23.3.03

Todo mundo vive dizendo que são as coisas pequenas que realmente importam na vida. Eu, pessoalmente, nunca acreditei nisso. Sempre me pareceu que uma bazuca tem muito mais repercussão do que um estilingue e, nesse ponto, continuo achando que estou certa. Mas isso não é motivo para desconsiderar totalmente o estilingue como arma. Na verdade, no dia-a-dia, as pessoas tendem muito mais ao estilingue do que à bazuca. Pensa bem: uma bazuca é um negócio pesadão, difícil de manejar que precisa de um monte de munição que também pesa uma tonelada. Definitivamente não é uma coisa prática. Já um estilingue você pode carregar no bolso de trás e pedra para atirar se cata do chão, mas o estrago não é nem de longe tão grande. Antes que eu me perca na metafóra, a última coisa que eu gostaria de dizer é: embora um bazuca faça uma tremenda zona, imagine o que você pode fazer com centenas de milhares de estilingues, funcionando em seqüencia, ininterruptamente. É a velha história da água mole em pedra dura.
Agora que você não está entendendo mais nada, eu vou começar tudo de novo, do começo. As coisas mais importantes na vida, as realmente transformadoras, são as que acontecem diariamente sem você perceber. Quer um exemplo bobinho? O caminho que você faz todo dia, seja para o trabalho, para a escola ou boteco sujo mais próximo. Você sai de casa e automaticamente toma pequenas decisões: vou virar aqui e andar nessa rua e atravessar neste ponto, o mesmo caminho todo dia. Você pode fazer exatamente esse caminho por toda a sua vida e nunca pensar em todos os outros caminhos que você deixou de tomar, mas porque você escolheu esse caminho e não um dos outros milhares de caminhos possíveis, sua vida mudou. Você podia ter atravessado a rua um pouco mais na frente e ter sido atropelado. Ou você poderia ter virado numa outra rua e achado um bilhete premiado de loteria. Ou você poderia ter feito esse mesmo trajeto caminhando dois passos para a esquerda e ter levado um vaso na cabeça. São as coisas pequenas, entende?

Ok, eu admito que isso foi meio confuso. Então, aqui vai uma história que demonstra bem como as escolhas que nós fazemos, por menores que sejam podem afetar profundamente não só as nossas vidas como as dos outros (e, antes que alguém pergunte, não, eu não faço parte de nenhuma seita maluca que prega o bem-estar coletivo global):

Imagine que você é um sujeito comum. Você, sujeito comum, costuma almoçar na casa da sua namorada comum todo domingo. Então, domingo, meio-dia, você pega o seu carro comum e dirige até a casa dela. Preocupado com a segurança do seu carro, você decide deixá-lo num estacionamento pago. Você vai até lá, deixa o seu carro com o manobrista e vai embora. Depois do almoço (você pode ficar para assistir o jogo se quiser, afinal de contas, você é um sujeito comum e sujeitos comuns gostam de futebol), você vai até a garagem. O manobrista traz o seu carro, te entrega a chave e você vai para casa. Na segunda, você não usa o carro, mas, ao abrir o carro na terça de manha, você descobre uma chave de carro no banco do carona. Você não colocou essa chave lá, aliás você nunca viu essa chave na vida. Você, sujeito comum com idéias comuns, fica perplexo.
Agora vamos observar o que aconteceu para a chave chegar ao seu carro. O manobrista que estacionou o seu carro, também estacionou o carro que chegou depois dele e ficou na frente do seu. Portanto, quando você chegou para buscar seu carrinho comum, ele levou duas chaves: a do seu carro e a do carro na sua frente. Ele tirou o carro-na-sua-frente e estacionou em outra vaga. Foi até o seu carro com as duas chaves na mão, entrou no carro e colocou a outra chave no banco do carona. Entregou o carro para você, esquecendo completamente da chave no banco. Você foi para casa e descobriu a chave dois dias depois, ficando perplexo.

Finalmente, vamos observar o que aconteceu na segunda de manhã, quando o dono do carro-sem-chave (ex-carro-na-sua-frente) veio buscar seu carro. O manobrista obviamente não conseguiu encontrar a chave e, muito sem-graça, tentou explicar isso para o dono do carro-sem-chave. Este, por sua vez um sujeito comum de um país estrangeiro, não conseguiu entender e achou que seu carro tinha sido roubado. Armou um escândalo com a gerência e o manobrista acabou demitido.
Moral da história: são as pequenas escolhas que definem o rumo da sua vida e sempre olhe no banco do carona quando você entrar no carro.

milagres termodinâmicos de Oba Fofia

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