4.10.03

A saga do primeiro beijo (Post XIX)

- Interessa sim! Diz logo o que você está pensando.
- Precisamos entrar na sala de recreação.
- Você é louca? Fazer o quê na sala de recreação?
- Pegar umas coisas emprestadas.
- Pegar o quê, Marilu? A sala fica fechada a maior parte do tempo!
- Eu sei. Por isso mesmo que podemos entrar.

Caminhei atrás dela fazendo perguntas, mas de nada adiantou. Fomos parar atrás da escola.

- Pronto! Sabe subir em árvores?
- O que você quer fazer?
- Vai subir ou eu subo sozinha?

Lembrei da minha promessa à diretora e parei de fazer perguntas. Pensei em virar as costas e ir embora, mas sozinha ela acabaria encrencada.

- Ok, eu subo! Mas me diz antes o que você pretende fazer.
- Está vendo aquela janela ali?
- Não, Pedro Bó...
- É a janela da sala de recreação.
- Há quantos anos você acha que eu estudo aqui? Acha que eu nunca vi essa janela antes?
- Pode ter visto antes, mas certamente não sabe que ela não tem tranca.
- Marilu, você é muito trombadinha! Que tipo de gente confere as trancas das janelas da escola?
- Você não imagina a utilidade desta informação. Lá dentro tem tudo o que precisaremos.
- Eu não preciso de nada!
- Como você é chata! Deus do céu! Quer a lista? Uma peruca loira, um pano branco e um pouco de algodão.
- Enlouqueceu de vez... Quer o quê? Sair por aí de mulher loira?
- Isso! Isso mesmo!

Às vezes era difícil conversar com a Marilu sem cair na gargalhada. Ela contava seus planos com as expressões mais insanas. A mulher loira era uma lenda que aterrorizava meio mundo na escola. Aliás, em várias escolas. Uns a chamavam de mulher loira, outros de loira do banheiro ou de loira do algodão, mas todos falavam das supostas aparições da assombração. Várias eram as versões sobre a sua morte. E, durante muitos anos, me perguntei se elas não foram inventadas para assustar alunos indisciplinados.

- Você acredita nessa estória?
- Acredito.

A cara dura respondia absurdos com a maior pinta de séria.

- Acredita em que mais? Mula sem cabeça e sexo só depois do casamento?
- A mulher loira sou eu.

Ela bem que tentou, mas não conseguiu segurar o riso.

- Conta de uma vez...
- Já me vesti de mulher loira várias vezes para assustar os trouxas que tem medo dela. Já entrei até no banheiro dos meninos.

Sentei no chão pra rir melhor, enquanto a destrambelhada escalava o tronco da árvore. Como alguém poderia evitar que aquela louca se metesse em confusão?

- É sério! Uma das minhas expulsões foi por causa disso. Botei uns dez moleques pra correr com as calças na mão. Não teve jeito. Fui expulsa.
- Cara, você é completamente pinel!
- Essa estória da mulher loira é mais velha que a minha mãe. Não entendo como tantos babacas acreditam nela. Vai ficar aí embaixo?

Ela estava prestes a abrir a janela e pular para a sala de recreação. Como o papo estava engraçado, não resisti e fui atrás. Coisa boa que aquilo não daria, mas era impossível ficar de braços cruzados diante de um plano maquiavélico da Marilu.

----------> Continuará em Amarula com Sucrilhos

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