28.3.03

Ela


Vinha eu dentro do fretado, percorrendo o longo caminho que separa minha casa do trabalho. E pensava sobre a necessidade de perder uns quilinhos. Uns vinte, pelo menos. E então me assustei com uma voz claramente vindo de dentro da minha cabeça:
– Eu faria qualquer esforço para ver você emagrecer pelo menos um pouco.
– Epa! Quem falou isso?
– Eu!
– Quem disse "eu"?
– Eu disse "eu".
– Quem disse "eu disse eu"?
– Ok, sem Pica-Pau aqui. Sou eu, oras.
– Eu quem???
– A mulher dentro de você.
– Mulher dentro de mim? Tá doida??? A mulherada sempre vem com aquele papo de dedinho e tal e eu nunca deixei! Como é que ia ter uma mulher inteira dentro de miim?
– Você se acha engraçado, não?
– Hehehe.
– Pois não é.
– Hum.
– Posso continuar o que estava dizendo?
– Claro, vá em frente. Meu deus, estou falando com as vozes na minha cabeça! Sou um personagem de Stephen King!
– Não se preocupe. Relaxe, converse comigo. Bom, eu ia dizendo. Ia ser muito bom você perder uns quilos. E arrumar os dentes.
– Você é a Daniela, por acaso?
– Um pouco. Sou uma mistura de várias mulheres que você conhece ou gostaria de conhecer. Mas vê se pára de tentar racionalizar tudo! Você está conversando com uma voz dentro da sua cabeça!
– Taí, me pegou. Mas como é que eu nunca tinha notado você antes?
– Porque você é homem, portanto burro. Eu estou sempre por aqui. E você me deixa escapar às vezes...
– Ôpa! Tá doida???
– É verdade! Sabe quando você vai tomar café, se distrai e de repente o mindinho salta, ficando esticadinho pra fora? Sou eu! E quando você vê um rapaz e pensa "Pô, cara bonito"? Então! Sou eu...
– PERAÍ! Isso é apenas meu jeito másculo de admitir as qualidades físicas de outros homens.
– Sei, sei... Que nada! Sou eu, sempre eu!
– Hum... Você é gostosinha pelo menos?
– Que importa? Nunca vai poder rolar nada entre nós mesmo. Se bem que quando você se...
– SHHHHH!
– Ok, ok, boca de siri.
– Eu ainda não acredito que estou conversando com você.
– Você me ofende! Conversa naturalmente com um urubu, numa boa. Aí comigo é esse estranhamento.
– Mas é diferente. O urubu não está na minha cabeça.
– Tem certeza, mané?
– Hein?
– ...
– Ô! Ô! Ô mulé! Ô Marcaurélia! Cadê você, porra???
Sumiu. Malditas mulheres.

Jesus, me chicoteia!

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