Tagarelices de Domingo
Há uma poesia nos nomes ingleses. O nome do marido da escritora Dahpne du Maurier era Frederick Arthur Montague "Boy" Browning. Eu ouço um nome desses e fico feliz um dia todo...
-Como é o nome?
(sorrindo feliz) Frederick Arthur Montague "Boy" Browning. Vou lá na praia chutar as ondas com as mãos nos bolsos, pensando nesse nome e em outras coisas, e em outras coisas. Quer vir?
-Não, fique, me entretenha.
Quer outro nome inglês? Que tal Brigadier Gerrard Montgomery “Butcher” Collins? Esse inventei, mas posso procurar um autêntico para você. Ou nomes franceses, nem se fala. Italianos, espanhóis. Gregos. Faço-te saber que escrevi um livro com uma personagem chamada Julianna Rossa-Ravilius, e uma outra chamada Elizabieta Dushku. Eu...
-Chega de nomes, você me aborrece. Conta uma anedota aí.
Não, contarei um fato verídico que revela muita coisa, muita coisa. Meu irmão é psiquiatra, você sabe. E diz ele que 90% dos malucos que aparecem no hospital são fãs de Raul Seixas. No kidding. Boy, I wish I was kidding. Agora, diz ele que...
-Outro dia desses vi a empregada cantando “Viva a Sociedade Alternativa”.
Eu sei, foi horrível. Ela é Adventista do Sétimo Dia e nem faz idéia do que está cantando. Eu tentei dizer, mas não tive coragem de destruir o sorriso empolgado dela.
-Seu irmão não é aquele que você tentou matar?
Sim, sim. Bom, não tentei, foi sem querer. Estávamos os dois andando na nossa casa de campo, eu tinha seis anos, ele dez, e eu estava zangado porque ele ia na frente sem prestar atenção em mim. Daí peguei uma pedra deste tamanho, juro, deste tamanho, e atirei. No momento em que ela saiu da minha mão eu soube que ela ia cair na cabeça dele, e caiu mesmo.
-Que barulho fez?
Cluck. Não clock, cluck. Ele caiu de lado no matagal do lado da estrada e ficou lá. Sem saber o que fazer, voltei para casa. Minha mãe me viu emburrado e perguntou o que tinha acontecido, e eu disse, “O Ricardo não queria parar e ficava andando na minha frente, e eu atirei uma pedra na cabeça dele e ele caiu e agora ele está lá no chão sem se mexer e não quer falar comigo”. (Alexandre ri, feliz.) Isso tirou dez pontos do QI dele, mas ainda sobram 160.
-Mais 16 pedras pra atirar.
Sim. Escute, quer ouvir o meu plano pra ficar rico? Contratar o Paulo Cesar Pereio pra ler poesias famosas, dizendo “porra” no final de cada dois versos. Gravamos e vendemos os CDs. Ele leria a Rhyme of the Ancient Mariner, por exemplo, assim:
The Sun came up upon the left,
Out of the sea came he, porra!
And he shone bright, and on the right
Went down into the sea, porra!
Ou como Velho do Restelo. Depende se o primeiro CD vender bem. Não sei, não sei...
-Você e seus planos pra ficar rico. Como era mesmo? Um show em que as pessoas pagam pra ver motoristas estacionarem carros em vagas apertadinhas?
Sim, sim. Se esbarrasse no carro da frente ou de trás, soaria um alarme. E teria um tempo máximo pra fazer isso.
-Mínimo.
Não, máximo. Máximo, sua burrinha.
-Ah, é. (Estendendo um microfone imaginário) Alexandre, qual a sua opinião sobre as pessoas que deixam comentário no seu blog dizendo “aê malandro, se liga, fica aí só reclamando, reclamar é fácil quero ver fazer”, etc?
Reclamar é fácil? Fazer é que é fácil. Fazer qualquer badalhoco faz, na entrada e na saída, andando, dando cambalhotas e até assobiando. Mas reclamar bem é difícil. Repare que essas pessoas estão tentando reclamar, e pessimamente. O que há é pouca gente para dar valor à arte da reclamação, que é um artesanato que fazemos com nossos próprios desprezos, enroscando um no outro como vime. (Se levanta, e espreguiça) Mas agora chega, enough; vamos pra praia, ó Voz na Minha Cabeça, chapinhar a água reflexivamente, de mãos nos bolsos e assobiando clássicos do pop francês da década de sessenta.
-Desde que não seja Je T'Aime.
Então não. (Senta de novo, pega um jornal.) Olha, mais um escoteiro se perdeu na floresta...
Alexandre Soares Silva
21.3.04
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