18.3.04

Imortalidade

Encaro a mortalidade cada vez que encontro a face de meu avô no rosto de meu pai.

Dizem que a descoberta da mortalidade foi uma grande queda. Lendo as declarações de Truffaut, Allen e Borges, parece que a evitar por meio da obra não é aconselhável. O ceguinho dizia mesmo ninguém ter o direito de lembrar-se dos mortos, mas era só frase de efeito.

Dentre todas as formas de buscar a imortalidade, talvez a menos venerada ou romântica seja o acaso, todavia é uma das mais interessantes. Múmias não me interessam, desenhos e esculturas têm sua graça; porém o que mais aprecio são as cartas.

As cartas causam sensações paradoxais: ao mesmo tempo que nos vemos num distante passado, há sempre um elemento cotidiano próximo. Desta síntese sobrevem, invariavelmente, a consciência da mortalidade.

E as correspondências costumam revelar problemas e aflições que jamais saberemos como foram solucionadas, e a dúvida de até que ponto importa.

De qualquer modo, minha sugestão é parar de usar e-mail e começar a talhar cartas em madeira ou pedra: é caro, dá trabalho, porém é um dos meios mais seguros de se atingir a imortalidade.

dies iræ

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