noite, eu penso no peixe luzidio que me perturbou o sono, transpiro à tua espera na modorra do apartamento e mordo o azedo da fruta que a geladeira congelou.

LadoB

Nenhum comentário: