25.5.03

Eu estava no meio de um x-salada, tomando uma vitamina mista, com o olhar perdido pra fora do boteco [Lanchonete Soraia, na esquina da Biblioteca], quando senti um calorzinho molhado. E te juro, meu sexto sentido me disse que era menstruação. Mas sei lá, nos últimos 11 dias, eu tinha sentido isso várias vezes, corria no banheiro e nada. Preferi não pensar. Preferi não me precipitar. Preferi comer aquele x-salada cheio de pimenta, e tomar aquela vitamina mista cheia de açúcar como se fosse o primeiro e último de toda a minha vida.

Foram dias de aflição, e eu não pensava mais na vida em dias. Em pares de dias. Em semanas, em anos, em pares de anos. Eu só pensava na próxima hora, nos próximos instantes em que, uma hora ou outra, eu iria ficar menstruada. Dizem que quando uma mulher fica grávida, ela sempre sabe o sexo do neném antes mesmo dele nascer. E que quando uma mulher está grávida, ela também sempre sabe, mesmo que use de todos os cuidados para não engravidar, seu sexto sentido lhe indica algo. Tem uma moça de seus 35 anos que trabalha comigo, que diz o seguinte: a intuição é a voz da alma, e agora mais do que nunca, eu sei o que isso significa. Sempre fui muito de dar ouvidos ao meu coração, que foi insensato na maioria das vezes, e muito cruel também. Mas sei lá, o que seria de mim se não tivesse dado a cara à tapa tantas vezes, se não tivesse sentido na carne desespero, solidão, medo, e amor, amor pra caralho?

Eu nunca fui uma pessoa de ficar parada olhando os outros vivendo, e me enchendo de nóias. Eu sempre fiz o que me deu na telha, sempre briguei por aquilo que eu queria, sempre chutei portas. Mas foda-se. Eu sofri, e mesmo assim, eu sempre tento dar um jeito de ser feliz. Eu sempre fui, e quem quisesse que viesse atrás. Só que ontem, quando eu cheguei no trabalho, depois daquele x-salada, e daquela vitamina mista, onde eu não sabia mais se queria que o tempo passasse rápido, ou se arrastasse pelas horas, e vi que tinha um líquido vermelho na minha calcinha, foi aí que eu tive o baque.

Eu ainda sou uma criança. E talvez o seja para sempre.
Presa numa mente que nunca vai ser velha, que nunca vai criar juízo, e que nem o pretende.

Foi apenas nesse momento que me veio uma chuva de imagens na cabeça, meus pais, foi neles que eu pensei primeiro, o que diriam, o que fariam? E não havia mais perspectiva, não havia mais sonhos, não havia mais Dani escrevendo um dia um livro, não havia mais Dani um dia deixando de ser preguiçosa, e entrando numa faculdade de letras, e não havia mais quarto bagunçado, não havia mais bagunça, não havia mais vinho, nem cerveja, nem madrugadas de rock, não havia mais porra nenhuma, e aí eu tive uma visão do inferno. Uma pessoa totalmente despreparada, socando uma mamadeira na boca de uma criança não desejada, um bebê indefeso, portador da infelicidade de duas famílias, e sabe-se lá, quantas pessoas. Muita responsabilidade para alguém tão pequeno, tão ingênuo, tão indefeso e tão...indesejado.

E como seria a vida desse ser, tão indesejado, ele saberia que era fruto de noites maravilhosas, onde apenas carinho e tesão eram pra existir, e não uma vida fecundando disso? E eu me senti muito mal por não poder controlar meu corpo, e me culpei por não usar um outro método além do látex. Que falha. Falha, e falha bonito. Mas meu sexto sentido dizia algo. Gritava algo, e quase me deixava surda. Mas meu raciocínio, minhas contas, e o período fértil não me deixavam raciocinar direito.

Até que enfim, no meio do x-salada, o sangue da redenção.
Já posso voltar a pensar na vida em dias. Em pares de dias. Em semanas, em anos, em pares de anos. Porque ao meu ver, "família" é uma instituição que se faz com quem se tem certeza, quando se está preparado para tal, e quando se deseja muito. E pra mim, eu acabo de chegar aos 18 anos, mesmo que a identidade prove 22. Ter um filho agora, seria abortar a minha vida.

Enjoy the life. Confie na intuição.
E use mais de um método anticoncepcional.
Não isso não é pra você. É pra mim mesma.

Don´t Forget The Alcohol and condoms too

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