Anhanhandava, o Menino com Soluço da Floresta
A diferença entre as criaturas mitológicas de outros países e as criaturas mitológicas brasileiras é que as primeiras têm poderes especiais e as segundas são só deficientes físicos. Se você visse um saci entrando no metrô se sentiria constrangido a dar o seu lugar pra ele - o que nunca aconteceria com o lobisomem, por exemplo, ou com o Drácula.
O Brasil é tão pobrinho de imaginação que quando quer pensar numa criatura miraculosa imagina um preto. Depois, num arroubo de fantasia, imagina que o preto não tem uma perna e usa uma touquinha. Depois imagina uma mula, mas é uma mula sem cabeça, coitada; e essa outra criatura terrível, um menino, mas que é um menino com os pés virados pra trás. Não sei porquê não imaginaram logo um velho com bócio ou uma dona de casa com vitiligo.
Na verdade eu queria inventar o mito brasileiro mais terrível: Anhanhandava, o Menino com Soluço da Floresta. À noite no mato pessoas em volta da fogueira ouviriam os soluços terríveis e misteriosos de Anhanhandava. Um deles gritaria “Prende a respiração e conta até dez!”, e Anhanhandava responderia “Não deu certo!”. Daí um deles daria um tiro de carabina para assustar a criatura e os soluços passavam.
Por isso o livro correspondente a “Drácula” no Brasil é “A Hora da Estrela” de Clarice Lispector, onde o monstro foi substituído por uma nordestina burra. Se Tolkien fosse brasileiro, toda a Terra Média seria povoada de gente de muleta ou que tosse sangue.
Alexandre Soares Silva
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