15.10.04

CATARSE

Sabe quando você fica juntando tristezas, ressentimentos, decepções e desânimo durante muito tempo ? E sem poder – ou querer – falar disso com ninguém, sem querer mostrar os sentimentos, bancar a fraca, a chorona ? E sabe aquela sensação horrorosa, abafada, sufocada, o tempo todo a ponto  de explodir que isso causa ? E sabe quando, de repente, por qualquer motivo - um comercial sentimentalóide na TV, um livrinho bobo, uma lambidinha do seu gato, um abraço do seu amor, uma música quaaase brega que te acerta na veia -  você estoura e chora, chora de soluçar, chora tudo que tinha escondido, por você, por seus amigos,  pelos desconhecidos, pela injustiça do mundo, pelo cazzo alado, chora sem parar e sem escalas por horas, até perceber que já gastou tudo e se continuar chorando vai ser por  inércia, pelo lindo trabalho de renda da aranha no canto da sala destruído pela vassoura ou pela  gratuidade da vida e morte das formigas que você pisou ontem ? Lembra a calma, a leveza, o vazio maravilhoso que vem depois do chororô ? Pois é assim que a cidade está, depois de uma chuva linda que tirou quilos de poeira do ar e das ruas, que deu uma boa lavada no clima de inferno que estava aparentemente instalado pra sempre em cima da gente. E se não fosse um restinho de gripe me irritando, eu não estaria aqui agora escrevendo : estaria lá embaixo, no meio da rua, de braços abertos, tomando chuva na cabeça e feliz da vida como há muito tempo não era.

Cyn City

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