27.3.06

Discurso do Sexo

Que homem nunca ouviu uma mulher discursar sobre sua complexa sexualidade? Quem nunca teve o desprazer de escutar algo do tipo: possuímos sabe-se lá quantas zonas erógenas; nosso orgasmo é mais intenso e é múltiplo!; a mulher é uma intrincada máquina que precisa ser estudada, desvendada aos poucos e nos mínimos detalhes.

E continuam: porque um homem que não descobre os segredos da mulher está perdendo um grande prazer, ele pode ter mais da mulher se...

Isso é horrível. Sempre que escuto algo do tipo eu mostro o meu relógio de pulso. Aqui ó! Tá vendo? Ele é cheio de botões, funções, programas, cronômetros mil! E sabe do quê mais? Eu não estou nem aí. Ele me diz as horas. É tudo que eu preciso. Eu nem mexo nos botões, não aperto em nada. Olho para o relógio e ele me mostra o horário.

Muitas mulheres compensam a falta de orgasmo com o patético fetiche de dizer que, se tivessem um desses tais orgasmos, ele seria múltiplo. Gabam-se de sua complexidade porque não a conhecem. Ninguém se gaba daquilo que sabe. O único idiota que se orgulha de ter o Discurso do Método na estante é aquele que nunca leu o Discurso do Método. Diz-se que o homem perde ao não desvendar a sexualidade feminina. Bem, diga ao cara da britadeira ali da esquina que ele seria um cara da britadeira muito melhor se lesse Discurso do Método. Mas ele não precisa de Descartes. Ele sabe fazer o serviço dele; sabe usar seu instrumento.

Todo o louvor da mulher em relação a sua complexa sexualidade feminina é, na verdade, um grito desesperado por ajuda. É, sim. Um gutural urro que, traduzido em linguagem humana, significa mais ou menos: pelo amor de Deus, não sei o que fazer com todas essas zonas erógenas! Sou uma náufraga perdida num mar de baboseira cartesiana! Me come! Seja o meu Cambridge Companion to Whores.

(…)

Manobra, 1979

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