10.12.03

Sinais de Vulgaridade II

Strippers brasileiras, com cara de Macabéa, dançando desenxabidamente ao som de George Michael. Propagandas de disque-sexo (grafado, é claro, disk-sexo). Juro que uma vez vi uma em que uma mulher banguela, rolando numa cama, dizia: "Nóis semo perversa". Uma outra, sentada aos pés da cama, olhou para a câmera e disse: "Ai, ai...".

Em filmes, a aura religiosa em torno de certos presidentes americanos. Em alguns desses filmes só se vê a nuca do Presidente. (O pequeno Jimmy, vestido de escoteiro, bate continência e diz: "Sim, Sr. Presidente! É pra já!". O Presidente ri benevolamente. Queria ter tempo de jogar beisebol com o pequeno Jimmy, você sabe - ele é um homem simples...)

Romances brasileiros históricos em que D. Pedro solta pum, a Marquesa de Santos arrota, etc. O texto na contracapa desses livros: "uma visão irreverente dos grandes episódios da história nacional, muito diferente daquela que nos foi contada nos bancos escolares", etc.

Buzinas que dizem "Sai da frente". E as pessoas que acham graça disso.

Em fotografia: foto de mendigo, foto de criança africana com mosca perto da boca.

Filmes em que atores mirins, sinistramente precoces, se mostram bravos ante calamidades ("Oh, Jimmy, você não tem que ser um herói pra mim!")

O desenho jateado da silhueta de uma mulher nua num espelho de motel. Não melhora muito se a mulher for substituída por um cavalo. E os nomes dos motéis: My Flowers, Princesa, Faraó's...

A expressão "Um beijo no coração".

Gente que "prestigia o cinema brasileiro"; pior ainda, "prestigia o nosso cinema" ("Gente, se a gente não prestigiar o nosso cinema, quem vai prestigiar?")

As expressões "nossa literatura", "nosso cinema", "nossa gente", o "nosso Brasil".

A marca distintiva do pseudo: o termo "escritura".

O verbo "passar" em "tal coisa não passa nada de bom", "sua atitude me passou uma confiança..." - ou "acrescentar" em "tal texto não acrescenta nada".

O vulgarismo empresarial "otimizar". O ambiente empresarial como um todo - perto ou longe da maquininha de café.

A palavra "muita" seguida da palavra "adrenalina"; "gente" seguida de "bonita"; "muito" seguida de "louco"; "esporte" seguida de "radical"; "pessoa" seguida de "humana".

A palavra "famosos" como substantivo: "O estilo de vida dos famosos", etc.

Um vulgarismo acadêmico: a conversão de todo nome de autor em adjetivo. "A estética poundiana", "O universo rosiano", etc. (Acredite, não é preciso...)

Outro vulgarismo acadêmico (há muitos; quase tudo que é acadêmico é tão vulgar quanto um bingo): o título de teses. Seguem uma fórmula: Nome Pretensioso: Algo em Algo + Nome de Autor Adjetivado. Por exemplo: Tempo Redivivo: A Experiência do Ego Fragmentado na Obra Rilkeana.

Ainda outro vulgarismo acadêmico, de origem francesa: o uso descontrolado de verbos no infinitivo, no papel de substantivos: "o escrever", "o rir", "a teoria da recepção no ler weberiano", etc.

A expressão (juro que ouvi, num discurso político emocionado) "este interiorzão brasileiro de meu Deus".

As expressões: "cerva", "loiraça" (em qualquer sentido),"brazuca", "sampa".

"Reflexões" e "pensando", em nomes de palestras ou seminários: "Pensando Foulcault", "Reflexões e Apontamentos: Pensando Marcuse", etc.

A expressão "enlatado" para designar séries ou sitcoms americanas ("ianques").

O termo "intelectualóide" (que jamais, na história da humanidade, foi dito por alguém que não fosse imbecil).

Esta vai doer (desculpe): a expressão "Rasga coração".

O uso da palavra "após" ao invés de "depois". Sempre.

Alexandre Soares Silva

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