Morte ciclista
Eu estava andando por uma praça. Não sei onde era. Pela tranqüilidade das pessoas, pela preguiça das árvores e pelas casas coloridas, deduzo que era uma cidade do interior, e é só. Caminhava com as mãos nos bolsos, Que é onde elas ficam a maior parte do tempo. Um sujeito de bicicleta passou por mim. Pedalava despreocupado, acho até que assoviava.
Quando ia dobrar o canto da praça, porém, quase trombou com outra bicicleta. Era a Morte que vinha em sentido contrário, pedalando furiosamente e brandindo sua foice acima da cabeça. Cruzou com o ciclista e passou-lhe a lâmina no pescoço.
Parei onde estava, sem acreditar no que via. As pessoas ao redor continuavam bestando, e eu lá tentando entender o que acontecia. A Morte veio na minha direção, agora pedalando devagar. Preparei-me para levar com a foice na garganta também, mas ela apenas olhou para mim, sorriu (um sorriso meio cômico, como o dos esqueletos de A Noiva Cadáver) e disse:
— No dia da inauguração do gasômetro eu te pego.
— Que gasômetro — eu perguntei, mas ela já havia sumido.
Olhei em volta, e notei no meio da praça um grupo de operários que trabalhavam em torno de uma espécie de coluna de ferro verde de mais ou menos dois metros de altura, fincada na terra revolvida e com um cilindro na outra extremidade. Deduzi que se tratava de um gasômetro e me aproximei dos trabalhadores.
— Bonito gasômetro.
— Pois é. Pena que demora tanto pra ficar pronto. Estamos trabalhando nisso há anos.
— Há anos, é? Que beleza! Então a inauguração vai demorar?
— Demora nada, moço. Já tá marcada pro mês que vem.
Acordei assustado, convicto de que vou morrer em janeiro.
Preciso parar de dormir de estômago cheio.
Jesus, me chicoteia!
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