Eu não acredito em Deus. Não acredito nem em fadas nem em duendes, nem em seres elementais. Não acredito em almas do outro mundo. Eu não bato na madeira, não rezo quando tem raio, não uso guia, não faço sinal-da-cruz quando passo pela igreja. Eu não acredito em santos, anjos, cabalas, patuás. Não leio horóscopo, não sei meu ascendente, não jogo tarô, não bebo chazinho de cipó para “abrir minha visão interior”, não consulto os astros, não vou à cigana. Não visto branco às sextas-feiras, nem preto e vermelho às segundas. Não sei qual é o meu santo de cabeça. Não ligo para a Aparecida Liberato quando tenho que tomar uma decisão, nem vou seguir a numerologia e mudar meu nome para "Fabya". Não tomo banho com sal grosso, não ando com papelzinho de santo expedito na carteira, não boto arruda atrás da orelha. Não compro incensos do hare krishna, não deixo a cigana ler minha mão, não penduro crucifixo no retrovisor, não vou ao centro tomar passes. Eu não acredito num “lance-cósmico-de-energia-que-rola-entende?”. Não sou uma “bruxa moderna”, não sinto vibrações e acho o fim da picada esse negócio de feng shui: como é que um povo que come carne de cachorro vai me ensinar onde é que eu boto meu sofá?
Por isso tudo, é que quando digo que vi meu avô na Rua Augusta, eu vi meu avô na Rua Augusta. O Velho Affonso, falecido em 1986, estava lá. Não era espírito, assombração, sinal, interferência do celular, ácido atrasado, nada. Era o Velho. Tossindo pela rua, com um maço de cigarros no bolso. Ele vinha descendo pela calçada direita (de quem sobe de carro), com camisa psicodélica de bege e marrom, calça marrom (vovô botava muita fé no look anos 70)e cara alegre. Ele me viu, eu buzinei, freei, tentei encostar o carro, ele sorriu para mim, com o cigarro na boca, e fez um gesto, com os dedos e a mão, que podia tanto significar “encosta ali”, como “minha filha, deixa pra lá”. Dei a volta no quarteirão, mas ele já tinha ido embora.
¡Drops da Fal!
8.8.04
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