18.4.03

'sabe quanto tempo eu fiquei sem falar com ninguém?'
'não, nem imagino.'
'pois é, eu perdi as contas. a coisa mais impressionante quando tu tá sozinho é que o tempo é moldado de acordo com o teu desespero.'
'ah...'
'mas não é isso que eu queria dizer, eu nem sei mais o que eu queria dizer, é que eu fico assim sozinho, não falo com ninguém e finalmente tomo coragem um dia de te ligar e te dizer o quanto gosto de ti, o quanto sempre gostei, a importãncia que eu não te dei e tudo o mais, quantas vezes eu, na reclusão que busquei, fiquei ensaiando isso comigo mesmo, sempre respondendo mal, sempre me humilhando, eu não sei por quanto tempo, eu não sei mais falar com ninguém, acho.'
'...'
'então?'
'então o quê?'
'tu também gostou de mim como eu ainda gosto de ti?'
'não sei.'
'não sabe?'
'claro que não. a única coisa que sei agora é que tu ligou pro número errado. aqui é uma padaria, não a casa da shirlêi.'
'...'
'alô?'
'não, tá, eu devo ter ficado muito tempo recluso... é isso, ela se mudou daí faz tempo?'
'eu já disse que não sei da tal shirlêi. mas eu acho que a padaria tá aqui faz uns quatro anos... eu só trabalho aqui faz três mes, na telentrega..'
'quatro anos...'
'é.'
'tudo bem. faz o seguinte, então. me traz duzentos grama de presunto, duzentos de queijo, manteiga sem sal e uns cinco pão massinha.'
'qual o endereço?'

como assim dois uísque?

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