8.8.04

Meu pai está agora numa semi-intensiva coronariana, esses nomes que o hospital dá aos quartos que têm monitores. Por obra do acaso [e existe acaso?] coube a mim, justo o filho mais relapso e distante [embora o mais carinhoso; sou incapaz de ser autoritário com ele] autorizar sua saída da UTI e acompanhá-lo até o quarto. Foi um privilégio. A maca passando pelo corredor da UTI e as enfermeiras e auxiliares se despedindo dele pelo nome. Ele era, e sabia disso, o paciente mais "antigo" de lá: 15 dias. Só não era o mais velho, e também sabia disso, porque havia um colega de 94 anos. Sabia tudo, meu pai. Da mulher do box em frente. Do cara com septicemia no box 18. Puxava conversa e obtinha informações daqueles que cuidavam dele. Única forma de se distrair e mostrar que estava lúcido. Um dia cheguei lá e uma mulher bonita, visitando um parente, me perguntou se meu pai era um "velhinho fofo" que ela tinha conhecido. E mandou um beijo pra ele. Ao sair da UTI, fui abrindo as portas para a maca e dizendo "adeus, UTI, pra nunca mais voltar, se Deus quiser". E enquanto esperávamos o elevador, percebi uma coisa que nunca tinha visto: meu pai emocionado, os olhos marejados de lágrimas. Comovido com as despedidas. Por sair vivo, talvez. E com uma cara de quem não sabia lidar com aquela emoção. Nunca soube. Nem eu, só aprendi um pouco a duras penas. Amanhã, dia dos pais como dizem, vou estar de novo com ele no turno da tarde. Colocando babador, servindo o rango, ajustando a cama, checando a máscara de inalação, chamando a enfermagem, e - principalmente - conversando com ele. Ouvindo. Mesmo que seja sobre a gravidez da Luana Piovani, que ele estranhou. Também, logo com o namoradinho do Justus?

¢AtaRrO vE®De

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