A Fine Romance
A moça casada não consegue esconder a expressão de tédio mas tenta explicar ao marido pugnaz o que exatamente as mulé querem dizer com “romance”. Arrazoa que o frisson de todo começo de relacionamento está vinculado às emoções da sedução, e generaliza dizendo que toda mulher gosta de e precisa ser seduzida, e que o fato de que os homens suponham, depois de casar, que basta ir baixando ou subindo a mão roupa adentro em direção ao hinterland feminil é uma tremenda prova de rudeza ou insensibilidade. O marido pugnaz retruca que, se ele realmente precisasse refazer todo o percurso da sedução a cada vez que, er, procura a patroa no afã de encontrar a mais íntima expressão física do profundo vínculo emocional que os une, não teria casado, cazzo.
A moça entediada faz aquele muxoxo de irritação resignada que as mulheres aparentemente treinam todos os dias ao espelho, como se não valesse a pena o esforço de tentar explicar essas obviedades ao brutamontes, mas o marido não desiste, e contra-ataca dizendo que, em suma, então, o que as mulé querem é que os caras sejam cafajestes. As mulheres da mesa negam, mas ele acrescenta que, na prática, elas esperam que o cara finja, que faça toda a mise en scène da sedução mesmo que não haja sentimento nenhum envolvido, da parte dele –ou seja, que ele continue fazendo em casado o que quase todos os homens fizeram um dia em solteiros, e minta sem a menor vergonha sempre que quiser comer alguém -e, pior, a mesma alguém.
As mulheres da mesa ensaiam uma vaia ao marido pugnaz, enquanto pelo menos duas delas se atropelam para dizer que não, elas não querem que o cara finja: querem que ele sinta vontade genuína de seduzi-las de novo a cada dia. Agora cabe aos homens trocar olhares de irônica resignação. A conversa morre aos poucos, e de repente, em meio a um dos silêncios imprevisíveis que de vez em quando surgem em lugares públicos, o cochicho entre a esposa entediada e a vizinha dela à mesa se torna claramente audível: “E qual é o problema de fingir, aliás? A gente finge o tempo todo e eles nem percebem”. Todo mundo ri, menos o marido pugnaz, que olha feio para a mulher. Ele levanta o copo: “Melhor brindar ao quinto aniversário do nosso casamento, porque não sei se vai haver um sexto”. Uma vez mais, todo mundo ri. Menos a mulher.
Filthy McNasty
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